As cafeterias, hoje procuradas por quem quer fazer um lanche, brunch ou até festa, já foram berços de grandes revoluções e movimentos políticos. Tamanha foi a importância social desses espaços que eles foram alvos de governantes várias vezes ao longo da história.
Surgido na Etiópia, o café ganhou escala comercial a partir do cultivo no Iêmen, no século 14. A primeira cafeteria de que se tem notícia surgiu em 1475 em Constantinopla –atual Istambul–, então a capital do Império Otomano.
O hábito de consumir café fora do lar se espalhou rapidamente pelo mundo árabe. No século 15, já havia várias cafeterias em Cairo e Meca, por exemplo.
A sanha pelo líquido foi tão grande que, em 1511, Khair Beg, então governador de Meca, baniu o consumo de café por entender que ele feria os ensinamentos do Alcorão. Determinou então o fechamento de todas as cafeterias de Meca. Mas o tiro saiu pela culatra, pois o sultão voltou a liberar a bebida.
No século seguinte, os cafés ganharam a Europa e se tornaram ponto de encontro de intelectuais e políticos. Muitos filósofos e escritores célebres dessa época eram habitués de cafés, como Voltaire, Robespierre, Balzac e Victor Hugo.
Por um conservadorismo político e religioso, as cafeterias –e às vezes o próprio consumo de café– sofreram oposição.
Assim como líderes islâmicos, a Igreja Católica também ensaiou o banimento da tal bebida estimulante, pois uma ala da instituição acreditava que ela era uma bebida do demônio. Até que o papa Clemente 8º provou o café e decidiu que não era demoníaco.
Politicamente, as cafeterias eram vistas com ressalvas por governantes, pois era onde intelectuais se encontravam para ler os jornais —a imprensa era então a grande novidade técnico-informacional— e discutir os acontecimentos.
Tornaram-se polos de efervescência intelectual e política ao ponto de ficarem conhecidas na Inglaterra como “penny universities” (universidades de um centavo), em referência ao valor que se pagava para tomar uma xícara de café e ficar ouvindo as conversas e debates.
Mais do que mera reflexão, era nas cafeterias que revolucionários trocavam informação, se articulavam e planejavam ações.
Os ideais debatidos –às vezes com discursos inflamados– deram combustível para mobilizações sociais importantes, como a Revolução Francesa.
Um momento simbólico da revolução ocorreu no Café de Foy, estabelecimento que ficava nos jardins do Palais Royal, palácio que existe até hoje diante do museu do Louvre, na região central de Paris. No dia 12 de julho de 1789, Camille Desmoulins, figura-chave do movimento revolucionário, subiu em uma mesa e conclamou o povo a pegar em armas contra o governo. Dois dias depois, aquele quatorze juillet entraria para a história como o dia da tomada da Bastilha.
Com o tempo, os debates intelectuais e políticos migraram para novos espaços –como as universidades de fato–, e as cafeterias se tornaram pontos de encontro de amigos ou, mais recentemente, locais para reuniões de trabalho.
Hoje, são ambientes para socialização amena ou pausa solitária, acompanhado de uma bebida –que pode ser um drink com café ou mesmo um chá gelado– e uma comidinha –ou brunch.
Essa socialização tomou novo formato com a chegada das coffee parties, como são chamadas as festas diurnas realizadas em cafeterias, com bebidas cafeinadas substituindo as alcoólicas.
É uma ocupação desses espaços radicalmente diferente de como era nos primórdios. Não consta hoje que haja autoridade alguma preocupada com as coffee parties –talvez um síndico irritado com o barulho.
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Fonte.:Folha de São Paulo