Destino de montanha com vista para o mar, Cunha é um exemplo de lugar que está conseguindo crescer enquanto destino turístico ao mesmo tempo em que preserva suas tradições. Imersa na Serra da Bocaina, a cidade atrai quem busca sossego e clima de roça e acaba surpreendendo pela ótima gastronomia e variedade de atividades. Além dos ateliês de cerâmicas e de paisagens como a do famoso O Lavandário, que fizeram a fama de Cunha, há restaurantes que não devem nada para o dos grandes centros, trilhas, cachoeiras e propriedades abertas à visitação que cultivam de oliveiras a cogumelos.
Para desvendar todos esses lados, o destino convida a desacelerar e por isso o roteiro abaixo tem quatro dias de duração, idealmente começando em uma quinta-feira e terminando em um domingo (no início da semana, muitas atrações e restaurantes fecham). Ter carro é essencial, já que os restaurantes e as atrações ficam espalhados entre o centro da cidade e a Estrada Cunha-Paraty. Em geral, a condição das estradas é boa, com alguns trechos de terra. Quem dirige carros baixos não tem o que temer: o que mais se vê por lá são Fuscas e Fiat Unos. Por outro lado, o sinal de celular é instável e vale a pena baixar o mapa de Cunha no Google Maps.

DIA 1 – QUINTA-FEIRA
Pousada Cheiro da Terra
Cerca de 230 km separam a capital paulista de Cunha, percurso que percorri em pouco mais de três horas em uma quinta-feira sem trânsito. Ao passar pelo portal de entrada da cidade, são poucos metros até a Pousada Cheiro da Terra, uma daquelas hospedagens que são um convite ao descanso.

Espalhados por um amplo terreno estão 21 chalés independentes que garantem muita privacidade aos casais: cada um é pintado de uma cor, e a maioria possui gostosas varandas com rede para balançar. A lareira a lenha garante um quarto aconchegante nas noites sempre frescas de Cunha, assim como o ar condicionado que funciona nos modos quente e frio. Mas o que eu gostei mesmo foi do chuveiro a gás, com água quente e ótima pressão.


A propriedade, que estava toda florida no início da primavera, ainda possui piscina, sauna e licor e cachaça sempre à disposição na recepção. O grande diferencial, porém, é o ateliê de cerâmica, onde é possível colocar a mão na massa, ou melhor, na argila (falarei mais sobre essa experiência no sábado). A isso se soma a acolhida de Marivaldo, o simpático proprietário da pousada, e de sua border collie Jade, que sempre me recebia abanando o rabo e pedindo um carinho na lombar.
Almoço na Suzana Shiitake e Cachoeira do Pimenta
A vontade era ficar na pousada mesmo, sendo ninada na rede enquanto ouvia os passarinhos e admirava as flores, mas a fome apertou e um almoço delicioso me esperava na Suzana Shiitake. Produtor de cogumelos, o sítio fica a cerca de trinta minutos de carro do centro de Cunha, sendo que o trecho final é por uma estrada de terra em boas condições. Para não perder a viagem e para que a comida já esteja no fogo quando você chegar, combine a visita com pelo menos um dia de antecedência pelo direct do Instagram ou pelo Whatsapp.

Ao chegar, primeiro fiz uma visita informal e muito interessante às duas estufas para aprender sobre o cultivo de shiitakes e shimejis. Só então fui levada para um deck de madeira, onde a refeição foi servida. Comece pela conserva de cogumelos com torradinhas antes de seguir para o prato principal, que pode ser um risoto de funghi ou a moqueca de cogumelos, vencedora do Festival Sabores de Cunha na categoria cozinha contemporânea. O ambiente é rústico e a comida, deliciosa.

Depois do almoço, a dica é seguir para a Cachoeira do Pimenta. Além de ser uma das mais bonitas de Cunha, a entrada é gratuita e fica pertinho da Suzana Shiitake, a cinco minutos de carro. A água é gélida, mas há quem se atreva a entrar: só tome cuidado com as pedras escorregadias.


