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21 de agosto de 2025

Bancos brasileiros temem escalada de tensões entre EUA e STF

Bancos brasileiros temem escalada de tensões entre EUA e STF

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DIEGO FELIX, JOANA CUNHA E JÚLIA MOURA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O novo desdobramento do conflito entre Brasil e Estados Unidos, que abalou os mercados nesta terça-feira (19) após a sinalização do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), aos bancos que eventualmente aplicarem sanções financeiras a Alexandre de Moraes, gerou tensão no setor.

Presidentes e diretores de instituições financeiras ouvidos pela reportagem afirmam que o caso atingiu níveis preocupantes e que pode escalar ainda mais. O temor é que os Estados Unidos imponham restrições a essas empresas.

Juntos, os bancos brasileiros perderam R$ 41,3 bilhões em valor de mercado no pregão desta terça, puxados por Banco do Brasil, que caiu 6,02% e Santander, com 4,87%. BTG, Bradesco e Itaú recuaram mais de 3%.

A queda foi registrada um dia após Dino afirmar que a aplicação de leis estrangeiras com potencial de retaliação sobre brasileiros precisa antes passar por validações do próprio Supremo.

Com o ministro Alexandre de Moraes sancionado pela justiça norte-americana na Lei Magnitisky, existe um temor de que bancos brasileiros com operações nos EUA possam sofrer retaliações ao não aceitarem as restrições ao magistrado.

Pelas regras da Magnitsky, Moraes terá bens e ativos congelados nos Estados Unidos. Bancos locais, ou estrangeiros com relações comerciais e com operações utilizando dólar, deveriam, em tese, seguir a mesma tendência, atingindo até mesmo as contas do ministro do STF no Brasil.

Um dos poucos bancos que se manifestou sobre o caso nesta terça-feira (19), o Nubank, disse que ainda não tem um posicionamento oficial sobre o tema e vai avaliar o desenrolar ao longo das próximas semanas.

“Como política institucional, temos um cumprimento absoluto das leis brasileiras e das leis internacionais, mas, nesse momento, não tem nenhuma ação requerida do nosso lado. Em proteção à privacidade dos nossos clientes, também acho que não posso abrir uma outra informação. Mas a gente vai seguir, como sempre, com as regulações internacionais e nacionais e ter os diálogos com as autoridades da melhor forma”, disse a CEO do Nubank no Brasil, Livia Chanes, em entrevista coletiva.

A reportagem tentou contato com outros bancos para ouvir seus posicionamentos institucionais sobre o impasse, mas o tema é considerado delicado por envolver o STF e seus negócios fora do país.

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos), que costuma responder pelo setor como um todo, também não quis se manifestar.

A percepção de um dirigente com décadas de experiência no mercado financeiro é que se trata de um tema geopolítico, e não econômico.

Um ex-presidente de banco com operações nos dois países afirma que a questão é complexa desde o início, quando Trump estabeleceu as tarifas atreladas ao caso do julgamento de Jair Bolsonaro, e que a manifestação de Dino só aprofunda essa complexidade.

Ele afirma que, neste momento, os departamentos jurídicos estão avaliando com perplexidade um cenário que ficou mais incerto, porque além de abranger aspectos políticos e comerciais, cresce a dúvida sobre qual legislação deve ser seguida por um banco que tem filial ou negócios em outros países.

Em uma visão mais prática, um outro presidente de instituição financeira afirma que o ministro Dino não entendeu como a Lei Magnitsky funciona, impedindo que os bancos que atuam nos EUA operem com os indivíduos que são vetados por ela. Em sua avaliação, não existe um tema jurisdicional envolvido.

ECONOMISTAS EM SINTONIA
Na leitura de analistas consultados pela reportagem, os bancos privados seguirão sofrendo enquanto o cabo de guerra entre o governo Lula e Donald Trump não for finalizado, com o mercado fugindo do risco.

Hugo Queiroz, sócio da L4 Capital, afirma que os bancos com negócios nos Estados Unidos, como BTG, Itaú, Bradesco, Santander, Banrisul, além de outros médios, vão seguir a Magnitsky em algum momento, com fechamento de contas, cancelamento de cartões, seguros e resgate de fundos. Para ele, os bancos estão precificando qual impacto será maior na operação -se terão suas operações lá fora comprometidas, ou se vão receber o equivalente a uma “multa do Procon”.

