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29 de junho de 2025

A história do ataque de tubarão que inspirou filme – 28/06/2025 – Ilustrada

A história do ataque de tubarão que inspirou filme – 28/06/2025 – Ilustrada

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Verão de 1916. Perto do litoral do Estado americano de Nova Jersey, nadava mar adentro um jovem tubarão de 2,7 metros de comprimento. Ele logo roubaria da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) as manchetes da imprensa dos Estados Unidos.

Aquela criatura marinha era pouco conhecida pela ciência na época. Mas o grande tubarão-branco estava destinado a exercer enorme influência sobre a cultura popular americana e mundial no futuro.

O animal se tornaria o astro do primeiro fenômeno de bilheteria do verão no cinema moderno —o filme “Tubarão” (1975), de Steven Spielberg, cuja estreia completou 50 anos no último dia 20 de junho.

Foram os eventos verificados em Nova Jersey que fizeram com que o grande tubarão-branco fosse recordado muito depois do término da Primeira Grande Guerra.

Tudo aconteceu entre os dias 1º e 12 de julho de 1916. Um jovem tubarão-branco atacou cinco pessoas na costa leste dos Estados Unidos, matando quatro delas.

O animal que protagonizou aquela série de ataques, até então sem precedentes, gerou uma onda de terror, ao se deslocar por mais de 100 km ao longo das praias do Atlântico Norte, em plena temporada de férias.

As vítimas

A primeira vítima foi encontrada em Beach Haven, em Nova Jersey. Seu nome era Charles Vansant (1892-1916).

Recém-formado na Universidade da Pensilvânia, Vansant era filho de um médico da Filadélfia, nos Estados Unidos.

A notícia passou quase despercebida.

As pessoas que ouviram seus gritos na praia pensavam que ele estivesse brincando. Os cientistas afirmavam que os tubarões não tinham “força na mandíbula” suficiente para atravessar ossos humanos.

Aquele foi o primeiro ataque mortal de um tubarão registrado na história dos Estados Unidos. Mas quase ninguém ficou sabendo.

No segundo caso, banhistas encontraram um corpo humano mordido e ensanguentado na areia. Eles saíram correndo da praia gritando, apavorados.

De repente, o “monstro marinho” chegou à primeira página do jornal The New York Times.

Outro banhista horrivelmente destroçado foi retirado do estuário de um rio. A vítima morreu pouco depois. E outro homem tentou lutar com o tubarão e também acabou morto.

Temendo perder a receita do período de férias, os prefeitos da região negaram o ocorrido. Mas o medo fez com que os balneários turísticos fechassem e os políticos pediram ajuda aos cientistas.

Um especialista do Museu de História Natural dos Estados Unidos teve dificuldades para identificar o assassino. Ele finalmente reconheceu o “devorador de homens” como sendo da espécie Carcharodon carcharias, o grande tubarão-branco.

Uma onda de pânico fez com que homens enfurecidos tomassem espingardas e tridentes e se lançassem para caçar o tubarão, até que o animal atacou um bote e foi morto pelo seu dono, que se transformou em herói.

Mais estranho que a ficção

Este roteiro parece familiar? Pois é a verdadeira história de “Tubarão”, o lendário filme de Steven Spielberg.

Em 1974, o escritor americano Peter Benchley (1940-2006) levou a história dos balneários de Nova Jersey para Amity, um lugar fictício no Estado americano de Long Island. Seu romance tem o mesmo nome do filme, “Jaws” (Tubarão, Ed. Darkside Books, 2021).

O tubarão de Benchley mata quatro pessoas, uma delas em um estuário. Um homem luta contra o tubarão e também morre.

O prefeito nega o que está acontecendo e protege os dólares do turismo, até que o horror dos fatos o leva a recorrer a um cientista.

O ictiólogo do aquário de Nova York tem dificuldade para identificar a espécie, até encontrar o célebre “comedor de homens” —o Carcharodon carcharias, o tubarão-branco. O cientista, então, alerta as pessoas sobre os incidentes de 1916.

Grupos de homens enfurecidos lideram uma caça ao tubarão. E o animal finalmente morre quando ataca o bote de um homem, que acaba sendo um herói.

Quando entrevistei Benchley, ele declarou que o romance surgiu do seu interesse pelos ataques de tubarões, incluindo as proezas de Frank Mundus (1925-2008), praticante da pesca esportiva de Long Island, que capturou um grande tubarão-branco com peso recorde de 1.554 kg.

Mas, no prólogo de uma edição posterior do livro, Benchley fez referência ao ocorrido em 1916. Ele destacou que os tubarões ficavam em uma única região, matando várias pessoas.

“Declarei várias vezes em entrevistas que cada um dos incidentes descritos em “Tubarão” […] realmente aconteceu”, destacou Benchley.

Seu romance foi uma sensação cultural em todo o mundo. O então presidente cubano Fidel Castro (1926-2016), por exemplo, declarou que “Tubarão” representaria uma metáfora sobre o capitalismo predador.

Outros afirmaram que a história seria uma referência ao ex-presidente americano Richard Nixon (1913-1994) e ao caso Watergate.

O livro de Benchley ocupou os primeiros lugares da lista de best-sellers do The New York Times por quase um ano —44 semanas.

Onda mais forte

No verão de 1975, o ano seguinte ao lançamento do livro, Steven Spielberg lançou o filme “Tubarão”. Um monstro mecânico interpretou o papel-título, do tubarão gigante do litoral de Nova Jersey.

A partir dali, o simples ato de sair para nadar mudou para sempre.

Tubarão” fez com que Hollywood tivesse seu primeiro fenômeno de bilheteria da temporada de verão no hemisfério norte. O filme serviu de modelo de negócio para outras produções —e inspirou filmes de terror apavorantes.

“Tubarão” também horrorizou os cientistas especializados em tubarões, como George Burgess, da Universidade da Flórida, nos Estados Unidos. O filme representou erroneamente o grande tubarão-branco como um vingativo caçador de seres humanos.

Na verdade, os tubarões não atacam as pessoas, exceto em poucas ocasiões isoladas.

Burgess afirma que o filme inspirou dezenas de torneios de pesca de tubarões na costa leste dos Estados Unidos. Neles, os animais eram mortos “sem constrangimentos”.

Com isso, nas últimas décadas, os pescadores ajudaram a dizimar quase todas as espécies de tubarões existentes.

Mas “Tubarão” também fez florescer um movimento de conservação dos tubarões e dos oceanos, aumentando e melhorando o financiamento para as pesquisas do setor.

Os cientistas, agora, ressaltam o conceito de que os tubarões fazem parte do meio ambiente. A intenção é tentar evitar que os animais sejam demonizados, segundo o cientista.

Burgess catalogou o responsável pelos ataques de 1916 no Registro Internacional de Ataques de Tubarões como um grande tubarão-branco, mas outros cientistas defendem que teria se tratado de um tubarão-touro.

Este é um mistério que nunca será resolvido.

Esta reportagem foi publicada originalmente em 2016 e atualizada pela BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC) por motivo do 50º aniversário do filme “Tubarão”.

Este texto foi publicado originalmente aqui.



Fonte.:Folha de S.Paulo

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