É provável que você já tenha ouvido a expressão “fazer um cooper” por aí. O que pouca gente sabe é que esse termo – que virou sinônimo de uma caminhada rápida e popularizou-se a partir dos anos 1970 – se originou no trabalho de um médico americano, hoje com 94 anos, Kenneth Cooper.
Cooper pode ser considerado o “pai” dos exercícios aeróbicos e foi uma figura fundamental para entendermos e incorporarmos essas atividades na prevenção e no tratamento de doenças.
Tive a oportunidade de estar com esse pioneiro no instituto que leva seu nome em Dallas, nos Estados Unidos. Foi o ponto alto de uma jornada que começou com um simples e-mail.
No início de 2025, apresentei à equipe do Cooper Institute um conjunto de protocolos clínicos que venho desenvolvendo no Brasil, ainda não publicados, voltados à prescrição de exercícios para condições complexas como câncer, Alzheimer, diabetes e síndromes combinadas.
A resposta foi imediata: me convidaram para discutir pessoalmente esses avanços. E foi lá, sentado com o criador do termo “aeróbico” , que me dei conta de que não era apenas uma visita. Era um encontro entre gerações unidas por um mesmo propósito — mostrar ao mundo que o exercício físico não é coadjuvante, mas protagonista da saúde.
Cooper é um nonagenário lúcido, ativo e plenamente funcional. Ele caminha, toma decisões no instituto e ainda participa de eventos científicos. É, literalmente, o corpo vivo da tese que defende há mais de 50 anos: a medicina do exercício é a chave da longevidade.
Conversamos sobre os desafios atuais da saúde global — doenças crônicas, transtornos mentais, câncer, obesidade… — e ele escutou com interesse as ideias que venho aplicando no Brasil.
Em determinado momento, quando falei sobre usar o exercício como estímulo fisiológico para competir metabolicamente com o tumor, ele me interrompeu e disse:“ Exato. Isso é o futuro. E também é o passado. Só esqueceram no caminho.”
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Também debatemos o uso de substâncias como a creatina em pacientes já diagnosticados com câncer, especialmente em metástases de mama, próstata e intestino, um contexto em que há evidências emergentes de que o suplemento, ao estimular algumas vias celulares, pode acelerar a proliferação de células tumorais. A recomendação, portanto, deve ser sempre individualizada – não há panaceia generalizada.
Falamos também sobre o papel do exercício no cérebro, favorecendo a neuroplasticidade, o fluxo sanguíneo e a limpeza de proteínas associadas a quadros de demência.
Cooper ainda concordou quando critiquei a banalização da frase “Faça uma caminhada” . A maioria dos profissionais ainda não compreendeu que exercício é como remédio: tem dose, intensidade, frequência e contraindicação. Tratar de forma genérica é, muitas vezes, um erro clínico disfarçado de boa intenção.
Os protocolos que desenvolvemos no Brasil e em outros centros do mundo tratam o exercício como recurso terapêutico central. Pacientes com câncer fazem treinos cardiorrespiratórios e de força adaptados mesmo durante a quimioterapia. Idosos com comprometimento cognitivo combinam sessões de coordenação motora e musculação.
O exercício é também um tratamento para quem sofre de doenças combinadas (diabetes, hipertensão, depressão…). É um recurso terapêutico transversal, pois atua simultaneamente em todos os sistemas corporais – e ainda pode ser aliado a medicamentos e outras terapias.
Não é a ausência de sintomas que define saúde. É a ausência de função. E função não vem em comprimidos — vem do movimento certo, na dose certa. O exercício, assim, não complementa o tratamento. Ele é o tratamento. E negar isso, em 2025, é negar a própria ciência.
* Cassio Fiani é educador físico, especialista em prescrição de exercícios para saúde e reabilitação e CEO do Health Center
Fonte.:Saúde Abril