“O que pode acontecer daqui para frente é pressão interna do Supremo Tribunal em cima das instituições, colocando multas diárias, cobrando que os bancos têm que deixar as contas abertas, porque estão seguindo orientações externas. Só que eles estão vinculados ao sistema Swift [sistema de pagamentos internacional]. Então, o impacto é muito maior de você descumprir a Magnitsky do que tomar uma chamada”, disse Queiroz.

Para os próximos dias, a tendência é que o mercado siga respondendo com aversão ao risco e os bancos devem patinar na B3. O referencial, neste momento, é uma multa recebida pelo banco francês BNP Paribas, em 2014, que descumpriu medidas da Lei Magnitsky, por manter relações com Cuba, irã e Sudão -todos com embargo de relações com os EUA- e teve de pagar US$ 8,9 bilhões.

“Estamos falando de R$ 50 bilhões, mais ou menos 15% a 20% de market cap [valor de mercado] na média desses bancos. A gente deve ver um ajuste das ações procurando esse referencial [da multa imposta a um banco], as ações vão cair até esse percentual e depois vão acompanhando os desdobramentos”, completou Queiroz, da L4 Capital.

A dúvida do mercado neste momento reside principalmente sobre até onde vai a sangria do Banco do Brasil, atualmente com uma queda de 17,2% no ano e extremamente prejudicado pelos balanços recentes. Procurado, o BB não se posicionou sobre a desvalorização das ações, mas disse em nota que “atua em plena conformidade à legislação brasileira, às normas dos mais de 20 países onde está presente e aos padrões internacionais que regem o sistema financeiro.”

Por ser um banco com parte estatal, a expectativa é que a instituição sofra de uma paralisia em meio à guerra comercial e amplie o efeito de desvalorização na Bolsa.

“O mercado tende a penalizar ainda mais as instituições públicas em ambientes como o atual. No caso do Banco do Brasil, o resultado trouxe muitas surpresas. Além dos ajustes de posições relacionados ao cenário interno da instituição, a sanção da lei torna-se ainda mais questionável dentro de um banco público. Por isso, acredito que o Banco continuará sendo mais pressionado do que os demais nesse contexto”, disse João Sá, cochefe de investimentos da Arton Advisors.

Eduardo Grübler, gestor da AMW (Asset Management by Warren), avalia que os investidores iniciaram nesta terça um movimento de liquidação para diminuir prejuízos e reequilibrar suas posições. Para o Banco do Brasil, que está em outro contexto de crise, o deslize de hoje é mais um episódio do já complicado cenário do banco.

“Sempre pode ficar pior. Isso é complicado, mas eu acredito que os principais fatores de risco já estão devidamente precificados. Não quer dizer que não possa aparecer coisas novas, sempre pode. Mas agora a gente teve mais um evento bastante relevante negativamente para o Banco do Brasil e não vejo novas surpresas nesse curto prazo”, disse Grübler.

Para Ilan Arbetman, analista da Ativa, a desvalorização dos bancos nesta terça é condizente com o que ele chama de novo capítulo da tensão entre Brasil e Estados Unidos.

“Cria uma grave incerteza regulatória para os bancos, que ficam em uma situação delicada, tendo que conciliar ordens de autoridades brasileiras com exigências de tribunais estrangeiros. Uma eventual escalada também acirraria o risco de sanções. É uma questão bem delicada que vai exigir bastante do setor bancário”, disse Arbetman.
O analista de bancos da Austin Rating, Luis Miguel Santacreu, observa que a caça ao Pix por parte do governo norte-americano também deve ser um componente a mais nesse cenário de dificuldades pelos quais as instituições financeiras vão passar nos próximos dias.

“O impacto de uma pessoa é insignificante para os bancos. Mas pode ser que a retaliação aumente, usando o assunto do Pix e os bancos poderiam ter mais dificuldades para trabalhar em âmbito internacional”, observou o analista.

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Fonte Noticias ao Minuto

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