
Nesta semana, autoridades de Saúde da cidade de Jundiaí, no interior de São Paulo, confirmaram o diagnóstico de raiva em um gato resgatado das ruas. Este é o primeiro registro da doença em um animal doméstico na cidade desde 1983, segundo a prefeitura.
O felino, que vivia em situação de abandono, foi resgatado e, então, levado a uma clínica veterinária, que identificou os sintomas suspeitos e notificou a Vigilância em Saúde Ambiental do município. Por lá, o diagnóstico foi confirmado: o bichano havia sido infectado e, provavelmente, por uma variante silvestre do vírus, transmitida por morcegos.
Quadros como esse chamam a atenção porque a raiva em cães e gatos é considerada rara no Brasil. Desde 2019, não há registro de infecções pelas variantes do vírus que tipicamente circulam entre animais domésticos (os tipos AgV1 e AgV2).
Mas outras variantes ainda estão presentes na natureza, principalmente entre os morcegos, e podem eventualmente chegar aos pets (e, a partir deles, aos humanos). Por isso, é muito importante manter as ações de prevenção e vigilância, principalmente para os felinos.
Gatos: independentes, mas vulneráveis
Entre 2015 e 2024, o Brasil registrou 241 casos de raiva em cães e gatos. Desses, 77,2% em cães domésticos.
Os cachorros, portanto, são os principais reservatórios urbanos do vírus, mas os gatos domésticos também merecem atenção. Segundo o Ministério da Saúde, eles são considerados de alto risco para a transmissão da raiva de linhagem silvestre. Isso por conta de seu instinto de caça.
“Os gatos têm um fator agravante em relação aos cães. Eles caçam morcegos infectados e, assim, podem contrair a doença”, afirma Karin Botteon, médica-veterinária e gerente técnica de pets da Boehringer Ingelheim. Ela acrescenta que campanhas de vacinação nem sempre oferecem um ambiente tranquilo para os felinos, o que afasta alguns tutores e contribui para taxas mais baixas de imunização entre os felinos.
Apesar da fama de autossuficientes, os bichanos precisam de cuidados. O ideal é mantê-los em ambientes protegidos, com janelas e varandas teladas, e realizar check-ups veterinários regulares. E mesmo os gatos que vivem exclusivamente dentro de casa devem ser vacinados, já que, inclusive, morcegos e outros bichos silvestres podem entrar em residências por frestas, telhados ou varandas.
Proteção que salva vidas
A raiva é uma doença grave, causada por um vírus da família Rhabdoviridae, capaz de afetar todos os mamíferos, inclusive o ser humano. Ela provoca inflamação no cérebro e tem taxa de mortalidade próxima de 100%.
No Brasil, a variante mais prevalente atualmente é a dos morcegos hematófagos (AgV3). Esses animais vivem em áreas rurais e florestadas, mas a expansão das cidades tem aproximado a fauna silvestre das zonas urbanas. Com isso, também sobe o risco de contato entre eles e os animais de casa.
Em Jundiaí, somente em 2025, cinco morcegos testaram positivo para a raiva. Em 2024, foram 10 registros. Em 2023, foram 17 casos.
Mas isso não torna os animais os vilões dessa história. “Estando próximos [da área urbana], os morcegos são vítimas também, assim como todos os outros animais e os seres humanos”, defende Karin.
Para evitar problemas, a médica lembra que a vacinação é a forma mais eficaz de prevenção. “Se o cachorro ou o gato é vacinado e entra em contato com um animal contaminado, a chance de desenvolver a doença é quase zero”, ensina.
Segundo o Ministério da Saúde, por exemplo, a implantação do programa nacional de vacinação antirrábica para cães e gatos foi responsável por uma redução drástica de ocorrências. Para ter ideia, o País, que criou a política no fim dos anos 80, reduziu os casos de raiva animal de 1.200, no ano de 1999, para apenas oito em 2024, de acordo com a pasta.
Por isso o esquema vacinal é tão importante para os bichinhos. Cães e gatos devem receber a primeira dose da vacina aos três meses de idade, com reforço anual (sem falta). “Não devemos deixar de checar se a carteirinha de vacinação está em dia. É a melhor maneira de proteger nossos bichos e, consequentemente, quem vive com eles”, reforça a médica veterinária do Boehringer Ingelheim.
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O que fazer ao encontar um morcego
Ver um morcego caído no chão ou voando dentro de casa nunca é um bom sinal. Em casos assim, é importante impedir que o animal de estimação se aproxime e acionar imediatamente a vigilância sanitária.
“Os morcegos são muito inteligentes. Se um gato conseguiu capturar um deles, é porque esse animal já não estava bem; e a chance de contágio aumenta muito”, alerta Karin.
Além disso, no caso de encontrar mamífero silvestre doente, caído, morto ou com comportamento anormal, o humano também não deve tocar, recolher e nem tentar matar o animal. O ideal é se afastar e chamar as autoridades sanitárias.
Em casos de mordedura, arranhadura ou contato com saliva de qualquer animal suspeito, a recomendação é lavar imediatamente o local do ferimento com água corrente e sabão por, no mínimo, 15 minutos, e procurar o serviço de saúde mais próximo para avaliação.
+Leia também: O que fazer em caso de mordida de cachorro? Saiba os primeiros socorros
Quarentena e vacinas
Karin também dá dicas de prevenção para os tutores.
Em primeiro lugar, animais adotados das ruas devem ser avaliados por um veterinário antes de qualquer contato mais próximo. É recomendável, ainda, mantê-lo em um período de observação entre duas e quatro semanas, já que raiva pode levar dias ou até meses para manifestar sintomas.
Isso é importante porque nem mesmo exames de sangue podem detectar facilmente o vírus da doença. O diagnóstico definitivo só pode ser feito após a morte, por meio da análise do tecido cerebral. Assim sendo, o melhor sinal de que está tudo bem mesmo é o tempo (por mais que seja difícil de resistir ao impulso de abraçar o bichinho recém-chegado).
Além da vacinação dos pets, vale lembrar que também há imunizações contra a raiva para humanos. No entanto, elas são recomendadas somente para pessoas que lidam com risco constante, como veterinários e profissionais do campo (o que é chamado de profilaxia pré-exposição).
Para o restante da população, em geral, é indicada a profilaxia pós-exposição, que inclui vacina e, em alguns casos, o soro antirrábico, indicados para quem foi mordido ou arranhado por um animal suspeito. É por isso que, em caso de contato, é tão importante procurar ajuda médica, que pode fornecer as orientações necessárias para cada tipo de possível exposição ao vírus.
No fim das contas, a mensagem que fica é a de que as vacinas salvam vidas (tanto dos bichinhos, como a dos humanos). E cuidar dos gatos, em especial, é uma forma de proteger não só os felinos, mas toda a família.
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Fonte.:Saúde Abril


