A Bolsa de Valores brasileira surpreendeu o mercado em 2025. De janeiro até sexta-feira (26), o Ibovespa, índice acionário de referência do país, subiu 33% —um movimento que culminou em 32 renovações do recorde histórico ao longo do ano e que passou ao largo das expectativas da grande maioria dos agentes no apagar das luzes de 2024.
À época da virada do calendário, a mediana das projeções de casas de análise projetava que o índice fecharia 2025 em 142.500 pontos. O Ibovespa encerrou a sexta aos 160.896 pontos —distante da máxima do ano, de 164.455 pontos, atingida em 4 de dezembro, mas ainda mais longe das projeções do fim de 2024.
A valorização de mais de 30% bateu o CDI (Certificado de Depósito Interbancário, o equivalente da taxa Selic no mercado privado) acumulado do ano, em torno de 13,75%, no “país da renda fixa”, como o Brasil é apelidado.
O motivo para o pessimismo recaía na expectativa de juros mais altos e piora do quadro fiscal, que levaram o dólar ao pico de R$ 6,20. O câmbio pressionado teria o potencial de impulsionar a inflação até 7% neste ano, como previam algumas corretoras, o que elevaria a Selic e, por consequência, tiraria ainda mais a atratividade da renda variável.
Mas a Selic foi alçada a 15%, maior patamar em quase duas décadas, a inflação entrou na banda de tolerância do BC (Banco Central), e o quadro fiscal do país não melhorou. A disparada da Bolsa neste ano, afirmam especialistas, teve mais a ver com o cenário internacional do que com o doméstico, conforme investidores estrangeiros adotaram a estratégia de diversificação para fora dos Estados Unidos em meio às turbulências do governo Donald Trump.
Em 2026, será a vez de os ventos nacionais ditarem a direção do índice. “As eleições presidenciais e o ciclo de cortes na taxa de juros vão dar as cores da economia do ano que vem”, afirma Gina Baccelli, estrategista sênior de investimentos do Itaú.
Ainda que a disputa esteja carregada de incerteza, operadores projetam um cenário em que o presidente Lula (PT) enfrentará um candidato da oposição com uma agenda mais alinhada aos interesses do mercado —isto é, mais avesso a aumentar gastos públicos e atento à trajetória da dívida do país, atualmente em 78% do PIB (Produto Interno Bruto), segundo dados do BC em novembro.
O aumento de despesas poderia, por exemplo, forçar uma manutenção da taxa Selic em patamares elevados, já que teria o potencial de afetar a dinâmica da inflação. Nesse cenário, os rumos da economia ficariam mais imprevisíveis, e a renda variável, menos atraente.
Folha Mercado
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O desmonte das operações de “Tarcísio Trade” —posições que anteviam uma vitória do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), no pleito— no começo de dezembro deu o tom da volatilidade esperada para o ano que vem. O anúncio da candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) dividiu a oposição e enfraqueceu o nome de Tarcísio, então favorito da Faria Lima.
A possibilidade de uma reeleição de Lula, visto como expansionista pelo mercado, fez a Bolsa cair 4% e o dólar avançar 2% em um único dia, apelidado de “Flávio Day” pelos investidores. “Não há nenhuma certeza em ano eleitoral, exceto a de que haverá muita volatilidade”, diz João Daronco, analista da Suno Research.
Mesmo assim, a expectativa é que o Ibovespa siga em trajetória ascendente. O Itaú espera que o índice avance para a faixa de 165 mil a 180 mil pontos, com potencial para alcançar 189 mil pontos no cenário mais construtivo. Já a XP vê 185 mil pontos como o patamar justo, com o cenário mais pessimista projetando o índice em torno de 144 mil pontos, e o mais otimista, em 224 mil pontos.
“Não espero que o Ibovespa suba em linha reta. Devemos ter várias quedas, como a do Flávio Day, ao longo do ano”, afirma Daronco.
A tese de valorização da Bolsa se ampara na previsão de cortes na taxa Selic: segundo o mais recente boletim Focus, a expectativa é que os juros encerrem o próximo ano em torno de 12%. Rodadas de afrouxamento monetário costumam ser positivas para o Ibovespa, que, segundo a XP, avançou 39,2% considerando os oito ciclos mais recentes.
A Selic em baixa ainda pode atrair o investidor local de volta para a Bolsa, conforme a renda fixa perde um pouco do brio. Para esse tipo de operador, pesa ainda o que Daronco chama de “fomo” (“fear of missing out”, ou medo de ficar de fora, em inglês). “Ao olhar para a taxa Selic, 15% ao ano parece já bastante coisa. Mas, ao observar Bolsa em 30%, o investidor pensa: ‘Poxa, perdi, então vou comprar para o ano que vem’”, diz o analista da Suno.
Na avaliação de especialistas, o corte de juros será ainda mais atraente para o investidor estrangeiro, que deverá continuar na estratégia de diversificar carteiras para fora dos Estados Unidos. “Ele vai alocar mais recursos no Brasil se houver corte. A discussão é se vai ser muito ou pouco”, diz Gina Baccelli, do Itaú.
Além disso, há a tese de que a Bolsa brasileira está “barata”, ou seja, que os preços dos ativos não refletem o real valor. “Estão negociando hoje em torno de nove vezes o lucro esperado para o ano”, diz Matheus Amaral, especialista em renda variável do Inter.
Traduzindo em miúdos, a conta soma o valor de mercado de todas as empresas listadas no Ibovespa e divide o resultado pelo lucro esperado de todas essas mesmas companhias para 2025. O resultado é o que diz se a Bolsa está “barata” ou “cara”. O dado de 9 vezes preço/lucro está abaixo da média histórica, de 11 vezes. Para ter ideia, o S&P 500, índice de referência dos Estados Unidos, está rodando a 23 vezes preço/lucro.
“Todos os ruídos do Brasil, como os da corrida presidencial e o lado fiscal, já estão descontando o Ibovespa. Ao olhar os pares emergentes, estamos perdendo para Índia, Argentina, Hong Kong. Nós estamos baratos também por isso, porque é difícil antever os riscos que podem acontecer aqui”, afirma Amaral.
Fonte.:Folha de S.Paulo


