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9 de novembro de 2025

Ativistas banalizaram o termo “especialista em segurança pública”

Ativistas banalizaram o termo “especialista em segurança pública”

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A megaoperação policial realizada no último dia 28, nos complexos do Alemão e da Penha, reacendeu de forma sem precedentes o debate sobre a banalização do emprego do termo “especialista em segurança pública” na imprensa.

Ativistas de direitos humanos e acadêmicos – sobretudo sociólogos, antropólogos e cientistas políticos – lançaram mão do título de especialistas para comentar, em grandes veículos de imprensa, questões operacionais sobre os desdobramentos da operação no Rio de Janeiro.

Mas desta vez, a desconexão entre a teoria e a prática ganhou traços de humor, sobretudo graças a uma declaração da cientista política e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), Jacqueline Muniz. Ao comentar o uso de fuzis por criminosos, Jacqueline afirmou que o armamento pesado “tem baixo rendimento criminal” e que, em situações de confronto, “um criminoso portando um fuzil pode ser facilmente neutralizado até por uma pedra na cabeça”.

“O criminoso tá com o fuzil na mão, ele é facilmente rendido por uma pistola, até por uma pedra na cabeça. Enquanto ele tá tentando levantar o fuzil e colocar o fuzil pra atirar, alguém joga uma pedra e já derrubou o sujeito”, declarou a professora que, em entrevistas ao vivo nos dias seguintes à operação fez questão de exibir seu currículo e declarar-se especialista em segurança pública.

As falas da docente rapidamente geraram uma série de críticas e, principalmente, memes (publicações em tom humorístico que se espalham rapidamente) nas redes sociais. A repercussão negativa foi tamanha que a própria UFF precisou divulgar uma nota em apoio à docente, em que manifesta “irrestrito apoio institucional” e “solidariedade”.

Mas Jacqueline não foi a única a ganhar protagonismo por expor preferências ideológicas travestidas de conhecimento técnico em segurança pública. O professor de Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Gabriel Feltrin, chegou a resumir a operação, considerada pelas forças de segurança como o maior baque a uma facção criminosa do estado até então, a um “projeto totalitário de extrema-direita”.

Falas como essas, entretanto, contrastaram com o resultado da operação: 113 membros do Comando Vermelho presos, 118 armas de fogo e artefatos explosivos apreendidos (incluindo 91 fuzis de alto calibre), mais de uma tonelada de entorpecentes apreendida. Além disso, foram neutralizados mais de uma centena de traficantes que, com roupas camufladas e armamento pesado, resistiram à ação policial na zona de mata em que houve os confrontos.

A opinião pública também se mostrou amplamente favorável à ação policial: uma série de pesquisas de opinião feitas nos dias seguintes mostraram grande apoio da população do Rio de Janeiro a operações da polícia contra o crime organizado. Uma delas, do instituto AtlasIntel, mostrou que 87,6% dos moradores de favelas do Rio e 80,9% dos moradores de favelas de outras regiões do país aprovaram a Operação Contenção.

Mesmo assim, grandes emissoras de TV e jornais tradicionais mantiveram tom predominantemente contrário à ação, permeando as reportagens com análises de acadêmicos teóricos sem vivência operacional rotulados “especialistas em segurança pública”.

Entre os vários comentários críticos, sobretudo às declarações de Jacqueline Muniz, ganhou força nas redes o vídeo da policial militar Munique Busson, uma das mulheres que participou da Operação Contenção. “Tem certas profissões em que você precisa estudar e fazer o estágio prático. Na próxima operação, Jacqueline, vem fazer o estágio com a gente na operação para você realmente ser especialista em segurança pública”, questionou a policial. O vídeo soma mais de 3 milhões de reproduções nas redes sociais.

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Declarações frequentemente beiram manipulação, diz professor

Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, declarações excêntricas sobre o combate ao crime, como as mencionadas no início desta reportagem, escancaram o abismo entre o discurso teórico e ideológico e a prática do enfrentamento ao crime organizado.

Na avaliação de Eduardo Bettini, policial federal e professor de Gestão em Segurança Pública na Fundação Getúlio Vargas (FGV) e de Ciências Policiais na Escola da Magistratura Federal (Esmafe), a conduta de acadêmicos que, sempre que possível, incitam a opinião pública contra a polícia, evidencia desonestidade intelectual e manipulação de dados.

Para Bettini, a falta de conhecimento da realidade dos moradores de comunidades dominadas pelo tráfico ligada à tentativa de atender a projetos ideológicos coloca em risco a segurança dos moradores dessas regiões, expostos a todo tipo de abuso e barbáries.

“Quando você se debruça sobre a vida dessas pessoas, se preocupa realmente com elas e passa a ouvi-las, vai perceber que a opinião dos especialistas é baseada muito mais em ideias preconceituosas que eles mesmos têm por conta de ideologias que seguem. E acabam relacionando essas opiniões a um conceito de segurança pública que definitivamente não existe”, aponta Bettini, que é doutor e pesquisador pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia.

