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19 de novembro de 2025

“Antivacina é quem deixa faltar vacinas”, diz médico perseguido

“Antivacina é quem deixa faltar vacinas”, diz médico perseguido

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Alvo recente de postagens nas redes sociais do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e de uma série de reportagens do jornal O Estado de S. Paulo em que é taxado de “antivacina”, o infectologista Francisco Cardoso afirma que está sendo vítima de uma operação política para intimidar médicos que questionam a narrativa oficial sobre vacinas contra Covid.

Padilha afirmou pelas redes, mencionando o advogado-geral da União, Jorge Messias: “Acionaremos todas as medidas cabíveis pra impedir que essas pessoas continuem colocando em risco a vida da nossa população e ainda ganhando dinheiro com isso!”

No domingo (15), Cardoso foi citado pelo Estadão como um dos profissionais – junto com os médicos Roberto Zeballos e Paulo Porto de Melo – que estariam faturando nas redes com cursos sobre a chamada “síndrome pós-spike”, uma hipótese clínica que tenta explicar sintomas persistentes após Covid ou vacinação mRNA, atribuindo-os à ação prolongada da proteína spike. A condição ainda está sendo investigada e não é reconhecida pelo Ministério da Saúde.

Na segunda-feira (16), o Estadão publicou nova reportagem contra Cardoso, afirmando que o médico tirou do ar seu curso após as matérias do jornal. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele diz que seu curso online era justamente voltado a combater a hesitação vacinal em geral, que tira do ar periodicamente conteúdos do tipo para atualizá-los com novos dados, que não é “antivacina” e que nem sequer usa a expressão “síndrome pós-spike”.

Hoje, a existência de efeitos adversos associados às vacinas contra a Covid-19 é um ponto de consenso na comunidade científica; o que segue em debate é a extensão e a frequência desses eventos. Para Cardoso, informar os pais sobre a possibilidade de efeitos adversos de vacinas faz parte da responsabilidade de um infectologista.

“O verdadeiro antivacina não é quem contesta uma ou outra vacina. O verdadeiro antivacina é quem deixa faltar vacinas no posto”, afirma o médico, em crítica direcionada a Padilha. “Vacinas básicas estão em falta.”

Um problema grave no Brasil, segundo ele, é a falta de acompanhamento a pacientes com sintomas possivelmente relacionados ao pós-Covid. A censura a médicos que apontam isso é, para Cardoso, um dos motivos da negligência do governo. Ele vê “perseguição, censura e criminalização da atividade médica”.

“Os pacientes estão abandonados. Os estudos mostram que podem ser milhões de pacientes abandonados. Nos Estados Unidos, a estimativa é de 57 milhões de pacientes com pós-Covid. No Brasil, a população é a metade da americana. Se for na mesma proporção, um décimo da população estaria com pós-Covid. Isso é muita coisa. Esses pacientes estão largados por aí. A ausência de ambulatórios no SUS que tratem e conduzam casos de pós-Covid é um crime”, critica Cardoso.

Um estudo sobre casos de pós-Covid publicado em junho por ele em coautoria com Zeballos, Porto de Melo e outros especialistas na revista acadêmica IDCases foi recentemente retirado do ar pela editora da publicação. Cardoso diz que a remoção teve motivação política.

Confira as declarações de Cardoso.

Abordagem do jornal e retratação do artigo na IDCases

Fui abordado exclusivamente sobre um artigo que nós publicamos num periódico internacional, que era um relato de casos de pacientes com pós-Covid, alguns deles cuja suspeita poderia ser inclusive da proteína spike oriunda da vacina.

Já que a proteína spike não tem etiqueta – o corpo não sabe se é a proteína spike do vírus ou da vacina, não tem como fazer essa distinção –, a gente publicou esses relatos de casos, que são a evidência mais fraca que existe na medicina. Você faz um relato de caso, aí você faz um estudo observacional e depois você faz um estudo clínico controlado. É assim que funciona. E a revista é de relato de caso, a Infectious Disease Case Reports [IDCases]. Ela é para isso.

