A Justiça Federal no Pará liberou a continuidade do projeto de explosão de um canal ao longo de 35 km do Pedral do Lourenço, no rio Tocantins, leste do estado.
A obra, que faz parte do Novo PAC do governo Lula (PT) e que ganhou licença de instalação na gestão do petista, impacta dezenas de comunidades de pescadores que vivem em torno do pedral, de forma integrada a esse ecossistema.
Uma decisão da Justiça proferida em junho deste ano vedava o início das explosões do pedral, que está no caminho da hidrovia Tocantins-Araguaia. Integrantes do Judiciário fizeram uma inspeção na região impactada pelo empreendimento e constataram a necessidade de compensação financeira aos ribeirinhos. A Justiça, porém, não viu motivos para barrar o derrocamento das rochas.
A decisão que valida a licença de instalação emitida em maio pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) –o aval permite o início da explosão– foi proferida na última sexta-feira (19) pelo juiz André Luís Cavalcanti, da 9ª Vara Federal Ambiental e Agrária. É o mesmo magistrado que havia suspendido os efeitos da licença.
O MPF (Ministério Público Federal) moveu ação civil pública contra a explosão do Pedral do Lourenço, em razão dos impactos às comunidades ribeirinhas, que acabaram ignoradas ao longo do processo, conforme a ação. A própria existência dessas comunidades, cuja pesca está diretamente associada à lógica do pedral, foi negada, como se constata numa decisão judicial de fevereiro.
A nova decisão determinou uma suspensão do processo por 45 dias, para que o MPF apresente propostas de compensação aos ribeirinhos, “com prazos fixos e claros para o pagamento de indenizações”. Uma estimativa de lideranças comunitárias é de que 3.000 pessoas serão impactadas pela intervenção no pedral.
“A construção da obra pública no rio Tocantins pelo Estado brasileiro traduz a manifestação de sua vontade política e soberana. Trata-se de empreendimento em que o governo eleito atribuiu alta relevância estratégica para a infraestrutura nacional e previu potenciais benefícios econômicos”, disse o juiz Cavalcanti na decisão.
“Todavia, a vontade política do Estado, revelada na implantação de obra hidroviária no interior da Amazônia Legal, com impactos diretos não apenas sobre os ecossistemas locais, mas também sobre comunidades ribeirinhas, evidencia a complexidade da controvérsia judicial instaurada, a exigir ponderação frente a interesses de ordem política ou econômica”, completou.
O projeto do derrocamento do Pedral do Lourenço é executado pelo Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), um órgão do governo federal. Segundo o Dnit, as rochas a serem removidas representam 1% da área total do pedral.
Projeto também prevê dragagem
Além da explosão do pedral, o projeto prevê a dragagem de 177 km ao longo do rio Tocantins –os trechos referentes à dragagem não foram objeto da decisão judicial e estão previstos para fases posteriores do empreendimento. A abertura dessa área garantiria acessos de minério, soja e carvão mineral ao Porto de Vila do Conde, em Barcarena (PA), perto de Belém.
A abertura de uma passagem pelo Pedral do Lourenço —com até três detonações por dia, por três anos, garantindo uma faixa de 100 m de largura no rio para a passagem de barcaças— integra um projeto bem mais amplo, que permitiria o funcionamento da hidrovia Tocantins-Araguaia.
A reportagem da Folha esteve na região do Pedral do Lourenço em agosto deste ano e documentou o cotidiano das comunidades ribeirinhas que dependem da pesca associada ao pedral.
A Vila Santa Terezinha do Tauiri, na margem do rio Tocantins, tem mais de um século de existência. São cerca de 130 famílias na comunidade, segundo a associação, e quase todos são pescadores artesanais. A cidade mais próxima é Itupiranga (PA), que fica a 50 km de Marabá (PA).
A partir da vila se inicia o Pedral do Lourenço —as rochas já estavam bem afloradas no rio em meados de agosto. O pedral prossegue por 35 km, até a ilha do Bogéa, e as explosões estão previstas para todo esse trecho. A vila seria um entreposto para um paiol com os explosivos.
Fonte.:Folha de S.Paulo


