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- Author, Shayan Sardarizadeh e Kayleen Devlin
- Role, BBC Verify
O presidente dos Estados Unidos fez o anúncio em sua plataforma Truth Social na quinta-feira, descrevendo a Antifa como um “DESASTRE DOENTIO E PERIGOSO DA ESQUERDA RADICAL”.
Ele também afirmou que “recomendará enfaticamente” que sejam investigados aqueles que financiam o movimento.
Antifa, que é uma abreviação de “antifascistas”, é um termo geral para grupos ativistas de esquerda radical e não constitui uma entidade única.
Geralmente é concebido mais como um movimento pouco definido, sem líderes, formado por manifestantes e ativistas.
O anúncio de Trump surge após o assassinato do ativista conservador Charlie Kirk, no dia 10 de setembro.
E embora não tenha sido apresentada nenhuma evidência que ligue o suspeito do assassinato, Tyler Robinson, a algum grupo, tanto Trump quanto altos funcionários de seu governo culparam repetidamente grupos de esquerda por criar um clima de hostilidade contra os conservadores antes do assassinato de Kirk.
Os críticos afirmam que Trump está usando o assassinato de Kirk como pretexto para reprimir seus oponentes políticos.
Alguns acadêmicos e especialistas argumentam que a medida anunciada por Trump de designar um grupo ou movimento doméstico como organização terrorista carece de fundamento legal e violaria a Primeira Emenda da Constituição, que protege a liberdade de expressão.
Outros questionam como o presidente pretende perseguir um grupo que não tem um líder distinto, nem uma lista de membros, nem uma estrutura formal.
Mas o que é a Antifa e quem ela representa?

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A que se opõem?
A Antifa se opõe ao neonazismo, ao neofascismo, à supremacia branca e ao racismo e, mais recentemente, à direita radical e ao que consideram como “um autoritarismo crescente” no governo de Donald Trump.
O objetivo da Antifa é impedir que esses grupos tenham uma plataforma para promover suas ideias, argumentando que a manifestação pública delas leva a ataques contra pessoas marginalizadas, incluindo minorias raciais, mulheres e membros da comunidade LGBTQ+.
“O argumento é que o antifascismo militante é inerentemente autodefesa devido à violência historicamente documentada exercida pelos fascistas, especialmente contra pessoas marginalizadas”, diz Mark Bray, autor de “Antifa: o manual antifascista” e professor de história na Universidade de Rutgers.
Embora o grupo seja ocasionalmente classificado como uma organização de esquerda ou de esquerda radical, seus membros têm se concentrado em combater a ideologia de direita radical, mais do que em promover iniciativas que representem um determinado setor do sistema político.
Ao contrário dos movimentos ou partidos de esquerda convencionais, o grupo não busca obter quotas de poder, ganhar eleições ou influenciar a aprovação de leis no Congresso.
Com um forte discurso anticapitalista, suas táticas têm sido associadas mais às de grupos anarquistas do que à esquerda tradicional.
A Antifa tornou-se alvo frequente de ataques por parte de influenciadores e políticos de direita que consideram o movimento um componente fundamental de uma rede de esquerda que, segundo eles, procura minar a liberdade de expressão, o direito ao porte de armas e o projeto americano em geral.
Como surgiram?
Alguns grupos Antifa datam as origens do seu movimento nas lutas contra os fascistas europeus nas décadas de 1920 e 1930.
A palavra “Antifa”, na verdade, vem do alemão antifaschistisch, que era um grupo antifascista alemão da década de 1930.
Mark Bray afirma que a Antifa americana moderna começou na década de 1980 com um grupo chamado Ação Antirracista. Seus membros enfrentaram skinheads neonazistas em shows punk no meio-oeste americano e em outros lugares.
Mas, no início da década de 2000, o movimento havia desaparecido quase completamente nos Estados Unidos.
Ele só experimentou um novo surto de interesse com a ascensão de Donald Trump e sua primeira eleição em 2016.
Desde então, os ativistas da Antifa têm se enfrentado regularmente com manifestantes de direita radical e com a polícia, tanto em discussões acaloradas online quanto em protestos violentos por todo os Estados Unidos.
Alguns exemplos desses confrontos são os que ocorreram nas manifestações da direita radical em Charlottesville em 2017 e os protestos após o assassinato de George Floyd pelas mãos da polícia em Minneapolis em 2020.

