“Todo mundo já deve ter ouvido falar de arrastão em restaurante, de invasão”, diz Ivan Ralston, chef do Tuju. “Tudo isso está um pouco ligado à realidade social que a gente tem no Brasil.”

Eleito chef do ano pelo júri da revista O Melhor de São Paulo deste ano (que também escolheu o Tuju como restaurante do ano e de melhor menu-degustação), Ralston levantou o tema segurança ao responder sobre o que falta no diálogo entre o setor gastronômico e o poder público.

A questão surgiu no seminário Impacto da Gastronomia na Sociedade, promovido nesta terça-feira pela Folha, com mediação da editora do Guia e de Comida Marília Miragaia.

Crimes do gênero têm acontecido com frequência em bairros com grande apelo gastronômico, como Santa Cecília, Barra Funda e Pinheiros. Em janeiro de 2025, por exemplo, um grupo invadiu um restaurante na rua Arruda Alvim, em Pinheiros, e levou celulares e relógios de clientes.

Representante do governo municipal no debate, o secretário de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de São Paulo, Rodrigo Goulart, pontuou que a questão da segurança está inserida em diferentes debates envolvendo o setor gastronômico.

“Estamos discutindo agora sobre novos aplicativos de delivery, e estamos discutindo a segurança com esse app. Porque vemos o entregador, mas não sabemos se é um de verdade ou se ele vai cometer algum delito”, afirma Goulart.

Para ele, a segurança tem que abraçar não só o consumidor em casa, mas também o profissional que faz a entrega e corre riscos. “Estamos utilizando a tecnologia e discutindo com todo setor para aprimorar essa questão.”

Ralston aproveitou a taxa de desemprego em São Paulo mencionada pelo secretário, de 5,4%, para fazer um exercício matemático.

“[Isso] dá em torno de 500 mil pessoas. E [o governo] serve 3 milhões de refeições por dia. Então tem muita gente em insegurança alimentar, mesmo empregada. Aí vêm esses problemas estruturais que temos no Brasil”, argumentou, dizendo que a questão também precisa da ajuda do setor privado para ser solucionada.

“Bairros em São Paulo estão sendo redescobertos e saneados graças à gastronomia, como Barra Funda e Santa Cecília”, emendou Ricardo Garrido, sócio-fundador da Cia. Tradicional de Comércio, que administra casas como Astor, Pirajá, Ici Brasserie e Bráz Pizzaria.

“Tem ruas que estão sendo saneadas por causa de um empreendedor que está se arriscando”, afirmou, citando jovens profissionais que estão gerando infraestrutura.

“E se tivesse transporte público para esses funcionários voltarem para casa [no fim da noite]?”, questionou, lembrando que os profissionais do setor têm uma demanda diferente do resto da população.

Joice Fernandes, diretora de Food Service da Seara (JBS), lembra que as articulações entre setores público e privado na agenda gastronômica tiveram mais espaço desde a pandemia.

“Temos que juntos buscar as melhores soluções, como para desenvolver gastronomia em bairros alternativos. Eu mesma moro em um bairro da zona oeste que agora está se desenvolvendo, mas que há dez anos não tinha nada”, disse.

“Como a gente fomenta isso numa pauta junto com a prefeitura, com associações e com a indústria sendo também uma apoiadora? Temos muitos caminhos para explorar nesse sentido”, completou.

O seminário Impacto da Gastronomia na Sociedade pode ser visto na íntegra no canal da Folha no Youtube.