É possível dormir em paz com dívidas que não param de crescer? Como alguém consegue entregar alta performance quando se vê paralisado diante de boletos acumulados, juros impagáveis e ligações incessantes de cobrança?
No Brasil, essas não são perguntas retóricas. De acordo com a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), quase 8 em cada 10 famílias brasileiras estavam endividadas em 2024, um patamar historicamente elevado. Para muitos trabalhadores, isso significa viver sob constante pressão emocional, ansiedade, culpa e até sintomas depressivos.
Um ciclo silencioso que afeta o desempenho profissional, a convivência com colegas e a própria percepção de futuro.
A dívida, diferentemente de um corte visível ou de uma fratura, é uma ferida oculta – mas não menos dolorosa. Ela adoece em silêncio. Preocupa-se muito, e com razão, com ergonomia, plano de saúde e burnout. Mas e quando a exaustão vem de dentro, do medo de abrir o extrato bancário ou do desespero ao fim do mês? Estamos prontos para chamar isso também de saúde?
O problema não é só econômico. É psicológico, social e produtivo.
Uma pesquisa da PwC revelou que 43% dos colaboradores com problemas financeiros perdem até três horas de trabalho diariamente lidando com essas preocupações. Quando um funcionário está endividado, ele não está apenas devendo ao banco – ele está devendo presença, energia e até autoestima. E isso se reflete nos resultados da empresa.
Ignorar esse cenário é escolher pagar o preço da omissão. Afinal, quando a saúde financeira de um time está comprometida, não há salário que sustente engajamento ou cultura que sobreviva à desmotivação crônica.
A solução, portanto, não pode se restringir ao indivíduo. Precisa partir também das empresas.
Empresas conscientes já entenderam que cuidar da saúde financeira dos colaboradores é uma forma concreta de cuidar da saúde mental — e, mais do que isso, uma estratégia de gestão. Há soluções viáveis, acessíveis e eficazes sendo aplicadas com bons resultados.
Programas de educação financeira integrados à jornada dos colaboradores, por exemplo, ajudam a transformar a relação com o dinheiro desde a raiz, oferecendo conteúdo adaptado à realidade de cada faixa de renda e momento de vida.
Iniciativas de crédito assistido, quando acompanhadas de orientação profissional, permitem que o colaborador antecipe valores ou renegocie dívidas de maneira estruturada, sem cair em novos ciclos de endividamento.
Algumas empresas também têm estabelecido convênios com especialistas em renegociação, oferecendo canais humanizados, sem julgamento, com condições mais favoráveis do que as encontradas no mercado.
Além disso, o cruzamento entre apoio psicológico e suporte financeiro tem mostrado grande potência: em muitos casos, a dívida é apenas o sintoma visível de uma instabilidade emocional mais profunda — e atacá-la de forma isolada é insuficiente. Quando a empresa acolhe esse contexto de forma empática e prática, ela cria um ambiente de confiança e pertencimento que repercute em toda a cultura organizacional.
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Os resultados não são apenas teóricos. Estudo do Employee Benefit Research Institute mostra que colaboradores com acesso a programas estruturados de bem-estar financeiro têm 23% mais foco no trabalho e 18% mais satisfação com a empresa. Internamente, já se observam reduções significativas em turnover, afastamentos por questões emocionais e até melhora nos índices de clima organizacional.
No fim das contas, não se trata apenas de oferecer ferramentas — mas de devolver autonomia. Em um mundo que exige cada vez mais adaptabilidade, criatividade e foco, oferecer saúde financeira é oferecer liberdade emocional. Liberdade essa que, neste contexto, talvez seja o mais potente combustível da produtividade — e, principalmente, da dignidade.
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Fonte.:Saúde Abril