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6 de outubro de 2025

Argentina: operadores de câmbio drenam dólares de Milei – 05/10/2025 – Mercado

Argentina: operadores de câmbio drenam dólares de Milei – 05/10/2025 – Mercado

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Javier Milei enfrenta um formidável adversário enquanto tenta conter uma corrida contra o peso antes das eleições de meio de mandato: os operadores de câmbio da Argentina.

A história de rígidos controles cambiais e crises econômicas do país estimulou os investidores a desenvolverem inúmeras estratégias para extrair lucro das políticas governamentais. Mas essa demanda voraz por dólares pode ser um problema para os líderes argentinos.

Operadores individuais adquiriram US$ 9,5 bilhões do banco central da Argentina entre abril a agosto para vendê-los por mais pesos no mercado de câmbio paralelo, segundo relatório do Banco Provincia de Buenos Aires, de propriedade pública, citado pela corretora local One618.

As operações —um montante equivalente a metade das exportações agrícolas da temporada de colheita da Argentina— dificultam a capacidade da autoridade monetária de comprar dólares para reconstruir suas escassas reservas de moeda sem enfraquecer o peso, o que Milei está empenhado em evitar.

“Na Argentina, qualquer pessoa que entenda os truques do mercado pode obter lucros que não existem em outras partes do mundo, às custas de drenar o banco central”, diz Salvador Vitelli, chefe de pesquisa da consultoria financeira local Grupo Romano.

A falha de Milei em construir reservas deixou os investidores nervosos nas últimas semanas e provocou uma venda de ativos argentinos.

A turbulência do mercado começou no mês passado, quando a derrota eleitoral no legislativo lançou dúvidas sobre o apoio às reformas de livre mercado de Milei, fazendo os preços dos títulos e o peso despencarem. Isso alimentou expectativas de que o governo logo terá que desvalorizar o peso de sua atual banda de taxa de câmbio, agravando a venda.

Uma promessa vagamente formulada de apoio financeiro do secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, amenizou, mas não encerrou a volatilidade, com o peso subindo 10% na semana retrasada antes de cair 7% na passada.

Milei culpou inimigos políticos, que ele diz terem vendido pesos ou encorajado outros a fazê-lo. “Eles estão dispostos a queimar tudo para ganhar poder”, disse ele à mídia local na quarta-feira (1º).

Mas analistas dizem que os operadores também têm razões menos nefastas para pressionar o peso.

A demanda por dólares normalmente aumenta na Argentina antes das eleições, à medida que indivíduos e empresas se protegem contra riscos políticos. A tendência se intensificou desde a surpreendente derrota nas primárias de 2019 do presidente conservador Mauricio Macri para os peronistas de esquerda, que eliminou quase 40% do mercado de ações da Argentina em um único dia.

A demanda pelo dólar também aumentou no mês passado, quando a crise política enfraqueceu tanto a taxa de câmbio do mercado ilegal quanto a taxa paralela legal, enquanto o peso era sustentado pela intervenção do banco central. A crescente diferença entre as taxas de câmbio incentivou operações de arbitragem, conhecidas localmente como “el rulo” (o rolo).

Essa é uma das manobras mais simples que os argentinos usam para obter a taxa de câmbio oficial, à qual o acesso havia sido rigidamente restrito antes de Milei afrouxar os controles cambiais em abril.

Empresas podem fabricar contas por consultoria jurídica no exterior ou serviços de TI para acessar a taxa de câmbio mais barata para importadores. Na década de 2010, havia uma “tendência de abrir bares de praia falsos no Uruguai e trazer uma pilha de cartões de crédito para fazer pagamentos em uma máquina de cartão”, disse Diego Fraga, um advogado tributário argentino.

“As distorções cambiais dão origem a muitos negócios, alguns legais, outros nem tanto”, acrescentou.

As políticas cambiais são fundamentais para o trabalho dos operadores argentinos. “Enquanto os de Nova York começam o dia verificando agências de notícias, a primeira coisa que um operador argentino verifica é a página de comunicações do banco central”, disse um corretor local.

“É muito importante ter um bom departamento jurídico que possa interpretar rapidamente cada nova regra para que você possa capitalizar rapidamente as mudanças sem incorrer em multas.”

Na sexta-feira da semana passada, o governo de Milei restabeleceu uma regra que proíbe indivíduos que compram dólares no mercado oficial de vendê-los nos mercados paralelos. Enquanto isso, o banco central alertou aplicativos de carteira digital, usados por muitos argentinos para investir e fazer pagamentos, para pararem de vender dólares à taxa oficial, dizendo que eles haviam interpretado mal as regras existentes.

As medidas foram projetadas para conter a arbitragem, que consumiu uma grande parte de um influxo de US$ 7 bilhões de dólares de exportação agrícola de grãos estocados que o governo atraiu para o mercado nas últimas semanas por meio de uma breve isenção de impostos de exportação, enquanto lutava para sustentar o peso.

Mas analistas disseram que os argentinos estão bem treinados em encontrar maneiras de contornar as regras. “Você terá casais onde um está comprando o dólar oficial, e o outro o vende no mercado paralelo”, disse Vitelli.

Reintroduzir restrições também tem efeitos colaterais. Cortar o fornecimento de dólares oficiais para o mercado paralelo fez com que o peso paralelo enfraquecesse ainda mais, ampliando a diferença com a taxa de câmbio oficial para 5%.

Quanto maior a diferença na taxa de câmbio, dizem os analistas, mais os argentinos tendem a fazer outras coisas que pressionam as reservas do banco central, como aumentar as importações, que, na prática, tornam-se subsidiadas quando há uma taxa oficial mais barata.

“É uma ladeira escorregadia”, disse Juan Manuel Pazos, economista-chefe da One618. “Qualquer coisa restrição cria uma arbitragem em outro lugar e, portanto, você precisa criar mais regulamentações para bloquear essa arbitragem, e no momento em que você bloqueia essa arbitragem, você cria outra… No fim, 46 milhões de pessoas acabam procurando maneiras de drenar reservas.”

Economistas estimam que o banco central tem apenas alguns bilhões de dólares em reservas líquidas que podem usar para sustentar o peso e defender sua banda de taxa de câmbio, faltando três semanas para as eleições de meio de mandato.

A maioria disse que esperava que as autoridades vendessem o que pudessem para evitar uma desvalorização prejudicial antes das eleições, mas que a política cambial do governo deve mudar depois disso.

Na tentativa de acalmar os mercados, Milei disse à rádio local na quarta-feira que o governo estava “trabalhando nos detalhes” do apoio dos EUA. Funcionários do Ministério da Economia devem visitar Washington neste fim de semana, antes da própria visita de Milei à Casa Branca em 14 de outubro.

“Sabíamos que isso poderia acontecer”, acrescentou o presidente sobre a turbulência do mercado. “Agora é uma questão de passar pelo inferno que é este ano eleitoral.”



Fonte.:Folha de S.Paulo

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