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Quais são suas táticas?
Os críticos do movimento afirmam que o que distingue a Antifa da esquerda convencional é a disposição de alguns ativistas em usar a violência para promover sua causa.
Os simpatizantes da Antifa, por sua vez, afirmam que o uso da força é em legítima defesa ou para proteger suas comunidades.
Suas táticas podem incluir a destruição de propriedade privada ou, às vezes, violência física contra seus oponentes.
Em 2017, cerca de 100 ativistas mascarados, portando faixas e bandeiras relacionadas ao Antifa, atacaram um grupo de manifestantes de direita em Berkeley, Califórnia, o que resultou em várias detenções.
Durante os distúrbios que eclodiram nos Estados Unidos após o assassinato de George Floyd em 2020, um autoproclamado ativista da Antifa de 48 anos atirou e matou um simpatizante do Patriot Prayer, um grupo de direita radical da região de Portland.
Os grupos Antifa também utilizam formas mais tradicionais de organização comunitária, como manifestações e marchas de protesto.
Como o movimento busca interromper eventos da direita radical e seus oradores, eles empregam diversas táticas, como gritar, entoar slogans e formar correntes humanas para bloquear os manifestantes de direita.
Na internet, suas táticas incluem monitorar a direita radical nas redes sociais e também divulgar informações pessoais sobre seus oponentes.
Após o assassinato de Charlie Kirk, a BBC Verify encontrou publicações de alguns membros autodenominados da Antifa no Reddit e no X defendendo o ataque.
As facções mais extremistas costumam vestir roupas escuras e cobrir o rosto, podendo portar itens como paus, escudos, spray de pimenta, facas, tijolos e correntes.
A falta de uma organização centralizada significa que as células da Antifa tendem a se formar de maneira orgânica, tanto online quanto pessoalmente.
Entre seus ativistas encontram-se anarquistas, comunistas e socialistas radicais que, em geral, compartilham opiniões antigovernamentais, anticapitalistas, pró-LGBTQ e pró-imigração.
Mas Antifa é por vezes utilizado como um termo genérico por políticos e comentaristas conservadores para incluir outros grupos liberais e de esquerda aos quais se opõem politicamente.
Uma organização terrorista?
Não está claro como o governo Trump planeja rotular como organização terrorista o que, na verdade, é um movimento descentralizado e sem uma estrutura ou hierarquia clara, e a Casa Branca não ofereceu mais detalhes.
Além disso, o movimento é uma entidade nacional e, como tal, não é candidato a ser incluído na lista de organizações terroristas estrangeiras do Departamento de Estado.
Esta lista inclui organizações extremistas como o autodenominado Estado Islâmico e a Al Qaeda, e este ano também foram incluídos vários bandos, gangues e cartéis de drogas latino-americanos.
A designação de “organização terrorista” é importante porque implica que os membros estrangeiros do grupo podem ser expulsos dos Estados Unidos e concede ao governo o poder de confiscar fundos e perseguir financiadores.
O movimento tem despertado há anos a ira de Trump, que inicialmente propôs a ideia de designar a Antifa como organização terrorista em 2020, em meio aos violentos protestos em todo o país após a morte de George Floyd.
O então diretor do FBI durante o primeiro governo Trump, Christopher Wray, disse em seu depoimento que a Antifa era “uma ideologia ou um movimento, não uma organização” e, como tal, carecia da estrutura hierárquica que normalmente permitiria que fosse designada como grupo terrorista pelo governo federal.
“Não conheço nenhum mecanismo legal que permita declarar oficialmente um grupo de âmbito nacional como organização terrorista”, disse Luke Baumgartner, pesquisador do Programa sobre Extremismo da Universidade George Washington, à BBC.
“Pelo que sei, trata-se apenas de uma declaração no Truth Social (a rede social de Trump) que não significa nada e, a menos que o Congresso queira tomar medidas concretas, não acredito que isso vá acontecer”, afirmou.
Outros especialistas que conversaram com a BBC Verify apontaram que o direito à liberdade de expressão, protegido pela Primeira Emenda da Constituição, poderia limitar a capacidade de Trump de aplicar tal designação.
O professor David Schanzer, diretor do Centro Triangular sobre Terrorismo e Segurança Nacional da Universidade de Duke, afirmou: “A Primeira Emenda protege o direito de associação, que abrange o direito das pessoas de formar grupos e proíbe o governo de interferir nas atividades desses grupos, a menos, é claro, que eles tenham infringido a lei”.
“A designação pelo presidente como ‘organização terrorista importante’ não altera esses direitos constitucionais fundamentais”, acrescentou.
Brad Evans, professor de violência política na Universidade de Bath, alertou que a falta de uma estrutura organizacional e de uma lista de membros da Antifa “dá ao governo uma oportunidade extraordinária para ampliar sua competência”.
Isso significa que qualquer pessoa suspeita de pertencer à Antifa teria que provar que não está associada a ela. Os perigos de extrapolar são mais do que evidentes.
Outros especialistas jurídicos questionam por que o governo Trump não pode se opor à Antifa com base na legislação vigente que trata de crimes como incitação à violência.
O anúncio de Trump faz parte de uma campanha mais ampla que ele empreendeu contra o que chama de “esquerda radical” após o assassinato de Charlie Kirk.
O presidente afirmou que “a violência política da esquerda radical prejudicou muitas pessoas inocentes e custou muitas vidas”.
As autoridades confirmaram que Tyler Robinson, acusado do assassinato de Kirk, tinha uma “ideologia esquerdista”, mas não forneceram muitos detalhes e ele não foi diretamente relacionado à Antifa.
Existe violência política da direita?

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Esta semana, o Departamento de Justiça eliminou um estudo sobre a violência política nos Estados Unidos que concluía que o extremismo radical de direita superava “todos os outros tipos de extremismo violento”.
A BBC perguntou por que esse estudo, publicado em 2024 pela agência de investigação do departamento, havia sido eliminado. O Departamento de Justiça respondeu que “não tinha comentários” a respeito.
A BBC Verify analisou cinco estudos independentes que examinaram os ataques por motivos políticos nos Estados Unidos nas últimas décadas, e todos eles sugerem que houve mais casos de violência política nos EUA cometidos por pessoas que os pesquisadores classificaram como de ideologia de direita do que de esquerda.
No entanto, como não existe uma definição coerente ou universal de “direita” e “esquerda”, é difícil medir as tendências da violência política ao longo do tempo.
O professor Robert Pape, da Universidade de Chicago, afirmou que nos últimos anos foram registrados “níveis históricos de assassinatos políticos e tentativas de assassinato”, tanto de políticos republicanos quanto democratas.
“O que vemos em nossos dados sobre o que acontece quando um líder político culpa uma das partes pela violência é que há um aumento no apoio à violência política, e não uma diminuição”, acrescentou.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL