8:16 AM
22 de setembro de 2025

Ousado, Silent Hill F resgata o prestígio da franquia e é um dos melhores jogos de terror da geração! Confira a análise

Ousado, Silent Hill F resgata o prestígio da franquia e é um dos melhores jogos de terror da geração! Confira a análise

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Silent Hill ficou anos adormecido, quase como um fantasma que assombrava a própria Konami. Entre remakes e promessas, a sensação era de que a franquia poderia nunca mais causar o mesmo impacto de antes. Silent Hill F, porém, chega como um respiro inesperado: não apenas retoma o espírito clássico do terror psicológico, mas também se arrisca ao transportar a série para uma nova cultura e um novo tempo.

O responsável pela nova trama é Ryukishi07, escritor conhecido pelo drama de assassinato Higurashi When They Cry, e sua assinatura é perceptível do início ao fim. A Neobards Entertainment, estúdio que vinha de projetos pouco celebrados (como Resident Evil Resistance e Resident Evil RE: Verse), surpreende ao assumir a produção e entregar um Silent Hill que soa familiar, mas também completamente diferente.

A mudança de cenário é radical. Saímos da tradicional cidade americana e vamos direto para o Japão rural dos anos 1960, uma escolha que mexe na base da franquia, mas que nunca abandona sua essência: simbolismos, metáforas e um terror que incomoda mais pela sugestão do que pela exposição.

Essa combinação de raízes antigas com ideias frescas é o que torna Silent Hill F tão especial. O jogo não se apoia apenas na nostalgia: ele experimenta, erra em alguns momentos, mas acerta em cheio em outros. E essa ousadia é justamente o que o posiciona como um dos lançamentos mais interessantes da Konami nos últimos anos.

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Mais do que um novo capítulo, Silent Hill F funciona quase como um novo ponto de partida para a série. Ele honra a tradição, mas aponta para direções que talvez nunca imaginássemos ver em um Silent Hill — e é nesse equilíbrio entre respeito e reinvenção que o jogo encontra sua força.

O Silent Hill da nova geração que herda as melhores qualidades da era de ouro do terror japonês

Silent Hill F aposta em Hinako como protagonista, uma estudante e atleta cuja vida é marcada por abusos familiares, amizades tóxicas e uma rotina sufocante de repressão.

É a partir da sua perspectiva que a história se desenrola, com um enredo fragmentado, cheio de interpretações e silêncios incômodos — aspectos que são marcas registradas da franquia. 

O período histórico também dá pistas sutis sobre a situação de Hinako na época. Em 1960, as mulheres japonesas enfrentavam uma grande desigualdade, com a ideologia patriarcal a relegá-las a um papel secundário na sociedade — o que se refletia na expectativa social de um comportamento submisso. 

Considerando os abusos sofridos por Hinako, tanto dentro de casa quanto no ciclo social em que está inserida, esse contexto ajuda o jogador compreender o que se passa na sua cabeça.

A mudança de cenário também dá o tom. Saímos das ruas enevoadas de Silent Hill para Ebisugaoka, uma cidade fictícia do Japão rural dos anos 1960. 

Becos estreitos, arquitetura compacta e campos de arroz criam uma ambientação tão opressora quanto familiar, reforçando a sensação de isolamento e de uma comunidade lentamente corroída por algo maior que ela.

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A narrativa alterna entre duas camadas: o colapso da cidade diante da praga que vai aos poucos tomando o lugar e a jornada espiritual de Hinako, guiada por um Yokai em forma de raposa. Essa entidade, inspirada no mito da kitsune, traz uma aura mística e ambígua, deixando sempre no ar a dúvida sobre sua real intenção — um reflexo direto da própria fragilidade emocional da protagonista.

Outro símbolo central nesse background é a flor Higanbana, o lírio-aranha-vermelho, associada no budismo à morte e à transição entre mundos. Ela não aparece apenas como detalhe estético, mas como parte da própria narrativa, funcionando como metáfora para a decadência da cidade e os traumas de Hinako.

Esse cuidado em retratar as nuances da cultura japonesa se reflete em templos, estátuas e pequenas referências espalhadas pelo cenário. A sensação é de que cada detalhe foi colocado ali para reforçar a dualidade entre espiritualidade e sofrimento humano — um equilíbrio que a série sempre soube explorar muito bem.

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Como nos melhores capítulos de Silent Hill, a compreensão da história depende da curiosidade do jogador. Arquivos, diálogos e pistas pelos cenários revelam pouco a pouco o passado conturbado da protagonista e os segredos da cidade. Cada nova descoberta dá mais peso à jornada, ao mesmo tempo em que levanta ainda mais perguntas.

Há também um fator de replay interessante. Silent Hill F oferece múltiplos finais, cada um desbloqueado por condições específicas. O New Game+ adiciona áreas inéditas e detalhes extras que ampliam o quebra-cabeça narrativo, incentivando uma segunda ou até mesmo uma terceira jogada.

No fim, o que Silent Hill F entrega é uma narrativa densa, rica em simbolismos e aberta a interpretações, sem perder de vista o terror psicológico que consolidou a série. É um equilíbrio raro: a história dialoga com as origens da franquia, mas também aponta para novos caminhos que só esse mergulho na cultura japonesa poderia oferecer.

O combate é a cereja do bolo

Se há um ponto que realmente surpreende em Silent Hill F, é o combate. A Neobards rompeu com a tradição da série e trouxe um sistema muito mais ousado, dinâmico e exigente. Para veteranos, a mudança pode soar estranha no início, mas é inegável: mesmo diferente, funciona bem dentro da proposta.

Se você é fã de longa data, vá de mente aberta — mas saiba que, embora seja totalmente funcional, é completamente diferente de tudo que já foi visto na franquia. Isso pode causar estranheza no primeiro momento, mas depois que você domina os controles e o timing da stamina, o jogo muda.

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Enquanto os primeiros jogos apostavam em armas improvisadas e na sensação constante de impotência, aqui o estúdio preferiu um caminho híbrido entre ação e terror de sobrevivência. Embora pegue inspiração no gênero, não chega a ser, de fato, um soulslike — mas exige atenção e precisão em cada confronto.

Hinako conta com um arsenal mais variado do que o esperado. Ela pode carregar até três armas brancas no inventário, cada uma com durabilidade própria, indo de pedaços de cano a marretas e foices. Além disso, um sistema triplo de barras (vida, sanidade e stamina) dita o ritmo das batalhas.

Apesar de mais dinâmico, o combate certamente não é voltado para a ação desenfreada. Cada confronto é pontual, os recursos continuam limitados e a durabilidade das armas pesa na estratégia, principalmente nas dificuldades mais altas. A tensão clássica da série se mantém, ainda que em um formato muito diferente.

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O sistema de esquiva também merece destaque: ele torna os encontros intensos e cheios de timing, mas exige atenção ao consumo de stamina. 

Cada desvio errado pode custar caro e transformar Hinako em um alvo fácil. Essa escolha deixa os embates menos previsíveis e reforça a ideia de que cada inimigo precisa ser respeitado da sua própria maneira.

Nem tudo, porém, é impecável. A movimentação pode parecer um pouco rígida demais em momentos de maior pressão, e a câmera não colabora tanto em áreas mais estreitas. São problemas pontuais, mas podem causar um certo descontentamento em jogadores mais exigentes.

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Por outro lado, a variedade de monstros dá frescor à experiência. Cada criatura exige uma abordagem diferente, seja explorando vulnerabilidades ou entendendo quando é melhor recuar.

E quando o jogo leva o combate para certo ponto do mundo espiritual, Hinako ganha habilidades especiais que mudam completamente a dinâmica — rendendo alguns dos momentos mais divertidos da campanha.

Exploração bem recompensada

Silent Hill F recompensa quem decide se perder nos becos e recantos de Ebisugaoka. A cidade, já sufocante por natureza, guarda segredos espalhados pelo cenário que ampliam a sensação de mistério. 

Cada desvio revela pequenos detalhes que enriquecem o universo do jogo, criando uma experiência que não se limita apenas à narrativa principal.

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A exploração não se resume apenas a documentos e pistas: os Omamoris, amuletos japoneses tradicionalmente vendidos em templos, também podem ser encontrados para adicionar uma camada extra de complexidade ao sistema.

Eles funcionam como modificadores de atributos e oferecem vantagens como desvios mais precisos, maior resistência ou menor consumo de stamina. É um recurso simples, mas que conversa diretamente com o combate e aprofunda a estratégia sem quebrar a imersão.

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Além disso, o design da Neobards aposta na ambientação e nos puzzles para manter a tensão em alta. Templos, vilarejos e campos infestados pela praga floral escondem enigmas que exigem leitura atenta dos cenários e interpretação de símbolos — algo que reforça o DNA clássico da franquia. Não é apenas sobre lógica: é sobre observar e interpretar detalhes sutis que o jogo nunca entrega de bandeja.

Esses puzzles seguem uma linha muito próxima à escola de design da era PS2, remetendo a jogos como Fatal Frame e Siren. Mais do que testar raciocínio, eles convidam o jogador a absorver a atmosfera e a desconfiar de cada objeto no ambiente. A sensação é de redescobrir um estilo de terror que privilegia a sugestão e o detalhe em vez do óbvio.

O level design também contribui para esse desconforto constante. Áreas interconectadas, corredores estreitos e espaços opressivos reforçam a sensação sufocante de aprisionamento. 

A cidade parece querer repelir o jogador, mas ao mesmo tempo o convida a avançar, criando uma tensão que se mantém até os créditos finais.

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É nesse equilíbrio entre puzzles desafiadores, cenários sufocantes e ambientação carregada de simbolismo que Silent Hill F mais se aproxima da essência dos clássicos de terror japonês. O jogo não tem pressa em revelar tudo e prefere que cada passo seja acompanhado por incerteza e desconforto.

O próprio Ryukishi07 resumiu bem essa filosofia ao afirmar que buscou transmitir a “beleza no terror”. A visão se reflete em cada detalhe: flores vermelhas que desabrocham em meio à decadência, templos tomados pela praga e a constante dúvida se aquilo que parece belo não esconde algo profundamente perturbador. É nessa fronteira entre o belo e o aterrador que Silent Hill F encontra sua identidade.

Monstros são representações grotescas dos anseios de Hinako

O terror de Silent Hill sempre encontrou sua força nos monstros — e em F as coisas não seriam diferentes. As ruas estreitas e sufocantes de Ebisugaoka só funcionam porque estão habitadas por criaturas grotescas, que parecem saídas de um pesadelo entre o mundo biológico e espiritual. 

A inspiração vem tanto da mitologia japonesa quanto do corpo humano em decomposição, criando inimigos que são, ao mesmo tempo, fascinantes e perturbadores.

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Logo nas primeiras horas, a criatividade do design já salta aos olhos. Há manequins cravados de lâminas que se movem de forma irregular, um corpo distorcido coberto por cabeças de boneca e até um quadrúpede que lembra o Demogorgon de Stranger Things

Todos compartilham a mesma estética de deformação e parasitismo floral, com pétalas e raízes brotando de feridas abertas. É o tipo de imagem que fica na memória por muito tempo.

O fator susto funciona em várias camadas. Há os momentos clássicos de jump scare, mas o verdadeiro desconforto está no design grotesco, que incomoda por sua estranheza e pela sensação de algo quase familiar — mas deformado. 

O uso das flores parasitárias é particularmente eficiente: belas à primeira vista, mas sempre associadas à dor e à morte. É uma estética que incomoda justamente porque não deveria existir.

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Os encontros com chefes também merecem destaque. Embora não sejam os mais difíceis da franquia, sua direção artística compensa com sobra. 

Cada boss funciona como uma representação monstruosa dos medos e traumas de Hinako, evocando aquele subtexto psicológico tão característico de Silent Hill. Não é apenas lutar contra um inimigo gigante — é enfrentar, de forma literal, fragmentos do inconsciente da protagonista.

No quesito dificuldade, Silent Hill F encontra um ponto de equilíbrio interessante. Não chega a punir como um survival horror hardcore, mas também não deixa espaço para descuidos. 

Gerenciar recursos continua sendo essencial: gastar demais em curativos ou abusar das armas especiais pode transformar qualquer esquina em sentença de morte. Ainda assim, o jogo oferece ajustes de dificuldade que tornam a experiência mais acessível sem reduzir a tensão.

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A curva de aprendizado é bem construída, com inimigos comuns servindo de introdução a padrões de ataque e chefes exigindo leituras mais atentas. 

O resultado é uma experiência que mantém a pressão, mas sem cair no terreno da frustração. É um terror que assusta, desafia e incomoda — exatamente como um Silent Hill deve ser.

A trilha sonora orquestra o tom da trama

Se o combate dá a intensidade de Silent Hill F, a trilha sonora é quem dita o tom da experiência. O retorno do compositor Akira Yamaoka garante aquele equilíbrio entre silêncio incômodo, ruídos metálicos e melodias melancólicas que já se tornaram marca registrada da franquia. 

É uma trilha que não apenas acompanha a ação, mas molda a sensação de desconforto e vulnerabilidade a cada passo dado em Ebisugaoka.

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É impossível não lembrar de Silent Hill 2 ao ouvir algumas composições — não porque são repetidas, mas porque evocam o mesmo tipo de melancolia sufocante. 

A música de Yamaoka continua sendo menos sobre grandiosidade orquestral e mais sobre incomodar, sobre forçar o jogador a se sentir exposto e frágil. É aquele tipo de som que se cola na atmosfera e transforma simples corredores em espaços cheios de medo.

A parceria com Ryukishi07 também potencializa esse efeito. O estilo literário do roteirista, cheio de diálogos densos e camadas emocionais, encontra o eco perfeito na trilha de Yamaoka. A música reforça os dilemas internos de Hinako, enquanto o texto dá contexto emocional para cada acorde ou silêncio proposital.

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O resultado é uma direção criativa que entende o terror como mais do que susto ou grotesco. Silent Hill F aposta na melancolia, no estranhamento e no desconforto psicológico como pilares da sua identidade.

E isso só funciona porque a união entre Yamaoka e Ryukishi07 cria uma experiência coesa, capaz de honrar o passado da franquia ao mesmo tempo em que lhe dá uma nova voz.

Silent Hill F é a fênix que renasce das cinzas

Silent Hill F não é apenas um retorno — é uma reinvenção. A Neobards e a Konami conseguiram trazer a série de volta à relevância sem recorrer a cópias das fórmulas antigas, apostando em uma ambientação japonesa inédita, uma protagonista complexa e um sistema de combate que quebra expectativas. É uma abordagem que surpreende, mas que também respeita o DNA da franquia.

Os maiores méritos estão na atmosfera sufocante, no combate e no enredo de Hinako, que mistura trauma pessoal com mitologia e simbolismos culturais. Esses elementos garantem à narrativa uma força única, colocando Silent Hill F em um lugar distinto dentro da saga.

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Claro, há deslizes: a movimentação em combate e a câmera em alguns momentos não são das mais refinadas. Mas essas falhas não chegam a comprometer a experiência.

Pelo contrário, a ousadia em mexer na estrutura tradicional da série traz um frescor raro para franquias de longa data, que muitas vezes ficam presas à própria nostalgia.

A trilha sonora de Akira Yamaoka e a escrita de Ryukishi07 também coroam esse pacote criativo, reforçando o tom melancólico e perturbador que marca os melhores momentos da série. O resultado é um jogo que sabe equilibrar reverência e inovação, tradição e risco.

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No fim das contas, Silent Hill F não só entrega o que os fãs esperavam, como também aponta para um futuro promissor. É um capítulo que reimagina a franquia sem perder sua essência, reafirmando Silent Hill como um nome indispensável na história dos jogos de terror.

Pontos positivos

  • Trama nos moldes dos maiores clássicos da franquia Silent Hill
  • Ambientação imersiva com puzzles inteligentes e exploração bem recompensada
  • Combate ousado que se desprende totalmente dos padrões da série e traz frescor à fórmula
  • A direção artística, tanto dos monstros quanto da cidade, é marcante
  • Trilha sonora atmosférica que causa sensação genuína de medo

Pontos negativos

  • Problemas pontuais na movimentação da câmera em lugares mais estreitos
  • O jogo tem começo, meio e um fim interpretativo — mas poderia ser maior
  • Quedas pontuais no FPS, principalmente nas transições entre cutscene e gameplay

Nota do Voxel: 92



Fonte.: TecMundo

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