
Viver com dermatite atópica (DA) é muito mais do que lidar com uma doença de pele. É uma batalha diária que se estende para além do visível, impactando cada dimensão da vida. Pacientes enfrentam dias difíceis, noites roubadas pela coceira intensa, olhares curiosos e, muitas vezes, preconceituosos.
As limitações no trabalho e nos estudos, a baixa autoestima, as frustrações e o impacto emocional profundo são uma realidade constante. Embora a doença se manifeste na pele, seus efeitos são sentidos muito além da pele, transformando a vida em uma verdadeira prisão invisível.
Apesar de sua prevalência e do sofrimento que causa, a dermatite atópica ainda é cercada por um desconhecimento alarmante no Brasil. Essa falta de informação atinge tanto a população em geral quanto, infelizmente, muitos profissionais de saúde da atenção básica e até mesmo alguns especialistas. O resultado é uma jornada diagnóstica árdua e prolongada.
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No meu dia a dia, vejo que essa odisseia pode durar anos e tem um custo humano altíssimo. O sofrimento físico e emocional se agrava, os sintomas pioram, e muitas vezes isso leva a um isolamento social e a doenças como a depressão.
É comum que pacientes passem por múltiplos médicos e recebam diferentes diagnósticos antes de finalmente chegarem à DA. Os sintomas são frequentemente confundidos com outras condições dermatológicas. A dificuldade no diagnóstico passa também pela ausência de um exame específico. A falta de acesso a especialistas, especialmente em regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos, agrava ainda mais esse cenário.
A dependência da atenção primária, onde a capacitação para reconhecer os sinais da DA é ainda deficiente, cria barreiras significativa para muitos. Quando o diagnóstico finalmente chega, a luta por tratamento continua.
A rede pública, em particular, não oferece opções terapêuticas adequadas para todos os casos, especialmente os moderados a graves. A ausência de um Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) atualizado e abrangente para pacientes adultos com dermatite atópica exclui as terapias mais modernas e eficazes, que poderiam transformar a qualidade de vida desses indivíduos.
Essa disparidade de acesso entre o sistema público e o privado é inaceitável e vai contra o princípio da equidade em saúde. Mas o que podemos fazer para mudar essa realidade?
O caminho para a equidade no tratamento da dermatite atópica no Brasil passa por ações concretas e urgentes. É fundamental investir na capacitação contínua de médicos e equipes de atenção básica para o reconhecimento precoce da doença. A telemedicina pode ser uma ferramenta poderosa para superar as barreiras geográficas e levar o especialista a quem mais precisa.
A atualização célere dos PCDTs é crucial, garantindo a incorporação de novas tecnologias e o acesso a terapias inovadoras que já se mostraram eficazes. Fortalecer as políticas públicas e acelerar a incorporação dessas tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS) é um passo decisivo.
O papel das associações de pacientes é vital. Atuamos na defesa dos direitos dos pacientes, na articulação de políticas públicas e na disseminação de informações qualificadas, tanto para pacientes quanto para profissionais de saúde e a sociedade em geral. Buscamos educar, desmistificar e lutar por um cenário no qual a DA seja reconhecida como uma condição crônica de saúde pública.
O cenário ideal para um paciente com dermatite atópica no Brasil seria aquele em que, desde o primeiro sintoma, ele fosse protagonista do próprio cuidado. Com um diagnóstico precoce, acesso a tratamento adequado e contínuo, incluindo as terapias mais avançadas e um acompanhamento multidisciplinar, o paciente poderia ter uma vida com qualidade e felicidade.
É tempo de romper com o estigma e a invisibilidade da dermatite atópica. É tempo de um novo olhar, de ação e de esperança para milhões de brasileiros.
A ampliação do acesso a terapias mais avançadas para o tratamento de doenças desafiadoras é um passo decisivo. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) discute, neste mês de novembro, por meio da Consulta Pública nº 163, a incorporação de uma nova tecnologia na rede privada, para oferecer mais uma opção de tratamento para pacientes com dermatite atópica grave.
Trata-se, portanto, de um passo importante para ampliar o acesso a tratamentos inovadores e reforça a necessidade de um debate amplo sobre a incorporação de novas tecnologias para os pacientes brasileiros.
*Gladis Lima é presidente da associação de pacientes Psoríase Brasil
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Fonte.:Saúde Abril