Ateliês de cerâmica
De volta ao centro, aproveitei o restante da tarde para visitar os ateliês de cerâmica que fizeram a fama da cidade. A técnica mais tradicional usada entre os ceramistas de Cunha é a queima em fornos noborigama: construídos em declive e alimentados por lenha, eles alcançam 1.300°C. Os preços das peças são de acordo com o processo longo e trabalhoso, mas vale a pena conhecer os ateliês mesmo sem a intenção de comprar, já que algumas cerâmicas são verdadeiras obras de arte.

Merece destaque o pioneiro Suenaga e Jardineiro, que é também muito bonito por estar cercado de verde e exibir os fornos noborigama. Outras opções estão na Rua Alcides Barbeta, também conhecida como Rua dos Ateliês: veja uma lista dos principais nessa outra matéria. Vale ainda dar uma passada na Casa do Artesão. Bom lugar para comprar lembrancinhas, ele reúne não só cerâmicas como também outros artesanatos feitos em Cunha.

Floresta Galeria e jantar no Il Pumo
Continuando as comprinhas, os melhores achados de Cunha estão na Floresta Galeria, que abriu no início de 2025. A loja tem uma curadoria impecável de peças feitas por artesãos da cidade e de todo o Brasil: há desde bolsas de madeiras da Catarina Mina, que são verdadeiras joias, até os cosméticos 100% naturais da Morar Natural, feitos com ingredientes de Cunha. Além, é claro, de peças de cerâmica belíssimas. Dá vontade de levar tudo!


A Floresta Galeria fica na parte inferior de um casarão histórico restaurado que guarda também o restaurante Il Pumo, comandado por um chef e queijeiro italiano. A especialidade da casa é a burrata, que aparece nas entradas e também em pratos como o spaghetti com creme de rúcula e pistache. Anote aí: meu favorito foi o delicioso gnocchi com creme de mascarpone e linguiça artesanal.

DIA 2 – SEXTA-FEIRA
Pedra da Macela
O despertador tocou às 3h da manhã porque eu tinha um objetivo: ver o sol nascer na Pedra da Macela, ponto mais alto da Serra da Bocaina, a 1.840 metros de altitude. Acompanhada da guia Cris Campos, da agência Ecojoy (mande um alô para ela no Whatsapp para reservar seu passeio), dirigi por cerca de uma hora até a base da montanha, cujo acesso é pelo km 66,5 da Estrada Cunha-Paraty. O trecho final é por estrada de terra em condições medianas: carros altos se dão melhor aqui.
Para chegar até o topo, é preciso percorrer uma trilha de 2,5 km de extensão que alterna entre asfalto e blocos de paralelepípedo. Mas não vá achando que será moleza: o caminho é todo de subida bem íngrime e levou cerca de uma hora. A recompensa é uma vista que, ainda que seja sempre estonteante, varia de acordo com o dia. Às vezes, é possível ver Ilha Grande e o contorno da costa de Angra dos Reis e Paraty. E às vezes, nuvens se formam sobre o mar, bloqueando a vista, mas criando um lindo tapete. Eu peguei o segundo cenário e fiquei encantada.

A volta é pelo mesmo caminho, ou seja, mais uma hora de descida – e achei que essa parte pode ser ainda mais desafiadora por exigir mais dos joelhos. Ainda que o nascer do sol seja o momento mais popular para visitar a Pedra da Macela, quem prefere dormir até mais tarde pode fazer a trilha um pouco mais tarde ou mesmo durante a tarde: a atração está aberta diariamente das 4h às 19h, com última subida às 17h. Conto mais sobre a trilha nessa outra matéria.
Café da manhã no Moara Café ou Almoço no La Taverne
Para quem faz a trilha da Pedra da Macela ao amanhecer, a dica é tomar café da manhã depois no simpático Moara Café, que fica na Estrada Cunha-Paraty. O espaço tem mesas espalhadas por um gramadão, que também expõe vários objetos vintage.

