“Não sou Xuxa nesse game/ O meu som não é pra baixinho”, cantou Duquesa em “Turma da Duq”, música que a rapper apresentou no começo da noite desta sexta-feira (12), no The Town. O festival, que começou no fim de semana passado, retorna agora e vai até domingo (14) no Autódromo de Interlagos, em São Paulo.
A música da artista, baiana de Feira de Santana, é repleta de letras que tratam expressamente de desejo e sexo, jogo de sedução e questões menos juvenis que a média no trap. Duquesa canta sobre negócios e dinheiro e não poupa ataques a quem se coloca no caminho se sua ambição.
A cantora foi uma das atrações do palco Quebrada, terceiro em tamanho e importância no The Town. Ela se apresentou depois de Duda Beat e antes de Pedro Sampaio, ambas atrações do palco The One, posicionado logo ao lado do espaço em que ela mostrou seu show.
Não era um ambiente favorável para a cantora, que seria mais celebrada se cantasse no dia do trap, gênero que ela defende, no sábado da semana anterior. Seu som dialoga pouco com o pop da escalação desta sexta, encabeçada por Backstreet Boys e que também contou com Jason Derulo e Luísa Sonza, entre outros.
Ainda assim, uma pequena multidão se posicionou para ver o show. Era possível caminhar tranquilamente pela plateia, que se mostrou interessada na baiana.
Duquesa firmou seu nome entre os grandes do trap nacional entre 2023 e 2024, anos em que lançou seus principais discos, os dois volumes de “Taurus”. As obras consolidaram o estilo da cantora, desbocada e sempre direta ao ponto, valendo-se de batidas duras ancoradas nos graves do subgênero do rap, com uma energia sombria.
Não há espaço para metáforas na lírica de Duquesa. “Eu não preciso de elogio, eu só me olho no espelho/ Parece que é meu filho, toda hora quer meu peito”, ela cantou em “Única”, em que soletrou a palavra que dá título à faixa no refrão —usada para definir o eu-lírico da música.
Parte do apelo em torno da rapper está na franqueza com que trata as questões que aborda, como se falasse publicamente o que geralmente só é dito entre melhores amigos. Mas há também um apelo em como engendra palavras no som —não foge dos maneirismos do trap, mas também não abdica de tentar rimar e encaixar os versos nas batidas.
A persona que Duquesa exibe nas letras é uma empresária rica e bem-sucedida, ciente do próprio talento e beleza e pronta para deixar uma horda de homens passando vontade.
Nada disso teria a mesma força se viesse da boca de outra pessoa. A baiana exibiu no palco uma postura em sintonia com o que ela canta por exemplo em “Turma da Duq”, em que afirma ter “energia de gostosa, atitude de gostosa”. Soou espontânea e espirituosa ainda que a persona das músicas se porte como uma heroína infalível e sem defeitos.
Uma das mais celebradas no The Town foi “99 Problemas”, com participação de MC Luanna, em que Duquesa brincou com um clássico do rap —”99 Problems”, de Jay-Z. Como na música do americano, a canção da brasileira retrata alguém importante que tem vários pepinos para resolver, mas nenhum deles é falta de mulher —no caso dele— ou de homem —no caso dela.
Para se adaptar ao ambiente, Duquesa mostrou um show versão light. Evitou cantar palavrões ou partes mais explícitas sobre sexo de algumas letras. Também contou com uma banda de guitarra, teclado e DJ, inteira formada por mulheres, e um balé.
Ao cantar “Primeiro de Maio (Gostosas Inteligentes)”, discursou sobre a pressão da indústria por corpos que estejam no padrão. “Quero que vocês se sintam incríveis com o corpo que têm”, afirmou.
Também dedicou “Gloria” ao pai, que “não está mais aqui”, e aos primos, que “foram levados pela criminalidade”. Falou ainda com os fãs, que chamou de “jovens que estão correndo, fazendo curso, faculdade, trabalhando”. “Somos a nova geração e podemos mudar o mundo.”
O show desacelerou na segunda metade, com músicas mais lentas como “Voo 1360”, “Toda Garota Como Eu =(=)”, “Só Um Flerte” e “Purple Rain“, esta última com participação de Yunk Vino. Mas aqueceu de novo no fim, em especial em “Disk P@#$%&!”, com Tasha e Tracie engrossando o caldo no palco.
A música de Duquesa ressoou especialmente entre as mulheres, que cantaram em coro seus versos mais conhecidos —incluindo um de “Disk P@#$%&!”, “bumbum GG, peitinho P, não vou sufocar usando bojo”. Não era muita gente, mas o suficiente para quebrar o gelo.
Se no trap o estilo está geralmente ligado ao consumo de marcas de luxo, na obra de Duquesa bolsa da Gucci não dá em árvore. Como cantou em “Big D!!!!! Pt. 2”, “primeiro você foca no lucro, depois você foca no fútil”.
O dinheiro abunda nas rimas da baiana, como resultado não só do talento musical, mas de inteligência financeira. Ele canta sobre tirar onda gastando, e mais ainda sobre fazer investimentos e proteger sua fortuna de aproveitadores.
Seria interessante vê-la cantar no dia do trap do The Town, não só porque teria mais público e energia no show. Em um gênero que muitas vezes espelha seu público —majoritariamente masculino e bastante jovem— ficaria ainda mais evidente como Duquesa é mais que um sopro de novidade, ela é a adulta da sala.
Fonte.:Folha de S.Paulo