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13 de dezembro de 2025

Brasil tem desindustrialização precoce em setores-chave – 13/12/2025 – Mercado

Brasil tem desindustrialização precoce em setores-chave – 13/12/2025 – Mercado

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A desindustrialização extremamente prematura dos setores de maior intensidade tecnológica no Brasil, como montadoras de veículos, metalúrgicas e a indústria química e petroquímica, bloqueou o desenvolvimento do país. E será muito difícil recuperar o tempo e o espaço perdido para outros países. Essa é a conclusão de um estudo publicado pelo Nereus, Núcleo de Economia Regional e Urbana da USP.

Setores de menor intensidade tecnológica, como as indústrias de alimentos e bebidas, têxtil e de madeira, por outro lado, entraram em processo de desindustrialização em momento posterior ao indicado como “normal ou natural” para os padrões internacionais.

O estudo “Nem toda desindustrialização é igual: por que a composição setorial da manufatura importa?“, de autoria de Paulo César Morceiro, Milene Simone Tessarin e André Nassif, faz uma análise inédita do fenômeno para o Brasil, utilizando dados sobre a perda de participação da indústria no emprego total de 1985 a 2022. Um trabalho anterior dos dois primeiros autores analisou o setor como um todo, pela perspectiva do seu peso no PIB (Produto Interno Bruto).

A queda no emprego industrial é um fenômeno mundial, mas ocorreu de forma prematura no Brasil justamente nos setores de ponta desde meados da década de 1980.

A desindustrialização precoce ocorre quando o emprego em determinado setor alcança seu pico no momento em que o país tem um PIB per capita abaixo do que seria o padrão na comparação internacional. Com isso, é possível ver qual era o patamar de renda e de desenvolvimento alcançado no momento em que os empregos começaram a migrar mais fortemente para o setor de serviços.

No setor de veículos, por exemplo, o pico se deu quando o Brasil tinha um PIB per capita de US$ 13 mil (valor ajustado pelo poder de paridade de compra), cerca de metade da média de US$ 26,5 mil verificados em um estudo de referência que abrange 173 países.

A relação entre setores, aliás, é destacada no estudo: a desindustrialização prematura deixa como legado para o país uma indústria e também um setor de serviços menos sofisticados.

Entre os casos mais graves de prematuridade estão os setores de máquinas e equipamentos e a produção de material elétrico, eletrônico e de comunicação, que chegaram ao pico quando a renda nacional estava em apenas 20% do que seria considerado o padrão para países desenvolvidos. Nos setores mais básicos, o processo ocorreu mais tarde no Brasil, quando o PIB per capita já havia ultrapassado o verificado na comparação internacional —o que leva a valores acima de 100%, como mostra o gráfico nesta página.

Para ilustrar o quão precoce foi esse processo nos setores mais avançados, o estudo faz uma analogia com a maternidade. Um parto é considerado normal quando ocorre no 9º mês de gestação. Se houver uma interrupção após apenas 20% a 40% desse tempo, significa que o bebê não terá se desenvolvido suficientemente para sobreviver a um parto prematuro.

Segundo os pesquisadores, indústrias de alta e média-alta tecnologia são vetores-chave de pesquisa, desenvolvimento e inovação, além de gerarem empregos com maiores salários e potencial difusor de progresso técnico.

“Nossa interpretação é que a desindustrialização extremamente prematura dos setores de maior intensidade tecnológica no Brasil bloqueou o desenvolvimento do país, seja pelo enfraquecimento do SNI (Sistema Nacional de Inovação), seja pela redução do potencial de crescimento da demanda agregada ou mesmo pela inviabilização dos segmentos de serviços mais sofisticados, que dependem da manufatura mais avançada”, dizem os pesquisadores.

Um dos autores, o professor do Departamento de Economia da UFF (Universidade Federal Fluminense) André Nassif, avalia que esse processo não é irreversível, mas diz que falta ao país uma estratégia de desenvolvimento que possa resultar em uma retomada desse setor, o que teria reflexos positivos também sobre serviços e agropecuária. Para ele, é necessário algum tipo de indução governamental, que não precisa passar pelas políticas de substituição de importações (como tarifas altas de proteção).

Nassif vê a transição energética como uma das oportunidades para que o país possa ter uma indústria mais robusta de alta tecnologia. “Reindustrialização não é ressuscitar setores que ficaram obsoletos ou perderam tração nas últimas duas ou três décadas.”

O programa Nova Indústria Brasil (NIB), lançado pelo governo Lula no ano passado, é citado como algo que prioriza crédito empresarial com pouca focalização setorial.

Outro autor, o pesquisador associado ao Nereus Paulo César Morceiro, diz que, se o Brasil quiser desacelerar o processo de desindustrialização ou promover uma leve reindustrialização, há três coisas a fazer. Aumentar o peso da indústria nas exportações mundiais, massificar o consumo do produto industrial no mercado interno (o que depende de redistribuição de renda) e focar a política industrial em inovação e tecnologia.

“Isso passa por uma política industrial que foque mais em inovação. A gente nem fala de campeão nacional. É necessário ter poucos campeões globais em setores-chave.”



Fonte.:Folha de S.Paulo

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