Agora, caso você faça a trilha um pouco mais tarde, vale a pena combinar a trilha com um almoço no La Taverne, que foi meu favorito em Cunha. O restaurante fica justamente na estrada de terra que leva à Pedra da Macela e serve pratos criativos que utilizam ingredientes locais, com destaque para os cogumelos. O menu varia, mas, se puder, experimente o sorrentino de massa de espinafre recheado com polenta de milho verde e queijo meia cura, ao molho de ragú de shiitake e portobelo.

O Lavandário
Uma das atrações mais incensadas de Cunha, O Lavandário faz jus a toda fama que tem ao entregar uma das paisagens mais encantadoras da Serra da Bocaina. A plantação de lavandas já seria bonita por si só, mas o terreno ainda foi privilegiado com uma vista e tanto para as montanhas. E tudo fica ainda mais lindo ao pôr do sol, que é o horário mais disputado por lá: a entrada é permitida até às 16h30, mas os visitantes podem ficar até o astro sumir no horizonte.

Como os pés de lavanda são plantados em três levas por ano, o lugar está sempre florido. Mas eu ainda dei a sorte de fazer a visita quando os ipês-amarelos estavam no auge da floração. Além das lavandas, pés de alecrim e manjericão também perfumam o ar. Há uma loja para comprar produtos à base dessas plantas e uma sorveteria que vende inclusive sorvete de lavanda.

Jantar no Átrio
No centro de Cunha, o Átrio possui um cardápio à la carte com ótimos pratos de culinária latino-americana. Mas, se puder, invista no novo menu degustação de gastronomia venezuelana (mediante reserva pelo WhatsApp). A refeição, dividida em seis etapas, faz um passeio pelos sabores de diferentes regiões da Venezuela, país natal dos irmãos Rosa María e Christian, donos do restaurante. Gostei especialmente da entrada, “Rompe colchón”, com camarão, mexilhão e lula marinados acompanhado de chips de banana da terra, e do “Pastel de Chucho”, que era uma fatia de banana da terra envolvendo pedaços de peixe e queijo defumado. Um jantar memorável!

DIA 3 – SÁBADO
Workshop de cerâmica na Pousada Cheiro da Terra
Não me considero muito habilidosa em trabalhos manuais, mas a necessidade de fazer algo fora das telas há tempos vem despertando meu interesse para hobbies mais artísticos. E eu não estou sozinha nessa, como prova o boom de livros para colorir. A cerâmica também nunca esteve tão em alta, e Cunha tem tradição nessa área muito antes de ser “modinha”. Ao abrir as portas de seu ateliê para os hóspedes da Pousada Cheiro da Terra, Marivaldo tinha dois objetivos em mente: provar que todo mundo é capaz de fazer algum tipo de arte e que incorporar o fazer artístico na rotina pode ter um enorme feito terapêutico. Comigo, funcionou.

Depois de aproveitar o farto café da manhã da pousada e fazer um carinho na Jade, segui para o amplo ateliê e fui apresentada às suas diferentes estações: a mesa para moldar argila, o espaço onde as peças secam e, claro, o enorme forno que alcança os 1.300ºC. De avental e mangas arregaçadas, aprendi como manipular a argila com o objetivo de fazer uma caneca.

Enquanto a obra ganhava vida, fui batendo papo com o Marivaldo e a hora passou voando — e não é que a minha “obra” ficou bonitinha? Só falta eu conferir o resultado final. Após juntar uma certa quantia de peças, Marivaldo as queima todas juntas no forno e manda o resultado final pelo correio, para os hóspedes que quiserem receber a peça finalizada. Mal posso esperar para tomar um café na minha caneca. O workshop deve ser reservado com antecedência direto na recepção ou pelo Whatsapp (12) 9 9602-8185.

Almoço no Kallas da Serra
Um clássico da Estrada Cunha-Paraty (SP-171) é o Kallas da Serra, que fica em uma propriedade que é também plantação de copos-de-leite. De cozinha caipira, a casa tem como carro-chefe o porco na lata acompanhado por torresmo, arroz, feijão, farofa e uma mandioca frita crocante por fora e cremosa por dentro. Quase tão gostoso quanto a refeição foi deitar em uma das redes espalhadas pelo gramado para fazer a digestão e relaxar até dar a hora da minha visita ao Sítio dos Cavalos, que fica a cinco minutos de carro do restaurante.

