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26 de dezembro de 2025

Estação Júlio Prestes: restauração revela cores originais – 26/12/2025 – Cotidiano

Estação Júlio Prestes: restauração revela cores originais – 26/12/2025 – Cotidiano

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O papelão no chão esconde quase cem anos de história e uma parte importante do desenvolvimento ferroviário do estado de São Paulo. Embaixo da proteção empoeirada e suja de tinta estão tacos impecavelmente recuperados.

O piso faz parte de uma futura sala de exposições e café próxima ao desembarque dos trens da estação Júlio Prestes, na região central da capital paulista, que está em processo final de restauração.

Ao custo de cerca de R$ 30 milhões, os trabalhos estão na reta final para a conclusão.

Detalhista, a recuperação da estação, por onde passam 5.000 pessoas ao dia, está prevista para ser entregue no primeiro trimestre de 2026. Somente os tacos do piso do futuro café, local usado na década de 1950 como sala de espera para passageiros de segunda classe, necessitaram de sete camadas de restauro.

Projetada pelo arquiteto Christiano Stockler das Neves e construída pela Estrada de Ferro Sorocabana ao longo de 13 anos —entre 1925 e 1938, mas inaugurada em 1930, segundo informativos do Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) e do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional)—, a obra precisou de autorização das três esferas de preservação patrimonial para ser tocada.

O Iphan, por exemplo, exigiu que a pintura do saguão de entrada mantivesse marcas de massa usada para tapar rachaduras no passado, em processo de mimetização (imitar o original) na pintura chapada —vale dedicar alguns segundos e apreciar como ficou teto dali.

As tonalidades usadas na pintura são as mesmas da inauguração, afirma Camila Mendonça Rabassa, gerente de engenharia de projeto civis e qualidade da Motiva, empresa da qual faz parte a ViaMobilidade, concessionária responsável pela estação e pela linha 8-diamante, que tem parada inicial e final ali antes de passar pelas catracas.

“Para as pinturas foram usadas tintas minerais compostas de silicatos, mais duráveis e adequadas à conservação de ambientes históricos, como as empregadas originalmente”, informa a ViaMobilidade.

A cor “flor de laranjeira” foi escolhida para harmonizar as áreas internas, enquanto nuances de rosé serão aplicadas em pontos específicos.

“A [futura] sala do café nos surpreendeu, pois não tinha nada a ver com o original. Foi uma surpresa as cores que encontramos”, diz a engenheira.

Chamam a atenção as molduras nas paredes e a marca de uma porta que “reapareceu”. A sala, que não era acessível ao público, estava sendo usado como uma espécie de depósito.

Alpinistas usaram espátulas para retirar até seis camadas de tinta até se chegar à primeira. “O desafio foi encontrar tintas com tonalidades iguais às originais”, diz a engenheira.

Uma empresa especializada em restauração foi contratada para a reforma, iniciada a partir de um mapeamento para o projeto que levou dois anos para ser aprovado por órgãos de preservação.

Também há obras estruturais e de acessibilidade. Numa delas, durante a adequação de uma rampa, operários encontraram um para-trem de ferro usado no passado no fim de trilhos que nem existem mais. O achado arqueológico continua no lugar, mas agora ficará exposto.

A reforma começou pelo telhado. Placas de policarbonato foram colocadas na cobertura translúcida para promover iluminação natural, como no projeto original, o que aumentou a claridade para quem desce ou espera o trem nas plataformas.

As pilastras e estruturas metálicas do interior voltaram a ter coloração avermelhada —elas haviam sido pintadas de cinza.

Para não interromper a circulação dos trens da linha 8, trabalhos estruturais tiveram de ser realizados durante a madrugada. Ao todo, a restauração envolveu mais de cem pessoas, sendo que oito eram alpinistas.

Os relógios, de 1972, foram recuperados —na visita da reportagem ao local, no último dia 2 de dezembro, apenas um ainda não marcava as horas, mas estava pronto para ser ligado.

Há detalhes imperceptíveis ao olhar dos passageiros. Onde a mão alcança, acrílico foi colocado no lugar de vidros quebrados, mantidos nos pontos mais altos.

Portas fora dos padrões foram substituídas por outras com dimensão dos tempos da inauguração.

O visual degradado da fachada foi recuperado com verniz antipichação. “Percebemos que as pessoas passaram a fazer mais selfies, voltou a ser um ponto turístico”, diz Camila.

A vendedora Maria Júlia Denis, 48, moradora em Campinas, entrou na Júlio Prestes pela curiosidade. Ela visitava locais históricos do entorno com uma amiga —já haviam passado pela vizinha estação da Luz e pela Sala São Paulo, e pararam diante das bilheterias de madeira, onde fizeram fotos com o celular.

“Antes as coisas eram realmente mais bonitas”, afirma, em meio ao barulho de esmirilhadeira jatos d’água misturado ao do trem nos trilhos.



Fonte.:Folha de S.Paulo

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