12:03 AM
21 de agosto de 2025

O plano de Israel que ameaça ‘enterrar a ideia de um Estado palestino’

O plano de Israel que ameaça ‘enterrar a ideia de um Estado palestino’

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O ministro falando em um microfone

Crédito, Reuters

Legenda da foto, O ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, falou durante uma coletiva de imprensa sobre a expansão dos assentamos de Israel

O anúncio acontece após vários países, como França, Canadá e Reino Unido afirmarem que planejam reconhecer o Estado palestino ainda este ano.

O homem por trás do projeto, o ministro das Finanças de extrema-direita, Bezalel Smotrich, disse que a proposta de um Estado palestino estava sendo retirada da mesa não com slogans, mas com ações.

Mais cedo, ele havia dito que o chamado plano E1, que estava congelado por décadas em meio à forte oposição, “enterraria a ideia de um Estado palestino.”

O projeto E1 tem sido amplamente criticado até mesmo por aliados israelenses, que o consideram uma flagrante violação do direito internacional, embora Israel conteste isso.

O Ministério das Relações Exteriores palestino classificou o plano como “uma extensão dos crimes de genocídio, deslocamento e anexação”, acusações que Israel rejeita há muito tempo.

Mas o que sabemos sobre o plano que a ONU alertou que acabaria com a perspectiva de uma solução de dois Estados?

O que é o plano

O assentamento de Israel Maale Adumin em meio a montanhas e árvores

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Israel construiu muitos assentamentos, como Maale Adumin, na Cisjordânia ocupada

Os assentamentos são um dos temas mais controversos entre Israel e os palestinos.

O projeto de assentamento E1, proposto pela primeira vez durante o governo de Yitzhak Rabin, nos anos de 1990, começou com um plano inicial para 2.500 casas.

Em 2004, expandiu-se para cerca de 4.000 unidades, junto com instalações comerciais e turísticas.

Entre 2009 e 2020, novas fases foram anunciadas, incluindo confisco de terras, planos de projeto e construção de estradas.

Mas as propostas foram congeladas todas as vezes devido à pressão internacional.

Desta vez, o plano é construir 3.401 casas em um trecho de terra ultra-sensível — aproximadamente 12 km² — entre Jerusalém Oriental e o assentamento existente de Maale Adumim.

Por que o plano é tão controverso?

O desenvolvimento da área E1 é visto há muito tempo como uma forma efetiva de impedir a criação do Estado palestino.

Isso porque o E1 fica em uma posição estratégica: ele separa áreas do sul de Jerusalém daquelas ao norte, e evitaria a formação de uma área urbana palestina contínua, conectando Ramallah, Jerusalém Oriental e Belém.

De acordo com o grupo israelense Peace Now, que monitora a atividade de assentamentos na Cisjordânia, as novas unidades habitacionais representariam um aumento de 33% no tamanho do assentamento de Maale Adumim, que atualmente tem uma população de aproximadamente 38 mil moradores.

O projeto conectaria a área residencial às zonas industriais em volta e ajudaria a expandir o controle de Israel sobre grandes partes da Cisjordânia, de acordo com o Peace Now.

O grupo disse ainda que a audiência final de aprovação do plano de assentamento E1 será realizada na próxima quarta-feira por um comitê técnico que já rejeitou todas as objeções às propostas.

O que é a Cisjordânia ocupada?

Colonos israelenses com rostos cobertos em cima de uma colina

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Durante a primeira metade de 2025, a ONU registrou 757 ataques de colonos que resultaram em vítimas palestinas ou danos a propriedades

A Cisjordânia ocupada é um território entre Israel e o rio Jordão e abriga cerca de três milhões de palestinos.

Existem cerca de 160 assentamentos israelenses, abrigando aproximadamente 700 mil judeus, na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental.

Os palestinos sempre se opuseram à presença de Israel nessas áreas. Israel ainda mantém o controle geral da Cisjordânia, mas desde os anos de 1990, o governo palestino — conhecido como Autoridade Palestina — administra a maioria das cidades.

Desde o ataque do Hamas em 07 de outubro de 2023, a pressão de Israel sobre os palestinos na Cisjordânia aumentou drasticamente, o que o país justifica como “medidas de segurança legítima”.

Durante a primeira metade de 2025, foram registrados 757 ataques de colonos que resultaram em vítimas palestinas ou danos a propriedades — um aumento de 13% em relação ao mesmo período em 2024.

Palestinos e grupos de direitos humanos também acusam as forças de segurança israelenses de falharem em seu dever legal, como ocupantes, de proteger os palestinos e seus próprios cidadãos, não apenas fechando os olhos para os ataques, mas até mesmo participando deles, de acordo com um relatório de 2024 da Human Rights Watch.