Nós publicamos. Desagradou muita gente e eles conseguiram, politicamente – como foi muito comum na pandemia –, retratar o artigo. A revista despublicou o artigo alegando questões éticas que não tinham o menor cabimento. As questões que a revista apontou para remover o artigo eram questões práticas de um ensaio clínico randomizado, jamais para um relato de caso.

Isso a gente está resolvendo com a revista. Sob o pretexto de comentar essa atitude da IDCases, o Estadão Verifica [agência de checagens do jornal O Estado de S. Paulo] pediu a nossa opinião, e eu respondi de maneira bem educada, explicando exatamente isso: que a retratação foi política, que é um absurdo, que é um relato de caso. Relato de caso não tem nenhum tipo de causalidade ou associação, não serve para definir protocolo, nada.

Eu expliquei para o Estadão, inclusive, que a gente estava questionando extrajudicialmente a revista. Aí eu sou surpreendido com a matéria de capa do Estado de S. Paulo, que vai muito além da história do artigo científico, acusando eu, o Zeballos e o doutor Paulo Porto de vender cursos antivacina. E, para nos definir como antivacina, bastou publicar relatos anedóticos e pinçados e descontextualizados de falas do Paulo Porto ou do Zeballos, onde eles questionam alguma coisa sobre vacina.

O curso sobre vacinas e a acusação de conteúdo antivacina

Eles pegaram um curso que eu tinha vendido – não estou mais vendendo neste momento – que se chamava Jornada da Segurança da Imunização, que eu criei justamente para incentivar as pessoas a tomarem vacinas, porque eu estava recebendo perguntas diariamente.

Esse curso começou em 2022. Ele está há três anos sendo vendido esporadicamente. Ele não é de venda aberta o tempo todo, porque eu tenho que atualizar. E nesse curso eu defendo as vacinas, eu falo contra esses boatos de grafeno, de alumínio, de que causa autismo, eu falo que isso não existe. Defendo um calendário vacinal mais amplo que o do PNI.

A única coisa a que eu faço críticas técnicas – e isso eu faço mesmo, sempre fiz – é à vacina da Covid. E eu falo que as pessoas têm o direito de questioná-la. Por exemplo, eu falo de estudos da vacina da gripe, que mostram que ela não é uma vacina muito potente, mas que também não tem nenhum estudo mostrando que faz muito mal. Ou seja, comentários que deveriam ser comuns.

Aí eles pegaram o fato de que eu faço esse curso para também dizer que eu estaria ganhando dinheiro vendendo protocolo para tratamento de “síndrome pós-spike”. Isso não tem nada a ver com o que o Estadão Verifica veio me perguntar. Na verdade, eles foram sórdidos, porque se utilizaram de uma coisa do Estadão Verifica para fazer uma matéria muito maior.

Se eles tivessem me perguntado se eu era antivacina, ou se eu vendia curso com conteúdo antivacina, eu teria falado que não. Mas eles não me deram a chance de falar isso. Foi uma armadilha. Isso tira a credibilidade da imprensa.

Medo de sanções

Eu não temo nada, porque o que eu sempre fiz foi o correto. Se quiserem que eu responda, ou quiserem abrir sindicâncias, eu vou lá e respondo tranquilamente. Da mesma maneira que eu acho que o ministro tem que responder também pela falta de vacina no Brasil.

É pública e notória a falta de vacina nas prefeituras, nos postos de saúde. Vacinas básicas. Não estou falando de vacina de Covid. Estou falando de sarampo, tétano, pólio, varicela. Vacinas básicas estão em falta.

Na minha opinião, o verdadeiro antivacina não é quem contesta uma ou outra vacina. O verdadeiro antivacina é quem deixa faltar vacinas no posto.

Os pacientes precisam de mim, porque estão abandonados. Os estudos mostram que podem ser milhões de pacientes abandonados. Nos Estados Unidos, a estimativa é de 57 milhões de pacientes com pós-Covid. No Brasil, a população é a metade da americana. Se for na mesma proporção, um décimo da população estaria com pós-Covid. Isso é muita coisa. Esses pacientes estão largados por aí. A ausência de ambulatórios no SUS que tratem e conduzam casos de pós-Covid é um crime.

