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16 de dezembro de 2025

Artistas pressionam Lula por maior taxação sobre streaming

Artistas pressionam Lula por maior taxação sobre streaming

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Às vésperas do recesso parlamentar, a aprovação do chamado PL do Streaming se tornou um novo desafio político para o presidente Lula. O ponto mais controverso da proposta é a cobrança de um imposto sobre as plataformas de streaming e big techs. Enquanto parte da direita se opõe à medida, alegando que ela encarecerá as assinaturas para os consumidores, grande parcela da classe artística defende a cobrança como forma de fortalecer a produção nacional.

Apesar do consenso sobre a necessidade de taxar o setor, artistas divergem quanto à porcentagem e ao destino dos recursos arrecadados. A votação, prevista para esta quarta-feira (17), aguarda o parecer do relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), que busca um consenso para viabilizar a aprovação. No meio desse impasse, Lula, pressionado pela classe artística, tenta evitar novos desgastes diplomáticos com os Estados Unidos. O país é a sede de gigantes do setor, como Netflix, Disney Plus e Amazon Prime, que terão seus interesses comerciais diretamente afetados pela proposta.

Na última versão do parecer de Eduardo Gomes, a alíquota da Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) foi fixada em 3% sobre a receita bruta das plataformas de streaming. Para as big techs, como YouTube e Meta, a alíquota seria de 0,8%. Outro ponto polêmico é a possibilidade de dedução de até 70% do imposto caso as empresas invistam diretamente em produção de conteúdo nacional ou adquiram direitos de obras brasileiras independentes — medida que divide opiniões no setor cultural.

Lula sugeriu alíquota quatro vezes menor que o indicado por órgãos de cinema

O Conselho Superior de Cinema defendeu a adoção de uma alíquota mínima de 12%, abrangendo todas as receitas do serviço, incluindo publicidade, assinatura e vendas avulsas. Já o relatório do Grupo de Trabalho do VoD (Video on Demand), vinculado ao ministério da Cultura, sugeriu 4%. O Governo Federal, por sua vez, apresentou ao relator a proposta de uma alíquota única de 3% para todos os serviços.

Nas redes sociais, o ator Wagner Moura pediu que Lula “ficasse atento” à proposta, defendendo que a alíquota de 4% seria uma porcentagem muito baixa diante do potencial do setor. “O Brasil é o segundo maior mercado onde os streamings fazem mais dinheiro no mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Para esse mercado, essa é uma taxação muito pequena”, criticou.

Por outro lado, Giuliano Miotto, advogado e CEO do Instituto Liberdade e Justiça, posiciona-se totalmente contrário à taxação. “O PL do Streaming é um enorme retrocesso regulatório e tributário, que prioriza os interesses da indústria audiovisual brasileira, que já recebe inúmeros incentivos, sobre os princípios do livre mercado, da livre iniciativa, da eficiência econômica e liberdade de escolha do consumidor. No fim, quem vai pagar a conta são os usuários”, afirma.

Figuras do setor cultural, mesmo não alinhadas à esquerda, também apoiam o projeto. É o caso do cineasta Josias Téofilo, diretor do documentário “O Jardim das Aflições”, sobre o filósofo Olavo de Carvalho. “Muita gente tem reclamado que poderia ser maior a porcentagem. Mas mais importante que isso é que seja aprovado. Estamos há anos nesse imbróglio e é fundamental que a produção nacional aumente”, defende.

Já Ian Maldonado, cineasta e documentarista, reconhece que leis de incentivo podem ser positivas, mas alerta para o risco de distorções. “É claro que qualquer taxação acaba refletindo no consumidor final, o que é péssimo. Mas, se bem equilibrada, pode funcionar. Existe um grande desconhecimento sobre as leis de incentivo, que podem ser boas, desde que não sejam corrompidas para contemplar apenas projetos alinhados a uma agenda ideológica”, destaca. A produtora de Maldonado foi responsável por um documentário sobre o lockdown durante a pandemia da Covid-19, que chegou a ser censurado pelo YouTube em 2021.

