Em meio aos arranha-céus que sobem sem parar na capital cearense, muitas vezes sem o cuidado de preservar a memória arquitetônica da cidade, alguns casarões, templos e teatros tombados ainda resistem, preservando fragmentos da história e da identidade local. São construções que contam a história da cidade para além das praias, revelando uma Fortaleza onde o antigo se esforça para conviver com o novo.
Um dos grandes símbolos da memória local é o Theatro José de Alencar, , inaugurado em 1910. Com 800 lugares em três andares para plateia, foi construído com estrutura metálica importada da Escócia. Na fachada, a arquitetura é eclética, enquanto no interior predomina o art nouveau.
A visita guiada (R$ 12) revela histórias de divisão social. Havia assentos especiais para homens solteiros, para novos ricos e, no fundo da sala, para trabalhadores que ficavam em pé —espaço
apelidado de inferninho. Ainda hoje, o teatro recebe peças, shows e concertos à luz de velas.
Erguido no final do século 19, ainda durante o reinado de dom Pedro 2º, o Museu da Indústria ocupa um casarão que originalmente foi sede da Sociedade União Cearense, o primeiro clube social da cidade e ponto de encontro dos mais endinheirados.
Depois funcionou como hotel, agência dos Correios e até sede de uma companhia inglesa de energia e bondes. Hoje restaurado, é um museu com mais de 2.000 m², que oferece oficinas e aulas gratuitas, enquanto as exposições reconstroem a trajetória de grandes movimentos da indústria cearense e sua relação econômica com outros eixos do país.
A poucos passos dali, a Catedral Metropolitana de Fortaleza, sede da Arquidiocese e construída no lugar da antiga igreja matriz, foi inaugurada em 1978, após cerca de quatro décadas de obras. Consegue abrigar cerca de 5.000 fiéis.
Ao sair da catedral, o cotidiano urbano invade: na rua da igreja acontece a tradicional feira da madrugada, onde barracas vendem tecidos, roupas baratas e atendem feirantes que vêm de municípios do interior, como Sobral e Juazeiro do Norte.
Com torres que alcançam 75 metros de altura, tem estilo neogótico, inspirado em referências europeias como a Catedral de Colônia e a de Notre-Dame. Isso se traduz em janelas altíssimas, vitrais coloridos, arcos apontados e uma sensação de verticalidade contínua, como se o prédio tivesse sido desenhado para puxar o olhar para cima, e nunca acabar.
Do outro lado da cidade, no Meireles, uma das regiões mais culturalmente movimentadas de Fortaleza, o Museu da Imagem e do Som do Ceará chama atenção por uma característica arquitetônica muito simbólica. O equipamento é dividido entre uma antiga casa dos anos
1980 —que foi preservada como núcleo histórico original do museu— e um anexo contemporâneo, enorme, construído ao lado.
A casa antiga lembra o período em que o acervo audiovisual ainda era preservado manualmente, fita por fita, foto por foto. Já o novo anexo amplia radicalmente a escala e a função do museu, permitindo que o Museu da Imagem e do Som seja também um polo de circulação cultural ativo. Lá estão salas expositivas com fotografias históricas, cartazes originais, objetos de cinema e rádio antigos, além de mostras temporárias que mudam ao longo do ano.
Há temas mais experimentais e outros mais ligados a patrimônio —como memória urbana e até linguagem de vídeo contemporâneo. O museu também tem um auditório, com projeções e sessões especiais de filmes, muitos deles difíceis de ver em outro lugar. É um espaço onde é efetivamente possível ver, ouvir e tocar a história audiovisual do Ceará, e não só ler placas na parede.
Perto dali, na Aldeota, um casarão eclético de 1919 foi tombado recentemente, em junho deste ano, preservando fachada, telhado, portas e janelas originais. Relíquia dos primórdios da urbanização da região leste da cidade de Fortaleza, o lugar hoje abriga a padaria Casa Pâine,
cujo ponto alto (além da história) é o croissant com carne de sol.
Fonte.:Folha de S.Paulo