Segurança Pública Rio de JaneiroPoliciais militares participam do funeral do sargento Heber Carvalho da Fonseca, morto em confronto com traficantes (Foto: EFE/ André Coelho)

Teses desconectadas da realidade levadas à grande imprensa beneficiam facções

Um dos pontos frequentemente levantados por sociólogos e antropólogos que militam contra políticas combativas ao crime organizado é a crítica ao emprego de armamento letal – o que ficou evidenciado pelo discurso do uso de “pedras” contra traficantes portando armas de guerra.

A medida, como explicam os especialistas consultados pela reportagem, consiste em uma “negação da realidade”, que atende aos interesses de facções e expõe a riscos significativos não apenas os agentes da segurança, mas o êxito de operações complexas.

“As facções criminosas dominam territórios com uso de armas de guerra, e para enfrentar esse tipo de força bélica os policiais precisam estar armados à altura”, explica Luiz Fernando Ramos Aguiar, tenente-coronel da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF).

“A situação no Rio de Janeiro é ainda pior. Já ultrapassamos a barreira de operações de segurança pública. O que os policiais estão enfrentando é uma situação de guerra irregular – ou o que a ONU chama de ‘conflito armado não internacional’, que é um confronto violento e prolongado dentro do território do Estado, envolvendo forças governamentais e grupos armados organizados. Na verdade, o que os policiais no Rio de Janeiro estão fazendo não é mais trabalho de polícia, é guerra urbana, e não se vence uma guerra sem superioridade bélica”, pontua.

Acusações de “falta de inteligência policial” são irreais, apontam especialistas

Uma das falsas narrativas usadas por acadêmicos e ativistas autodenominados “especialistas em segurança pública” é a de que todos os confrontos armados poderiam ser evitados com o emprego de “inteligência” e “investigação”.

Apesar disso, a Operação Contenção foi resultado de dez meses de investigação e 75 dias de planejamento tático, segundo o governo do Rio de Janeiro, com intenso uso de dados e informações, como identificação, perfil e localização dos alvos; mapa de comando da facção; levantamento de armamento e capacidades; geointeligência e topografia; interceptações de comunicações, além de informantes dentro das comunidades.

Mesmo assim, o que policiais civis e militares encontraram na Serra da Misericórdia – zona de mata entre os Complexo do Alemão e o Complexo da Penha onde aconteceram os confrontos armados contra traficantes do Comando Vermelho – foram centenas de criminosos trajados com roupas camufladas e portando fuzis de alto calibre. Granadas, inclusive lançadas por drones, também foram usadas contra os agentes. O resultado foi quatro policiais mortos e vários outros feridos, alguns gravemente.

Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a repetição exaustiva de que “faltou inteligência” equivale à desonestidade intelectual. “A inteligência é um fluxo de informações que cria um conhecimento acionável. Ou seja, produz-se um conhecimento de inteligência para que, posteriormente, os policiais coloquem o pé no terreno para executar o que foi planejado”, explica Bettini.

“A inteligência demanda uma ação efetiva, que envolve movimentação de tropas. Caso contrário, ela se torna uma espécie de entidade incapaz de resolver problemas do mundo real”, prossegue o pesquisador.

Já o tenente-coronel da PMDF aponta para um “total desconhecimento prático”, por parte de ativistas, sobre como funciona o uso dos dados e informações em ações de inteligência.

“Esses dados são levantados para que as ações operacionais possam ser direcionadas para alvos estratégicos, como criminosos procurados, locais de armazenamento de drogas, arsenais, barricadas ou a extensão da força bélica de uma organização criminosa em determinada área. Mas para executar uma prisão, derrubar uma casamata ou tomar um depósito de drogas é fundamental o uso da força”, explica Aguiar.

“É preciso que policiais armados cheguem aos locais determinados e confrontem os criminosos que, se reagirem com violência às abordagens, criarão circunstâncias que obrigarão os policiais a responderem à altura. Tudo isso deveria ser óbvio, mas no Brasil parece que existe uma ignorância dolosa para favorecer narrativas ideológicas”, afirma.

Quem milita contra operações que miram o tráfico favorece as facções, diz ex-BOPE

Na avaliação do coronel Mário Sérgio Duarte, ex-comandante do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) do Rio de Janeiro, o modo de operação de ativistas que analisam a segurança pública sob um viés ideológico e não pragmático, favorece diretamente o crime organizado

“É imperativo que reconheçamos: o criminoso agradece analistas como a professora Jacqueline por sua proposta. Ele vive do terror, da busca pela erosão da autoridade do Estado e do desprezo pela força pública. Quando alguém com título acadêmico desqualifica ações de soberania, ele sorri. Cada dúvida lançada sobre a legitimidade do Estado é um centímetro de solo ganho pelo crime”, declara.

“Soberania não nasce de metáforas. Paz social não brota de seminários. Fuzil não recua diante de teoria. Quem tenta desautorizar quem atua no terreno não produz cidadania, produz luto. No fim, a escolha é simples: ou se defende quem protege a sociedade, ou se serve, ainda que sem intenção, a quem a destrói”, prossegue o coronel.





Fonte. Gazeta do Povo

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