Eu não temo nada, a não ser que a gente viva numa ditadura. Se a gente está numa ditadura, aí sim pode temer sofrer algum tipo de violência institucional não prevista na Constituição. Infelizmente, do jeito que a coisa está no Brasil, a gente também pensa nisso. Mas eu ainda acredito o país é forte e vai resistir a ondas autoritárias.

Acusação de faturar com cursos antivacina

O meu curso é para combater a hesitação vacinal, é para estimular as pessoas a tomarem vacina. E ele sempre foi vendido a mais ou menos o preço de custo, porque tenho que bancar equipe e tenho outros gastos. Eu nunca tive lucros com esse curso.

Fiz esse curso porque eu era censurado diariamente na rede social toda vez que eu tentava falar sobre vacina, mesmo quando meu discurso era favorável à vacina. Eu tive post meu derrubado onde eu falava que grafeno não estava presente em vacinas, e o post foi derrubado. Por causa disso, eu optei por fazer um curso numa plataforma paralela, que tem um custo mínimo, e basicamente o custo do curso era para custear isso. Não pode nem falar em lucro, no meu caso. E ganhar dinheiro licitamente não é problema para ninguém.

Agora, uma coisa que eu poderia perguntar para o Padilha é: quem lucrou com as milhões de doses de vacina de Covid que ele jogou fora recentemente? Alguém lucrou. E aí? Quem foi responsável por isso?

É óbvio que eles vão levar isso para tentar criminalizar, para intimidar, porque é assim que a censura faz: cria um factoide e, a partir daí, usa o factoide para justificar ações criminais ilegais. Se o objetivo era me intimidar, não deu certo. Vai me dar trabalho? Vai. Mas eles também vão ter trabalho.

Acusação de que os médicos vendiam um “protocolo” pós-Covid

Não existe protocolo. Esse termo “protocolo” é usado sempre para desmerecer as pessoas que estão combatendo a Covid e seus efeitos. Desde a pandemia, com a história do “tratamento precoce”, eu fazia até uma piada: todo tratamento tem que ser precoce. Eu não vou esperar um câncer de mama virar do tamanho de um abacate para abordar o câncer. Quanto mais cedo eu tratar, melhor.

O que eles pregavam na pandemia era justamente isso: deixar a pessoa ir para o tubo para só no tubo tratar, por causa do “fique em casa”, que matou muita gente. Então, não existe protocolo.

Existe uma síndrome de pós-Covid, que tem vários nomes. Eu sou o que mais bate nessa tecla no Brasil atualmente. O pessoal chamava de Covid longa, “long covid”. Pós-spike é o que muitos artigos internacionais usam. Então, não existe essa diferença da proteína spike do vírus e da proteína spike da vacina. A gente sabe que tem diferenças estruturais, mas que só conseguem ser vistas em estudos de microscopia eletrônica e de segmentos de genômica muito precisos.

Síndrome pós-spike é um dos nomes que a literatura científica internacional dá para o que eu, Francisco, chamo de síndrome pós-Covid. Alguns também chamam de Covid longa. Outros chamam de Covid crônica. Tem vários nomes.

Na prática, a gente sabe que há uma proteína, espícula em português, presente no vírus, e há milhares de estudos mostrando que ela causa uma série de alterações. E a spike não tem etiqueta. O corpo não sabe se aquela spike é do vírus ou se é da vacina. “Ah, você é do vírus? Então você vai me deixar doente. Ah, você é spike da vacina? Então você não vai…” Isso não existe.

Em nenhum momento a gente afirma nada como verdade derradeira. O que a gente está falando é que tem vários estudos mostrando isso, alguns estudos inclusive de alto impacto. Tem artigos de revistas de ponta – New England Journal of Medicine, JAMA, Science – que já definem o que seria pós-Covid. E a gente não tem como, cientificamente, afirmar o que o Ministério da Saúde está falando, que a proteína spike da vacina não causa nenhum efeito adverso.

