O influenciador Daniel Penin, que soma 4,7 milhões de seguidores nas redes sociais, precisou tomar uma decisão complexa após anunciar, no início de junho, o lançamento de um documentário com críticas à XP Investimentos. Uma ordem liminar do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) o proibiu de publicar o vídeo, que sugeria práticas enganosas por parte da corretora de investimentos no trato com seus clientes, sob pena de multa que poderia chegar a R$ 500 mil.
Penin considerou abrir mão da publicação do vídeo, que levou semanas de produção, ou manter o lançamento sob risco de retaliações judiciais. O influenciador escolheu a segunda opção, e o documentário “XP Investimentos – O $ do Impossível” segue no ar desde a publicação, no sábado (14).
Até o fechamento desta reportagem, o vídeo somava quase meio milhão de visualizações no YouTube. Frente à possibilidade de censura, usuários de redes sociais fizeram cópias do conteúdo e republicaram nas plataformas. Até o momento, não houve novas movimentações no processo movido pela XP Investimentos.
A juíza plantonista autora da decisão acatou outro pedido dos advogados da XP e impôs segredo de justiça ao processo – ou seja, a imprensa e o público em geral não podem acompanhar os autos. O escritório de advocacia responsável por defender a corretora pertence a Rodrigo Fux, filho do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux.
À Gazeta do Povo, Daniel Penin falou sobre a investida judicial para a remoção do vídeo.
Gazeta do Povo: Você publicou o documentário mesmo após uma decisão judicial que proibia sua veiculação. O que o motivou a tomar essa decisão, mesmo ciente dos riscos jurídicos envolvidos?
Daniel Penin: A liminar me colocou diante de duas alternativas extremas: não publicar nada ou arcar com eventual multa de até R$ 500 mil. Considerei a decisão desproporcional e, possivelmente, inconstitucional, já que a Constituição proíbe censura prévia.
Além disso, a ordem nasceu no plantão, sem o contraditório, e incluiu sigilo processual fora das hipóteses legais. Avaliei que a melhor forma de questioná‑la seria exercer a liberdade de expressão e, se necessário, discutir a multa em juízo, inclusive parcelando.
Você sofreu algum tipo de pressão ou tentativa de intimidação após o lançamento do documentário? Como tem lidado com as repercussões dessa exposição?
Daniel Penin: Nenhuma. As únicas movimentações até agora são as peças judiciais até 4 de junho [data da decisão liminar que proibiu a publicação do vídeo]. Não recebi ligações, “avisos” ou visitas. Lido com as repercussões respondendo a quem pergunta, publicando abertamente os documentos e mantendo a rotina normal de produção.
Como o caso tramita em segredo de justiça, não conseguimos acompanhar a íntegra do processo. Houve alguma nova decisão judicial desde a publicação? Você foi alvo de alguma retaliação, como aplicação de multa, por exemplo?
Daniel Penin: Não. Após a liminar de 4 de junho, o processo permanece sem despacho novo.
Vê algum paralelo entre o que ocorreu nesse episódio e os debates atuais sobre liberdade de expressão no Brasil, especialmente no contexto da iminente regulamentação das redes sociais?
Daniel Penin: Pedir a retirada de conteúdo é admissível (obrigação de não fazer). O problema está na fundamentação frágil da decisão, que equipara crítica a dano irreparável; e na imposição de segredo de justiça fora das hipóteses taxativas do art. 189 do Código de Processo Civil na tentativa de impedir que eu fale sobre o caso.
Esse episódio dialoga diretamente com o debate sobre liberdade de expressão e a futura regulação das plataformas: mostra como ordens amplas, sem contraditório, podem ser usadas para silenciar antecipadamente.
A XP Investimentos afirma que seu vídeo contém desinformação e pode causar danos irreparáveis à reputação da empresa. Como você responde a essas acusações?
Daniel Penin: O vídeo apenas organiza informações públicas já disponíveis. Não há denúncia inédita nem acusação formal. Caso existisse algum erro, bastaria um pedido de retificação. Quanto a danos, o vídeo está no ar há dias, e as ações da XP subiram no período, e a companhia segue operando normalmente.
Como vê o fato de a XP ter recorrido ao escritório do filho de um ministro do STF? Diante das críticas recentes à proximidade entre ministros do Supremo e empresários em eventos privados, você acredita em uma instrumentalização do Judiciário por grandes corporações?
Daniel Penin: Não me sinto em posição de julgar o sistema como um todo. Existe, sim, discussão pública sobre proximidade entre poder econômico e decisões judiciais. No meu caso concreto, entendo que a empresa recorreu ao escritório de sua preferência. Caberá ao tribunal – e, em última instância, ao STF – resguardar a Constituição. Minha confiança está no processo e na transparência: por isso divulgo tudo que recebo.
O que diz a XP Investimentos
Tema do documentário de Daniel Penin, a corretora XP Investimentos disse à Gazeta do Povo que seu modelo “é um dos mais sólidos e sustentáveis do país” e configura “uma proposta única aos investidores, com uma das menores alavancagens do mercado e o melhor índice de eficiência dentre as principais instituições financeiras que operam no Brasil”.
A corretora diz que pretende “reagir com energia contra mais essa fake news, com todo um arsenal de medidas legais, como já fez no passado contra esse mesmo tipo de acusação inverídica”.
A XP afirma ainda que já houve “ataques similares, inclusive com tentativas de ações coletivas”, e que obteve êxito em todas as decisões na Justiça americana, sem fazer qualquer acordo. Leia a nota na íntegra.
Fonte. Gazeta do Povo