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15 de agosto de 2025

Vai uma reforma das tarifas de eletricidade aí? – 12/08/2025 – Joisa Dutra

Vai uma reforma das tarifas de eletricidade aí? – 12/08/2025 – Joisa Dutra

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Estamos vivenciando uma transformação acelerada nos sistemas de energia ao redor do mundo. O modelo centralizado, onde grandes usinas geram energia, transportada por redes para os consumidores, está dando lugar a um cenário descentralizado, no qual qualquer pessoa pode produzir sua própria energia e até injetá-la na rede.

Além de gerar eletricidade em suas instalações, os consumidores passam a armazená-la —inclusive em veículos elétricos— para utilizá-la quando necessário ou comercializá-la, tornando-se agentes ativos no sistema elétrico.

Nosso futuro descentralizado já chegou. No Brasil, mais de quatro milhões de usuários fazem parte do sistema de geração distribuída, com a maioria utilizando a energia solar em seus telhados.

Contudo, se a tecnologia já avançou, as políticas e a regulação ainda não acompanharam essa mudança. Esse atraso aumenta os riscos, reduz os retornos e compromete o ritmo da descarbonização.

Para que possamos alcançar o futuro que queremos, é necessário repensar a alocação e recuperação de custos no sistema em transição.

Atualmente, no Brasil, mais de 80 milhões de consumidores residenciais pagam suas faturas com base em tarifas volumétricas, calculadas pela multiplicação do consumo, em kWh, por um valor unitário fixo, ajustado apenas nos períodos de revisão ou reajuste tarifário. Embora os valores variem entre concessionárias, essa estrutura não reflete as condições reais de uso do sistema, deixando de considerar, por exemplo, as variações de custo ao longo do dia.

Uma exceção são as bandeiras tarifárias, que refletem maior necessidade de geração termelétrica, mais cara, pelas condições previstas de atendimento do sistema. Em agosto estamos no nível mais elevado —vermelha 2.

Um dos principais reflexos desse modelo é a expansão acelerada da geração distribuída, com painéis solares principalmente. Os consumidores que aderem a esse modelo compensam parte do consumo com a energia que produzem, mas o problema é que o sistema de tarifação não leva em consideração as mudanças no comportamento de consumo e produção.

A tarifa volumétrica, cujo objetivo é cobrir os custos do sistema, inclui a geração de energia, redes de transmissão e distribuição, comercialização (leitura, faturamento, call centers) e políticas de incentivo (como renováveis, tarifa social, eficiência energética, etc.).

No entanto, quando os consumidores compensam sua energia com a produção própria, restam custos que precisam ser cobrados de outros usuários, geralmente de menor renda, não abarcados pela Tarifa Social —vale lembrar que somos um país de renda média. Esse modelo, do ponto de vista distributivo, acaba transferindo custos de quem tem mais para quem tem menos, justificando-se pela alegada contribuição ambiental.

A solução para esse desequilíbrio é mais fácil de desenhar do que implementar. Uma solução é adotar uma tarifa de duas partes, que inclui uma componente fixa para cobrir os custos da rede e do sistema. Infelizmente, esse mecanismo ainda não é adotado no Brasil. Consequentemente, os custos da expansão da geração distribuída acabam recaindo sobre os consumidores de menor renda.

Soluções semelhantes já foram adotadas na Austrália, Califórnia (EUA) e Reino Unido. Essas regiões agora buscam aperfeiçoar as abordagens para promover maior justiça e equidade. A Califórnia, por exemplo, discute a introdução de uma componente fixa que varie de acordo com a renda do usuário.

No Reino Unido, uma chamada para contribuições sobre esse tema está aberta até setembro. O foco está em discutir quem deve pagar os custos do sistema —os consumidores ou com ajuda dos contribuintes? E, caso sejam os consumidores, como diferenciar o pagamento de acordo com a capacidade de pagamento, por exemplo, com base em informações sobre renda, riqueza ou até mesmo o código postal?

As alternativas propostas devem ser avaliadas de acordo com várias dimensões: eficiência, equidade, simplicidade de implementação e a capacidade de contribuir para os objetivos de neutralidade de carbono e crescimento econômico. Essas escolhas nem sempre são fáceis, pois eficiência pode gerar complexidade, e buscar equidade pode aumentar os custos.

Mas uma coisa é clara: a evolução dos sistemas de energia exige novas soluções. Austrália, Califórnia e Reino Unido caminham para tarifas de duas partes, permitindo recuperar os custos do sistema e ao mesmo tempo promover a justiça. E no Brasil, será que a mudança está por vir?


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Fonte.:Folha de S.Paulo

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