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25 de novembro de 2025

Chefs fazem competição de como cortar cebolinha – 24/11/2025 – Comida

Chefs fazem competição de como cortar cebolinha – 24/11/2025 – Comida

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O chef britânico por trás da conta de Instagram RateMyChives –em que ele julga a qualidade dos montinhos de ervas picadas por chefs profissionais e cozinheiros amadores– lembra do momento, alguns anos atrás, em que percebeu a importância de uma cebolinha bem picada. A epifania veio, sem glamour nenhum, durante uma conversa de bar em um encontro.

“Saímos para jantar e a comida era meio ruim”, ele contou. Já no primeiro prato, soube que a refeição seria decepcionante “porque a cebolinha estava mal picada”.

Ele explicou para o seu par romântico que, se o chef não se dá ao trabalho de cuidar dos detalhes, provavelmente também não presta atenção às coisas grandes. Mais tarde, foi olhar na internet se alguém avaliava a cebolinha dos chefs e, como não encontrou nada, registrou o @RateMyChives e esqueceu o assunto.

Meses depois, lembrou da conta e começou a postar. Quando chegou à impressionante marca de 50 seguidores, achou que tinha batido no teto. Quase três anos mais tarde, o perfil já juntou quase 85 mil seguidores e um status de culto no competitivo mundo dos chefs. (Entre eles estão nomes famosos como Grant Achatz, chef e proprietário do Alinea, e Meredith Hayden, autora de livros de receita e estrela do TikTok.)

O homem por trás da conta falou sob condição de anonimato porque não quer virar alvo de ataques pessoais ou ter suas credenciais questionadas por usuários irritados com notas baixas. (Embora o clima do RateMyChives seja em geral positivo –e bem bobão– ele já ouviu de “uns malucos aí” que parecem levar a coisa a sério demais.)

A cebolinha, e a busca pela perfeição no jeito de picá-la, está vivendo um momento de fama. No Reddit, outro experimento com o tempero está em curso. Um usuário chamado F1exican vem postando diariamente a foto de um montinho de cebolinha que ele mesmo picou, pedindo para as pessoas apontarem os defeitos.

Ele diz nos posts que vai continuar até que seu montinho esteja perfeito e ninguém consiga identificar um erro. Na quinta-feira, ele chegou ao 45º dia, e o público está cada vez mais envolvido com a missão. (O r/KitchenConfidential, onde ele posta, teve 2,5 milhões de visitas em uma semana.)

Ali, comentaristas empolgados se apressam em apontar pedacinhos que não estão do mesmo tamanho ou segmentos tortos. Postam memes bobos e enxergam formas de vários objetos na cebolinha, como se fosse um tipo de teste de Rorschach herbáceo. “Até amanhã, chef”, virou a despedida padrão. A pessoa por trás da conta, que passou a se chamar “Chivelord”, não respondeu à mensagem de um repórter do Washington Post pedindo entrevista.

As críticas à cebolinha fazem parte de uma tendência maior online em que as pessoas avaliam e resenham coisas como gravetos, o jeito de andar de pedestres aleatórios em Nova York e cachorros. (Estes últimos, claro, nunca levam menos de 10 em 10.) Todo mundo, ao que parece, é mesmo crítico –e nada é pequeno demais para escapar do julgamento.

Kenji Hurlburt, instrutor no Culinary Institute of America que dá aulas de técnicas fundamentais da culinária francesa, sobretudo de corte, vê algo de sisífico e, ao mesmo tempo, nobre nessa busca. “Acho que há uma beleza real em tentar extrair perfeição de algo que nasce na natureza e é, por definição, meio imperfeito”, diz Hurlburt, que costumava fuçar o RateMyChives no Instagram antes de abandonar a plataforma há algum tempo.

“Especialmente quando você está cortando um volume muito grande, sob a opinião implacável do fórum público da internet –você sabe que não vai ganhar essa batalha.”

O chef por trás do RateMyChives acha que o apelo de um tema tão nichado está justamente no aspecto esportivo, público, da coisa. “Chefs são competitivos”, ele diz. “Eles querem ser melhores do que a pessoa ao lado. Então isso basicamente permite que alguém julgue o trabalho deles e, a partir daí, ou se gabar, ou ser colocado no seu lugar, ou até colocar outra pessoa no lugar, ou se gabar do trabalho de outra pessoa às vezes.”

A erva de fato funciona como uma espécie de provação de cozinha –cebolinha é particularmente difícil de cortar perfeitamente, diz Hurlburt. Como quase tudo que é orgânico, ele observa, ela é irregular: tem tamanhos e espessuras um pouco diferentes, e murcha em ritmos variados, então algumas ficam mais firmes e outras mais molengas.

“Nenhuma cozinha no universo vai deixar você picar um fio de cada vez, então você precisa juntar em maços”, ele diz. “E é aí que está o desafio de verdade: tentar conseguir a textura certa, o movimento certo de corte com esse produto que às vezes é bem fibroso e às vezes é quase um papelzinho.”

O chef do RateMyChives afirma que, ao longo dos anos, se impressionou com a variação de nível técnico. “Já vi cebolinha de restaurante com, provavelmente, duas e três estrelas Michelin, que era simplesmente ruim”, ele diz. “E já vi cebolinha muito boa de, tipo, uma pizzaria.” Uma das graças de tocar a conta, ele diz, é acompanhar a evolução de alguns chefs ao longo do tempo, que mandam várias fotos.

Para quem quer perseguir a própria excelência na faca, Hurlburt recomenda uma faca bem afiada e uma superfície de corte com um mínimo de “molejo”, como madeira. Ele diz que muitos cozinheiros iniciantes cometem o erro de usar a pontinha da faca como “pivô” apoiado na tábua durante o corte. Em vez disso, ele recomenda usar um ponto da lâmina a uns 4 a 5 centímetros da ponta, o que faz com que as mãos fiquem mais próximas da tábua (e da cebolinha), dando mais controle.

No fim das contas, porém, cebolinha pode ser “só” cebolinha –de qualquer jeito que você corte.

“Acho essa página divertida porque não tem política por trás”, diz o criador do RateMyChives. “Não tem agenda escondida. Não tem, tipo, patrocínio, marketing, nada disso. Literalmente, é o que é.”





Fonte.:Folha de São Paulo

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