Sítio dos Cavalos
Cheguei ao Sítio dos Cavalos esperando um passeio a cavalo como qualquer outro e encontrei uma das experiências mais surpreendentes de Cunha. A começar pelo cenário: a propriedade, que pertence à família do Raul há gerações, tem uma vista privilegiada para as ondulações da Serra da Bocaina. Tornam a experiência ainda mais interessante o conhecimento e, principalmente, o amor pelos cavalos que Raul compartilha com os visitantes durante a experiência.

Eu já havia feito passeios a cavalo antes, mas nunca tinham me ensinado o que hoje entendo ser o básico do básico: como criar uma conexão com o animal. No meu caso, com o Cacique, um lindo manga-larga marchador branco. Mistura de aulão sobre cavalos e passeio contemplativo, a cavalgada pelo sítio também é uma oportunidade de saber mais sobre as plantas da região: Raul vai colhendo flores e apontando, orgulhoso, para as diferentes espécies que prosperam em seu jardim. É preciso reservar com antecedência pelo Whatsapp (24) 9 9943-3916.

Il Gelataio e Praça Cônego Siqueira
De volta ao centro de Cunha, vale curtir o fim de tarde tomando um sorvetinho do Il Gelataio. Pedi uma bola de sorvete de doce de leite e saí andando com a minha casquinha rumo à Praça Cônego Siqueira, onde fica a bonita Paróquia Nossa Senhora da Conceição. Ali se vê a típica cena de cidade do interior: pessoas sentadas em banquinhos ou na escada da igreja batendo papo ou simplesmente vendo o tempo passar. Vale dar uma espiada ainda no rústico Mercado Municipal de Cunha, que vende geleia, goiabada, doce de leite e outras delícias.


Jantar no Porco & Pizza
Sábado à noite combina com pizza, e a melhor de Cunha é a do Porco & Pizza. Em tamanho individual, as redondas são feitas com massa de fermentação natural e assadas no forno a lenha — a minha margherita estava impecável! Como o nome sugere, o restaurante também trabalha com pratos à base de carne suína.

DIA 4 – DOMINGO
Canto das Cachoeiras e Sempre Olivas
No último dia, a sugestão é acordar cedo para curtir mais algumas atrações de Cunha e aqui deixo duas sugestões. A primeira, boa para os dias de calor, é seguir rumo ao Canto das Cachoeiras, que fica em uma bifurcação da Estrada Cunha-Paraty. O parque possui três quedas d’água interligadas por uma trilha curta e fácil. Grandes e com poucas pedras, os poços para banho são bastante convidativos, mas a água é gelada. Preferi ficar relaxando em uma das redes espalhadas em torno das cachoeiras. Paga-se R$ 20 para entrar e há estrutura de banheiros.


A segunda sugestão, que também pode ser emendada com o Canto das Cachoeiras se você tiver tempo, é conhecer uma plantação de oliveiras. Mais famoso e com entrada gratuita, O Olival permite passear entre as árvores, que são cultivadas ao som de música clássica. A paisagem é bonita, mas o passeio tende a ser rápido.

Para algo mais aprofundado no mundo dos azeites, vale investir na visita guiada (e paga) do Sempre Olivas, que deve ser agendada pelo Whatsapp (21) 9 9983-3564. Durante o passeio, os visitantes veem os equipamentos utilizados para extração e aprendem sobre a produção nacional de azeite, os diferentes tipos do óleo e seus perfis sensoriais distintos. Ao final, ainda há uma degustação.
Almoço no Quebra Cangalha
A despedida de Cunha pode ser no Quebra Cangalha. Veterano em Cunha, o restaurante que existe desde 1996 serve pratos com ingredientes locais, como cogumelos e truta, e também ótimos cortes de carne. Optei por um clássico picadinho de mignon com batatas fritas e arroz, com um adicional de tutu de feijão. Simples, gostoso e muito bem servido para te abastecer antes de pegar a estrada de volta para casa.

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Fonte.:Viagen