Três anos atrás, quando eu visitava Bogotá, uma pergunta aparecia sempre com uma frequência quase constrangedora: “Você vai também a Medellín?”. A ideia na época era focar só a capital colombiana, mas desde então a ideia de visitar a segunda maior cidade do país não saiu da minha cabeça.
Não entendia muito bem a insistência da pergunta. Era como se toda a minha impressão de Bogotá, que já era muito boa (como contei aqui mesmo nesta Folha) pudesse ser manchada com uma rápida visita a Medellín. À voz baixa, logo depois que eu confirmava que lá não iria daquela vez, vinha invariavelmente um elogio.
“As universidades de Medellín são as melhores do país.” “A arquitetura da cidade é incrível.” “Tem uma cena gastronômica muito interessante por lá”, essa ouvida na capital que tem pelo menos dois restaurantes na lista do 50 Best: El Chato e Leo.
Mas o comentário que me deixava mais curioso para conhecer “a outra grande cidade colombiana” tinha a ver com as artes plásticas: “As melhores galerias estão em Medellín, além de um museu incrível que você precisa conhecer”. Quis o destino então que eu fosse recentemente convidado a ir até lá justamente para conhecer essa cena artística.
Depois de dois anos num circuito itinerante, a primeira edição da Bienal das Amazônias aportou no Museu de Arte Moderno de Medellín e eu tive a chance de celebrar o sucesso dessa ideia que, se um dia pareceu ousada, reunir artistas fora do eixo convencional num evento focado nas Amazônias, fecha agora um ciclo numa nota maior.
A segunda versão já será apresentada na sede da Bienal, em Belém, agora no final de agosto. Mal posso esperar para saber por quais novos caminhos ela vai levar minhas sensações. Mas sei que reencontrar a maior parte da primeira exposição em Medellín me fez ter mais uma vez a certeza de que a iniciativa não só preencheu um espaço nas artes, mas também mudou a referência para mais de uma geração de artistas.
Ali no museu, nomes que talvez não fossem conhecidos do grande público estavam em casa, num espaço que evoca as ladeiras e terraços de Medellín, devolvendo para a cidade seu respeito pela arte. De Denilson Baniwa a Rafa Bqueer, de Éder Oliveira a Bonikta, de Nohemi Perez a Adriana Varejão, de Lova Lova a LK Prod, todos estavam lá redesenhando essas Amazônias e encantando os colombianos.
E eventualmente brasileiros como eu, que chegavam curiosos à terra de Botero. O artista que conquistou o mundo com suas figuras rechonchudas marca presença numa das praças principais de Medelín, onde nasceu. Mas como eu já vinha pressentindo, isso era apenas o começo.
Dias antes eu tinha estado em Miami, e por acaso esbarrei numa galeria chamada La Cometa. Sim, de Medellín. E lá me deparei com novos trabalhos de Olga de Amaral, uma artista colombiana incrível que eu havia descoberto tardiamente no começo do ano numa retrospectiva na Fundação Cartier, em Paris.
Inevitavelmente passei então pela La Cometa de Medellín. E me vi conectado mais uma vez a uma cidade vibrante. Com gente vibrante. Com mesas vibrantes (Sambombi, disparado o melhor restaurante!). Com gente vibrante.
Que, como vi de perto na abertura da Bienal das Amazônias por lá, é capaz de dançar uma cúmbia macabra, cortesia de um DJ colombiano poderoso chamado El Último Romântico, até altas horas da madrugada.
O que é cúmbia macabra? Coisas que a gente ouve em Medellín. Mas não em Bogotá…
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Fonte.:Folha de S.Paulo