Da mesma maneira que eu também não consigo ainda fazer uma associação irrefutável dessa relação. Mas existe muita coisa aí. A gente está há cinco anos estudando isso. Eu comecei a falar de pós-Covid, se forem pesquisar no meu Instagram, em fevereiro de 2020.

Autonomia do paciente e “curso antivacina”

O que eu tenho certeza, da minha experiência clínica, é que os pacientes que tomaram a vacina e, pouco tempo depois, pegaram o vírus – isso aconteceu muito – foram os que mais desenvolveram risco de pós-Covid. Mas o que está se debatendo é um factoide. Não existe curso antivacina. Não existe ninguém ganhando dinheiro com curso antivacina. Ninguém é louco de estimular a população a não ser vacinada.

A gente sabe que precisa, até para a população ganhar de novo a confiança nas vacinas e nas autoridades – confiança que elas perderam durante a pandemia –, que as pessoas participem um pouco do processo de tomada de decisão. Então, em vez de falar “estica o braço aí e toma a vacina porque é bom”, as pessoas passam a entender por que a vacina do sarampo é boa, por que a vacina da pólio é essencial, por que tem que tomar a vacina de meningococo. Isso é bom para as pessoas.

Sobre vacina e sobre qualquer decisão em saúde que elas queiram tomar. Eu acho engraçado que essa mesma galera do “viva o SUS” fala o tempo todo da questão bioética, da autonomia, que o paciente tem que ter o direito de optar pelo tratamento… Essas pessoas defendem inclusive que o paciente possa optar pelo não tratamento, defendem eutanásia, defendem que o paciente possa, por convicções morais e religiosas, abrir mão de certos tratamentos. Mas, na hora da vacina da Covid, não. Aí você não tem direito nenhum, meu amigo. Se você não tomar vacina, você é criminoso.

É um comportamento ambíguo, perigoso, e que tira o crédito do Programa Nacional de Vacinas junto à população. E só mesmo no Brasil para um médico que está trabalhando há três anos para incentivar as pessoas a tomarem as vacinas em dia ser acusado de conteúdo antivacina.

Perseguição a médicos de direita

Esse caso é perseguição clara e descarada a médicos que optam por se manifestar num perfil político mais conservador, de direita. Perseguição pública escancarada, usando a máquina estatal para esse fim, contra médicos que ousam fazer alguma narrativa contra a narrativa oficial. Perseguição, censura e criminalização da atividade médica.

Esse é o passo para a gente ter o colapso da saúde no Brasil. O efeito prático disso eles já conseguiram. Muita gente se intimidou com essa postagem, com essa atitude agressiva do ministro.

Pena que o ministro não tenha a mesma atitude agressiva com seus subordinados que deixam faltar vacina nos municípios brasileiros. Se me falassem que o Padilha foi agressivo comigo, mas que ele também foi muito agressivo com os diretores do departamento de vacina, que estava faltando vacina no Brasil, que teve epidemia de sarampo no Tocantins e coisas assim, até vá. Mas a gente sabe que não é esse o comportamento do ministro.

A esquerda sempre trabalha com duplo padrão. Sempre trabalhou com duplo padrão. Eles não estão nem aí para a coerência. O objetivo é atingir o alvo. O alvo, no caso, é combater os médicos de direita.

O Ministério da Saúde, recentemente, deu 30 milhões de reais para PICS, que é o sistema de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, que inclui ayurveda, biodança, cromoterapia, hipnoterapia, meditação, reflexoterapia, reiki e outras coisas. Não tem comprovação científica de nada. Mas o Ministério da Saúde entende que são conhecimentos tradicionais que visam promover saúde, prevenir doenças – eu não sei como, não tem nenhum estudo que mostre isso – e complementar os cuidados da medicina convencional. E gasta dinheiro com isso. Aí pode.

Não fazemos nada de errado, ninguém está ganhando dinheiro enganando o paciente. Quem está enganando o paciente é o governo, que promete um SUS de qualidade e não entrega.

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Fonte. Gazeta do Povo

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