
A comissão que analisa o projeto de lei do novo Código Civil, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), reuniu-se nesta quinta-feira (6) com especialistas para discutir as regras relativas ao direito das obrigações e aos contratos. Com raros apontamentos críticos, a audiência pública foi marcada pela defesa quase unânime do texto.
Sem a presença de Pacheco, o senador Efraim Filho (União-PB) conduziu a sessão. O ex-presidente do Senado participará nesta sexta-feira (7) do 1º Fórum de Buenos Aires, nova edição do “Gilmarpalooza”, evento promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), fundado pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo afirmaram que o PL 4/2025 pode aumentar a insegurança jurídica na celebração de contratos no país tanto para empresas, quanto entre pessoas físicas e jurídicas, e na prestação de serviços.
VEJA TAMBÉM:
Durante a audiência, a professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Cláudia Lima Marques, uma das autoras do projeto, defendeu o aprofundamento da discussão sobre a função social dos contratos e sobre a “cláusula de boa-fé”, especialmente diante das transformações do mundo digital.
Ela destacou que a comissão manteve a distinção entre contratos civis — como doações entre pais e filhos — e contratos empresariais, previstos na Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019).
“Os contratos não são mais feitos olho no olho, cara a cara, com o aperto de mão e a confiança que existiam no século passado. Hoje, a tecnologia não é neutra: ela foi desenhada por alguém e, conforme a capacidade econômica, há uma espécie de domínio desse ambiente. Por isso, é necessária uma atualização quanto ao uso dessa intermediação tecnológica”, afirmou.
Regras para transmissão de heranças no Código Civil de Pacheco
Único participante da audiência desta quinta, que não integrou a comissão de juristas responsável pela proposta, o professor de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Eroulths Cortiano Júnior, pediu a aprovação de quatro dispositivos do projeto, destacando “a repercussão que eles terão na vida prática das pessoas”.
O primeiro trata da consignação extrajudicial, regra que permite ao devedor quitar uma dívida sem precisar recorrer à Justiça. O texto estabelece que a consignação poderá ser feita por intermédio de cartório. Eroulths destacou que essa possibilidade será “um excelente instrumento de gerenciamento de negócios”, já que a consignação por meio de agências bancárias “não deu certo”.
O segundo ponto de atenção refere-se ao artigo 426 do Código Civil, que proíbe que a herança de pessoa viva seja objeto de contrato, conhecido como “pacta corvina”. O professor afirmou que essa regra sempre foi “um limitador” da gestão de heranças e defendeu “mais autonomia” tanto do titular quanto dos herdeiros para definir o destino do patrimônio.
“[O projeto] não libera totalmente, não dá total liberdade ao testador, mas começa a cuidar da possibilidade de os herdeiros, entre si, ajustarem questões como colação ou excesso. De outra banda, permite ajustes entre cônjuges. Liberar totalmente talvez seja um pouco perigoso, pois poderia servir para exclusões de gênero”, explicou.
O artigo 426, do projeto de Pacheco, estabelece que não são considerados contratos tendo por objeto herança de pessoa viva, os negócios: “firmados, em conjunto, entre herdeiros necessários, descendentes, que disponham diretivas sobre colação de bens, excesso inoficioso, partilhas de participações societárias, mesmo estando ainda vivo o ascendente comum; que permitam aos nubentes ou conviventes, por pacto antenupcial ou convivencial, renunciar à condição de herdeiro”.
No terceiro ponto, o professor afirmou que a proposta recupera o fideicomisso, prevista no artigo 426-A. No direito sucessório, o fideicomisso “permite ao autor da herança transmitir seu patrimônio por um determinado tempo a uma pessoa, que posteriormente encaminhará a outra”.
“O fideicomisso nunca fez sucesso no Brasil e era reservado a cessão causa mortis. O projeto de lei melhora e dinamiza o fideicomisso, pois é um instrumento excelente”, ressaltou. Por fim, o professor destacou o quarto dispositivo: a revisão contratual judicial mínima e excepcional. “Ao mesmo tempo que permite a revisão, [o texto] impõe grandes limites ao juiz — ele não tem total liberdade para interferir”, afirmou.
Fonte. Gazeta do Povo


