Um estudo da Universidade de Caxias do Sul (UCS) acusou de apropriação cultural o uso de grafismos da etnia Kaingáng pelo movimento tradicionalista gaúcho (MTG). O MTG é conhecido por valorizar costumes gastronômicos, artísticos e de vestimenta típicos do Rio Grande do Sul e de outros estados influenciados por esta cultura.
A pesquisa, publicada no primeiro semestre deste ano, aponta diversos símbolos indígenas como sendo incorporados de forma descontextualizada na cultura gaúcha, conforme noticiou reportagem da agência alemã Deutsche Welle.
Os historiadores Francisco Ailton Santos e Juliane Petry Panozzo Cescon, autores do estudo, destacam que o tradicionalismo “há anos faz uso dos grafismos indígenas do Rio Grande do Sul, caracterizando não só o abafamento dessa cultura como a apropriação de seus manifestos”.
Expressões culturais
A advogada Fernanda Jófej Kaingáng, diretora do Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual, lembra que os grafismos são Expressões Culturais Tradicionais (ECTs) e, portanto, têm proteção legal. Ela aponta violações em adornos e vestimentas do tradicionalismo gaúcho, que utilizariam grafismos Kaingáng sem reconhecer sua origem.
“Essa apropriação é uma ofensa aos direitos autorais e à identidade do nosso povo”, afirma Fernanda. Segundo ela, o fenômeno reflete uma herança colonial que ainda nega os direitos indígenas.
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Disputa por reconhecimento
Órgãos como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (IPHAN) e a Unesco reconhecem o patrimônio cultural Kaingáng como parte da cultura brasileira.
Mas Fernanda discorda:
“É uma imposição de um marco temporal europeu e colonizador. Esse patrimônio precisa ser reconhecido como coletivo do nosso povo”.
O professor Joceli Kaingáng também critica o tradicionalismo: “A identidade gaúcha é construída em cima de outras culturas. Os CTGs se formaram apenas a partir da década de 1980 e se apropriaram de elementos de várias etnias”.
Reação do Movimento Tradicionalista Gaúcho
Em 2022, o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) proibiu o uso de figuras geométricas contínuas na pilcha, indumentária tradicional do Rio Grande do Sul. A diretora de cultura do MTG, Carla Thoen, justificou a decisão afirmando que a medida busca “preservar a identidade cultural gaúcha”, ainda que reconheça influências da tecelagem andina.
Mesmo com a restrição, o estudo da UCS identificou mais de 30 itens com grafismos indígenas à venda em uma loja de pilchas em Caxias do Sul.
Fonte. Gazeta do Povo