Israel alega que as Convenções de Genebra, que proíbem assentamentos em territórios ocupados, não se aplicam — uma visão contestada por muitos de seus próprios aliados, assim como por juristas internacionais.

Três soldados israelenses confrontam dois palestinos na Cisjordânia

Crédito, Reuters

Legenda da foto, O governo israelense não reconhece o direito dos palestinos de terem seu próprio Estado

Os palestinos querem que todos os assentamentos israelenses sejam removidos, à medida que eles enxergam a Cisjordânia ocupada como um terra para a futura independência do Estado palestino.

Contudo, o governo israelense não reconhece o direito dos palestinos de terem seu próprio Estado e argumenta que a Cisjordânia é parte do território israelense.

Em julho de 2024, o principal tribunal da ONU, a Corte Internacional de Justiça, disse que a presença contínua de Israel nos territórios palestinos ocupados era ilegal e que Israel deveria retirar os colonos.

Entre outras conclusões, a corte declarou que as restrições israelenses aos palestinos nos territórios ocupados constituíam “discriminações sistêmicas baseadas, entre outros fatores, em raça, religião ou origem étnica”.

O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu disse que o tribunal tomou uma “decisão de mentiras”.

“O povo judeu não é ocupante em sua própria terra, nem em nossa capital eterna, Jerusalém, nem em nossa herança ancestral de Judeia e Samaria [a Cisjordânia]”, afirmou Netanyahu.

A reação mundial ao plano E1

Após o anúncio do plano, Smotrich agradeceu ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e ao embaixador Mike Huckabee pelo apoio, afirmando que, na sua visão, a Cisjordânia é “uma parte inseparável da terra de Israel prometida por Deus”.

Ele também disse que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu apoiava seus planos de levar um milhão de novos colonos para a Cisjordânia.

O Ministério das Relações Exteriores palestino condenou o projeto E1, classificando como um ataque à unidade do território palestino e um golpe à possibilidade de estabelecer um Estado.

Também afirmou que o plano mina a coesão geográfica e demográfica e consolida a divisão da Cisjordânia em áreas isoladas cercadas pela expansão colonial, tornando a anexação mais fácil.

Em resposta ao plano de construção na área E1, o Departamento de Estado dos EUA disse que “uma Cisjordânia estável mantém Israel segura e alinhada com as metas desta administração de alcançar a paz na região”.

No entanto, a ONU e a União Europeia pediram que Israel não prossiga com o plano.

A ONU declarou que a construção do assentamento cortaria a Cisjordânia norte a sul, “minando severamente as perspectivas de realização de um Estado palestino viável e contíguo”.

Kaja Kallas, chefe de política externa da União Europeia, disse que o novo plano na área em E1 “mina ainda mais a solução de dois Estados, além de ser uma violação do direito internacional”.

O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, David Lammy, se opôs ao plano, dizendo que ele “dividiria um futuro Estado palestino em dois e representaria uma flagrante violação do direito internacional”.

O Ministério das Relações Exteriores da Turquia também condenou a decisão, dizendo que ela “desrespeita o direito internacional” e ataca a “integridade territorial” do Estado da Palestina.

O Egito chamou o projeto de “uma flagrante violação do direito internacional e das resoluções do Conselho de Segurança”.

O Ministério de Relações Exteriores da Jordânia também se opôs ao projeto, descrevendo-o como um ataque ao “direito inalienável do povo palestino de estabelecer um Estado independente e soberano baseado nas fronteiras de 4 de junho de 1967, com Jerusalém Oriental como sua capital”.

O anúncio do E1 ocorre logo após vários países, como França e o Canadá, afirmarem que planejam reconhecer o Estado palestino ainda este ano.

Atualmente, a maioria dos países — 147 dos 193 Estados-membros da ONU — reconhece formalmente um Estado palestino.

O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, disse que o Reino Unido também reconheceria o Estado palestino em setembro, a não ser que Israel cumprisse certas condições, incluindo concordar com um cessar-fogo em Gaza e reviver a perspectiva de uma solução de dois Estados.

Após o anúncio do novo plano de assentamento em E1, Smotrich disse que não “haveria estado para ser reconhecido.”

“Quem quer que esteja tentando reconhecer um Estado palestino hoje receberá nossa resposta na prática. Não com documento, decisões ou declarações, mas com fatos. Fatos em forma de casa, em forma de bairros”, acrescentou.

Reportagem adicional de Alla Daraghme e Muhannad Tutanji da BBC News Arabic.



Fonte.:BBC NEWS BRASIL

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