Para quem nunca praticou corrida, pode parecer um contrassenso viajar milhares de quilômetros para correr no meio da rua de uma outra cidade. Mas é exatamente isso que centenas de brasileiros farão neste domingo (24) e no dia 21 de setembro, quando acontecem as provas de meia maratona (21 km) e a maratona (42 km) de Buenos Aires, na Argentina.
“Já fui para lá três vezes e sou apaixonada”, comenta a executiva comercial Michele Farinelli, 37, corredora há 15 anos. A maratona na capital argentina será a segunda de sua vida —a primeira foi no Rio em 2024—, mas a primeira viagem internacional com o propósito de correr. “Vai ser um jeito diferente de visitar a cidade.”
Esta será a 40ª edição da prova, que é uma das principais da América do Sul e recebe muitos brasileiros. Segundo o Visit Buenos Aires, órgão de turismo da cidade, e a Fundação Ñandú, organizadora das corridas, no ano passado nossos compatriotas foram mais de 4 mil (mais da metade dos estrangeiros inscritos) nas duas provas. Neste ano, as inscrições custam entre US$ 90 e US$ 100.
Viajar para correr é uma tendência antiga, mas que se intensificou, de acordo com Fillipe Romano, professor do Instituto Federal e pesquisador do Giel/USP (Grupo Interdisciplinar de Estudos do Lazer da Universidade de São Paulo). A pandemia causou uma virada de chave para que mais viajantes passassem a buscar destinos para praticar esportes e, em especial, a corrida.
“Muita gente começou a correr para sair um pouco de casa e a corrida é como um ritual de iniciação para a prática esportiva, então o turismo também olha para isso”, avalia Romano. “Alguns destinos começaram a se moldar para atender demandas desse tipo de turismo e passaram a investir em infraestrutura e marketing para atrair esses turistas”, aponta o pesquisador.
Desde 2018, quando sediou os Jogos Olímpicos da Juventude, a Argentina tem fomentado o turismo esportivo —e promover eventos de corrida entrou na estratégia. Há três anos, o percurso das grandes provas mudou e se tornou mais agradável aos pés (por ser mais plano), e aos olhos —já que o corredor vai poder apreciar diferentes pontos turísticos da capital argentina, como a Casa Rosada, o Obelisco e o Teatro Colón, além dos estádios do Boca Juniors e do River Plate.
“É um percurso muito rápido, bom para quem quer bater recordes pessoais, porque ele foi reformulado para ser totalmente plano. Temos marcas de 21 km feitos em pouco menos de uma hora e dos 42 km em pouco mais de duas horas”, comenta Miguel Seoane, educador físico e assessor técnico da maratona de Buenos Aires.
Além do percurso plano, o clima ameno de fim de inverno na cidade deve favorecer os corredores que preferem correr no frio: a expectativa é que a temperatura na largada dos 21 km, programada para 8h da manhã, esteja entre 8 °C e 10 °C, e, no dia da maratona, entre 10 °C e 12 °C. Parece frio para um passeio pela cidade, mas pode agradar quem vai passar mais de uma hora em movimento.
Bater a meta de tempo é um dos objetivos do casal Isabella Novais, 31, e Vladimir Tavares, 59, que vão correr pela terceira vez fora do Brasil. “Amamos a ideia de unir viagens e corrida”, conta a instrutora de jovens aprendizes. Ela e o marido farão a meia maratona no domingo (24) e querem completar a distância em menos de duas horas. “Costumo dizer que correr 21 km é a melhor forma de fazer um city tour e realmente sentir a alma de uma cidade”, diz o advogado Tavares.
Para quem quiser treinar antes da prova, não faltam opções pela cidade. O percurso por Puerto Madero, às margens do rio da Prata, é agradável, seguro e plano. Para os amantes da natureza, vale a pena conhecer por dentro a Reserva Ecológica de Buenos Aires, que fica no mesmo bairro.
Perto do aeroporto Aeroparque ficam os bosques de Palermo, uma área repleta de parques como o Rosedal. A Avenida del Libertador, onde fica o Rosedal, sempre tem gente correndo de um lado para o outro, transitando entre bairros famosos da cidade, como Palermo e Recoleta. A via, inclusive, estará fechada nos dias de prova, já que faz parte dos roteiros.
“Indico conhecer o percurso se a pessoa quiser bater meta de tempo mas, pessoalmente, gosto da surpresa”, comenta Melina Kubota, treinadora da assessoria Corrida Para Mulheres. “Quando se viaja para uma prova, especialmente se for pegar avião ou ônibus por muitas horas, é interessante chegar dias antes na cidade e não sair da rotina”.
É tentador sair caminhando por pontos turísticos, comer comidas típicas e quebrar a rotina quando se viaja, mas, para quem vai correr longas distâncias, o recomendado é deixar o passeio e as aventuras gastronômicas para depois da prova. “Um dos maiores desafios de quem quer correr uma maratona é a rotina, que tem de ser muito regrada”, diz a treinadora.
Em viagens, a dica é se hospedar em algum lugar onde se possa cozinhar ou procurar restaurantes com opções de pratos familiares. Entre corredores, é de praxe comer massa na véspera de uma prova, o que deixa as pizzarias lotadas. Em Buenos Aires, o turista pode enfrentar fila na tradicional Güerrín, mas vale a pena. Em Palermo, o italiano La Piccola tem ambiente e cardápio agradáveis, inclusive para vegetarianos, mas a preços salgados.
Michele Farinelli está se preparando para os 42 km com mais intensidade desde junho e vai chegar em Buenos Aires nesta quinta (21). Junto com o grupo de corrida da assessoria que ela contratou, ela pretende dar um giro para sentir o clima e se adaptar à cidade antes do percurso. “O planejamento é essencial, mas o mais importante é curtir o processo e a viagem, torcer pelos amigos e aproveitar”, diz.
Fonte.:Folha de S.Paulo