Especialistas defendem descentralização dos recursos para garantir pluralidade

Outro ponto que gera desgaste é a possibilidade de dedução de até 70% do imposto pelas próprias plataformas. A dedução acontecerá caso as empresas invistam diretamente em produção de conteúdo audiovisual brasileiro ou adquiram direitos de licenciamento de obras nacionais produzidas por produtoras brasileiras independentes. O texto concede certa flexibilidade às plataformas, permitindo que escolham como deduzir o imposto – seja produzindo ou comprando conteúdos brasileiros que estejam alinhados aos seus interesses comerciais.

Wagner Moura, em sua manifestação, critica a possibilidade de abatimento. “O ponto mais bizarro é a possibilidade de as empresas usarem parte do dinheiro da taxação para investir em seu próprio conteúdo. Esse dinheiro deveria estar indo para o Fundo Setorial de Audiovisual (FSA) e para fomentar a produção independente brasileira”, afirmou.

Criado há quase 20 anos, o FSA financia produções audiovisuais nacionais. Além da verba destinada pela União, outra fonte de recursos do fundo é a Condecine, já cobrada de outros agentes do setor. Os programas financiados são escolhidos por editais de Chamadas Públicas, elaborados pela Ancine.

Maldonado não concorda com a proposta de Moura de enviar os recursos para o FSA, já que usualmente os valores são destinados para produções alinhadas à esquerda. “Essa ideia do Wagner Moura é uma completa bizarrice. Porque você estaria concentrando, de novo, poder na mão de meia dúzia de pessoas para contemplar os projetos mais conveniente a esses grupos”, defende. Segundo o cineasta, a descentralização do recurso, por estar a cargo das próprias plataformas, gera concorrência e fomenta a pluralidade de produções.

Miotto acredita que ao invés de criar novas legislações, o Congresso Nacional poderia aperfeiçoar a Lei Rouanet. “O ideal seria um aperfeiçoamento dessa lei, permitindo o abatimento integral de tributos devidos para projetos de interesse das empresas e da sociedade”, sugere. Ele também defende critérios mais objetivos nos editais: “O fortalecimento do setor deveria passar por uma revisão nos critérios de aprovação, reduzindo a subjetividade e adotando parâmetros claros”.

Interferência em catálogos de streaming pode comprometer experiência do assinante

A proposta também impõe outras exigências às plataformas, como a inclusão de pelo menos 10% de produções nacionais nos catálogos e a obrigatoriedade de manter esses conteúdos disponíveis de forma permanente e contínua. O texto, porém, não detalha como isso será implementado.

A Brasil Paralelo critica a medida, alegando que ela pode engessar as plataformas. Segundo a empresa, as plataformas seriam obrigadas a destacar conteúdos mesmo sem demanda do público, comprometendo a experiência do usuário.

Além disso, as empresas passarão a estar sob fiscalização da Ancine, que poderá criar novas exigências por meio de normas infralegais, sem necessidade de aprovação do Congresso. “É bastante óbvio que, ao delegar poder à Ancine para implementar a regulamentação por normas infralegais, corre-se o risco real de que esta agência estabeleça uma burocracia cada vez mais onerosa às plataformas de Streaming”, reforça Miotto.

O cineasta Teófilo acredita que esse tipo de burocracia afetará pouco a experiência do usuário, que já está acostumado a encontrar conteúdos de baixa qualidade nas plataformas. “Apenas uma pequena porcentagem do conteúdo produzido no audiovisual é realmente boa. A Netflix internacional produz um monte de lixo e, ali no meio, uma pequena porcentagem presta. Isso é no mundo inteiro, e o mesmo acontece com as produções nacionais”, conclui.

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Fonte. Gazeta do Povo

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