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Na representação, os advogados afirmaram que a acusação da PGR (Procuradoria-Geral da República) contra Bolsonaro é “absurda” e que não há provas que liguem o ex-presidente aos planos para matar autoridades “e muitos menos aos atos de 8 de janeiro”.
“Em momento algum Jair Bolsonaro praticou qualquer conduta que tivesse por finalidade impedir ou dificultar a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Pelo contrário, sempre defendeu e reafirmou a democracia e o Estado de Direito”, diz o texto.
Na peça de 197 páginas, a defesa afirma ainda que a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, deve ser anulada, classificando-o como um “delator sem credibilidade”.
Segundo a argumentação, a falta de credibilidade de Cid ficou evidente com a descoberta de que ele teria violado as medidas cautelares impostas pelo acordo de delação.
A alegação final conta ainda com pareceres de professores renomados na área de Direito Penal.
Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas foram acusados de cometer os crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito, associação criminosa armada, dano qualificado do patrimônio público e deterioração de patrimônio tombado.
Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), Bolsonaro exerceu papel de líder da organização criminosa que articulou a tentativa de golpe e seria também o principal beneficiário do plano criminoso, caso tivesse sido bem-sucedido.
Falta de provas
A equipe de advogados de Bolsonaro, comandada por Celso Vilardi, afirma na alegação final não haver provas suficientes para acusar Jair Bolsonaro de envolvimento em planos para prender ministros do STF ou de ter mantido papel de liderança nos atos de 8 de janeiro.
Segundo os argumentos, a minuta golpista que previa “prisão de autoridades e intervenção no Tribunal Superior Eleitoral” não consta nos autos do processo. O texto que previa apenas a prisão do ministro Alexandre de Moraes também nunca foi encontrado, diz a defesa.
“Não existe texto, decreto ou minuta prevendo a prisão de qualquer autoridade. Não existe decreto assinado. Não existe pedido de movimentar as tropas nem pedido a quem possa assim fazer. Não existe prova do golpe imaginado pela acusação”.
Os advogados ainda destacam que, em sua denúncia, a Procuradoria-Geral da República não foi capaz de apontar detalhes que seriam importantes para provar o envolvimento do ex-presidente na trama golpista, entre eles qual foi sua participação exata em uma reunião com chefes das Forças Armadas no Palácio da Alvorada em 7 de dezembro.
Segundo a defesa, a PGR não soube apontar qual das minutas golpistas teria sido apresentada por Bolsonaro no encontro. “Mas estes documentos não existem nos autos. É grave! A verdade é que, encerrada a instrução probatória, a PGR ainda não consegue dizer qual teria sido a minuta de decreto que teria sido lida na reunião do dia 7 de dezembro.”
Sobre a existência de tal minuta, a defesa disse ainda que “ainda que se aceite presumir a existência de uma minuta de decreto em estudo, sem assinatura, sem apresentação, sem sequer a conclusão do texto”, os planos sequer saíram “do âmbito da mera preparação” e não existe “emprego de ato violento conforme exigido pelos tipos penais”.

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A defesa de Bolsonaro também diz não haver provas suficientes para apontar seu papel de liderança nos atos de 8 de janeiro de 2023, quando milhares de manifestantes descontentes com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022 invadiram as sedes dos Três Poderes.
Segundo os advogados, a acusação contra o ex-presidente teria um propósito específico “de conseguir a condenação, apesar das provas”. “Misturam-se os eventos, presume-se a responsabilidade do ex-presidente da República e consagra-se a narrativa de que ele é o responsável pelo ato final de 8 de janeiro.”
“Os invasores de 8 de janeiro, por essa narrativa, precisam de um chefe. De um líder. Nem a parcial Polícia Federal enxergou essa liderança. Nenhum dos réus afirmou a existência da liderança do ora Peticionário, mas a acusação está posta”, diz a alegação.

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Os advogados alegam ainda que, após perder as eleições e 2022, Bolsonaro garantiu a transição de poder e “evitou o caos”.
“Não há como condenar Jair Bolsonaro com base na prova produzida nos autos, que demonstrou fartamente que ele determinou a transição, evitou o caos com os caminhoneiros e atestou aos seus eleitores que o mundo não acabaria em 31 de dezembro, que o povo perceberia que o novo governo não faria bem ao país”, dizem.
Segundo a defesa, Bolsonaro não estava em bom estado de saúde no fim de 2022, se apresentando como alguém “monossilábico”, “abatido” e que mal conseguia “se movimentar” por causa da infecção na perna, de acordo com o depoimento de testemunhas.
“A transição ocorreu – por ordem do então presidente – de forma eficaz, pacífica e imediata. Sem intercorrências; sem qualquer dificuldade; e em todas as áreas, inclusive na área militar”, diz o texto.
‘Delator sem credibilidade’
Os advogados também lançaram um ataque direto à credibilidade de Mauro Cid, classificando-o como um “delator sem credibilidade”.
Segundo a defesa de Bolsonaro, a PGR reconhece em suas alegações oficiais que o ex-ajudante de ordens omitiu fatos graves, foi ambíguo e adotou uma narrativa seletiva em seus depoimentos, mas ainda assim pede a manutenção do acordo de delação e a aplicação de redução da pena.
“É a primeira vez na história que se vê o requerimento para a aceitação parcial de uma delação. Fala-se em omissões e ambiguidades, mas insiste-se em aproveitar parte da delação e premiar o colaborador”, diz o texto.
A defesa argumenta ainda que Cid “mentiu e o fez reiteradas vezes” e que ele mesmo teria descumprido os termos de seu acordo de colaboração com a Justiça.
Segundo o documento, o delator manteve conversas em um perfil de terceiro na rede social Instagram, o que configuraria um descumprimento do pacto com a Procuradoria.
O que acontece agora?
Após a entrega das alegações, o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, deve consolidar todo o processo em um relatório final, liberando o caso para julgamento, que acontecerá na Primeira Turma do STF.
Caberá ao presidente da Primeira Turma da Corte, ministro Cristiano Zanin, marcar a data do julgamento. Além de Alexandre de Moraes e Zanin, o colegiado é formado pelos ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
A expectativa é de que o julgamento ocorra em setembro. Essa fase do processo se refere à denúncia apresentada contra Bolsonaro e os integrantes do núcleo 1 de articulação do suposto golpe.
Além do ex-presidente, fazem parte do núcleo Mauro Cid; Alexandre Ramagem, deputado federal (PL-RJ) e ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência); Almir Garnier, ex-comandante da Marinha; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional; Paulo Sérgio Nogueira, ex-comandante do Exército; e Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL