Um estudo publicado na edição atual da revista científica International Journal of Educational Development — disponível online desde o mês de maio — mostra que o modelo de escolas cívico-militares de Goiás contribuiu para melhoria no desempenho acadêmico e redução da violência no ambiente escolar.
A pesquisa foi desenvolvida em 2021 pela equipe do pós-doutor Jevuks Matheus de Araujo, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e abrangeu cerca de 66 mil estudantes de 47 municípios goianos. As 60 instituições avaliadas ingressaram no programa dos Colégios Estaduais da Polícia Militar de Goiás (CEPMG) entre 2013 e 2019, e os pesquisadores analisaram os resultados obtidos antes e após a mudança.
De acordo com o professor Jevuks, foram utilizados dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Censo Escolar e testes da Prova Brasil — que examina a qualidade do ensino de português e matemática nas escolas. Foram coletados dados de 2007 a 2020.
A partir da análise, foi verificado que as instituições do modelo educacional cívico-militar tiveram redução de aproximadamente 10% nas taxas de reprovação, aumento de 15,25 pontos no desempenho em matemática e elevação de 11,61 nas notas de português. Também foi percebido acréscimo de 0,6 na pontuação do Ideb, índice nacional liderado pelos estados de Goiás e Paraná.
Os pesquisadores perceberam também que o impacto foi “persistente e cresceu”, já que as escolas apresentaram resultados melhores no decorrer dos anos. Além disso, a violência no ambiente escolar foi reduzida em diversas variáveis relacionadas a ameaças contra profissionais, roubos e presença de álcool, drogas e armas entre os estudantes.
“Evidências robustas de que a militarização das escolas públicas em Goiás teve impacto positivo no desempenho dos alunos e na segurança escolar”, afirmou o professor Jevuks à Gazeta do Povo.
“Percebo que, no Brasil, é bastante comum que questões ideológicas se sobreponham a fatos e evidências”
Pós-doutor Jevuks Matheus de Araujo, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Estudo deveria contribuir para o debate na educação pública brasileira, diz pós-doutor
De acordo com ele, o trabalho tem sido relevante para discussões internacionais a respeito do papel de modelos militares na educação em diversos países, mas parece não ter contribuído para o debate na própria educação pública brasileira.
“Percebo que, no Brasil, é bastante comum que questões ideológicas se sobreponham a fatos e evidências”, disse, ao apontar que, “frequentemente, decisões sobre a criação ou encerramento de programas são tomadas sem o devido embasamento em estudos”.
Um exemplo citado pelo professor é o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), encerrado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2023, apesar dos resultados positivos.
O especialista também comenta a respeito da situação em São Paulo. Lá, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) enfrenta briga judicial para implantar 100 escolas cívico-militares no estado devido à decisão do Tribunal de Justiça do estado (TJSP) que suspendeu a lei para implantação do programa. O caso chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que pode derrubar a decisão.
Além desses casos, escolas cívico-militares de todo o país têm sido criticadas por partidos como PSOL, que chegou a denunciar o modelo para a Organização das Nações Unidas (ONU), sob argumento de que representaria “violação de direitos fundamentais”.
Em resposta ao pedido dos psolistas, o Comitê dos Direitos da Criança (CDC) da ONU recomendou que o Brasil proibisse a “militarização das escolas públicas”, mas o documento não tem caráter obrigatório, como explica reportagem da Gazeta do Povo.
Estudo pode incentivar novas pesquisas a respeito do tema
Para o doutor em Educação Pedro Caldeira, os casos evidenciam que o Brasil precisa retirar urgentemente a discussão educacional da “arena ideológica” e trazer o tema para a “efetividade da política”.
“O desenvolvimento de processos diferenciados de gestão ou didático-pedagógicos deve passar, como nas escolas cívico-militares de Goiás, pelo estabelecimento de objetivos muito claros para toda a comunidade escolar”, aponta, indicando necessidade de formação continuada aos professores e melhoria constante dos processos didático-pedagógicos.
Para isso, Caldeira vê a importância de pesquisas como a coordenada pelo professor Jevuks e incentiva a realização de novos estudos que apresentem, por exemplo, índices de violência escolar nessas unidades, porcentagem de alunos que ingressaram em universidades e também as percepções de professores e famílias da comunidade sobre o modelo cívico-militar.
De acordo com o pós-doutor Jevuks, sua equipe tinha pretensão de avaliar os resultados do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), mas como essa política pública foi encerrada pelo governo federal, não há novos estudos previstos sobre o tema.
“A mancha criminal nas regiões onde são instaladas unidades de CEPMGs diminuem drasticamente, inclusive com crimes como tráfico de drogas zerando dentro do quadrante do colégio”
Capitão Rogério Santos Silva, coordenador da Divisão de Acompanhamento Pedagógico do Comando de Ensino de Goiás
Como está o programa de escolas cívico-militares em 2025?
De acordo com a Secretaria de Educação de Goiás (Seduc), o estado conta com 82 Colégios Estaduais da Polícia Militar (CEPMG) que seguem um modelo de gestão compartilhada. Nessa estrutura, a Seduc se responsabiliza pela parte financeira e pedagógica das unidades, enquanto administração fica com a Secretaria de Segurança Pública de Goiás e com o Comando de Ensino.
“E hoje temos os melhores índices de aprovação e a menor evasão escolar”, afirma o capitão Rogério Santos Silva, coordenador da Divisão de Acompanhamento Pedagógico do Comando de Ensino de Goiás, apontando ainda os resultados no Ideb. De acordo com ele, enquanto a média brasileira é de 4.3 para o Ensino Médio, Goiás aparece em primeiro lugar no ranking nacional com 4.8.
“Mas se fizermos um recorte apenas dos colégios estaduais da Polícia Militar, esse número sobe para 5,3 — um ponto acima da média brasileira da educação pública”, diz, citando também redução da violência.
“A mancha criminal nas regiões onde são instaladas unidades de CEPMGs diminuem drasticamente, inclusive com crimes como tráfico de drogas zerando dentro do quadrante do colégio”, informa.
Atualmente, o modelo de colégios cívico-militares de Goiás está presente em 61 dos 246 municípios do estado, e atende a cerca de 20% dos alunos da rede pública estadual. “E há fila de espera”, aponta o capitão, afirmando que o ingresso nas unidades é feito por sorteio e não há obrigatoriedade de nenhum estudante permanecer sem sua vontade no CEPMG, assim como os profissionais. “Isso é que faz o nosso sucesso”, finaliza.
Fonte. Gazeta do Povo