De 10 a 21 de novembro de 2025, o mundo vai se voltar para Belém do Pará. Pela primeira vez, a maior conferência climática do planeta, a COP30, será realizada no coração da Amazônia. A escolha é simbólica e histórica, mas também escancara uma contradição que não pode ser ignorada.
Belém, capital de um dos estados com maior riqueza socioambiental do mundo, também é marcada por profundas desigualdades.
Mais de 40% da população vive sem acesso a saneamento básico. A infraestrutura urbana é precária, os efeitos da crise climática já atingem as periferias e as margens dos rios, e o racismo ambiental exclui populações inteiras do acesso a direitos fundamentais.
Esse cenário convida à reflexão: que modelo de desenvolvimento está sendo projetado a partir —ou sobre— a Amazônia?
O pensador quilombola Nego Bispo, que nos deixou em 2023, desafiava essa lógica ao afirmar que “desenvolvimento” é uma ideia cosmofóbica, baseada no medo ou na rejeição aos modos de vida que não seguem o padrão ocidental, urbano e industrial.
Em vez disso, propunha o conceito de envolvimento sustentável: uma forma de estar junto, em escuta e em relação com o território e com os saberes que dele emergem.
Essa mudança de mentalidade é urgente. E o ecossistema de impacto brasileiro pode ser um agente decisivo nessa transição. Hoje, centenas de negócios, cooperativas, redes comunitárias e organizações sociais atuam com foco em impacto socioambiental positivo.
Muitos estão enraizados na Amazônia, mas seguem invisíveis nas grandes decisões políticas e econômicas. Trabalham com inovação, propósito e sustentabilidade, mas enfrentam escassez de capital, entraves regulatórios e falta de apoio estratégico.
Um exemplo potente dessa atuação é a Assobio (Associação de Negócios da Sociobiodiversidade da Amazônia), com sede no Pará. A entidade articula organizações, empreendimentos e povos da floresta que produzem desde óleos vegetais e sementes até cosméticos naturais e artesanato tradicional.
A Assobio representa um modelo de economia viva, que gera renda e preserva a floresta com base no envolvimento e na corresponsabilidade. Outro exemplo relevante é a HuNin, um hub de impacto que nasce da Amazônia para o mundo.
A iniciativa conecta empreendedores, comunidades e investidores na criação de soluções regenerativas baseadas em dados, ancestralidade e inclusão. Seu foco está na construção de um modelo econômico que valoriza a biodiversidade e reconhece os saberes tradicionais como tecnologia de ponta.
A COP30 é uma oportunidade única para dar visibilidade a esse Brasil que já atua pela transição climática com justiça social. Mas, para isso, será preciso ir além dos discursos. É necessário garantir acesso a capital paciente, incentivos fiscais e políticas públicas eficazes para que esse ecossistema possa crescer e escalar seu impacto.
A floresta não precisa ser salva, precisa ser respeitada. O impacto não precisa ser criado, precisa ser reconhecido.
Que a COP30 marque o início de uma nova etapa: mais enraizada, mais justa e verdadeiramente conectada com os protagonistas da transformação —os povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e os empreendedores e organizações que já vivem o futuro que o mundo precisa aprender a enxergar e valorizar.
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Fonte.:Folha de S.Paulo