Tentativas de descrever as cataratas do Iguaçu não fazem muita justiça. Há quem opte pela frieza dos números: são 275 cachoeiras reunidas que despejam 1,5 milhão de litros de água por segundo, gerando uma espuma que sobe a uma altura de quase 80 metros.
Outros escolhem as anedotas, como a de que a ex-primeira-dama americana Eleanor Roosevelt, encantada, teria exclamado “my poor Niagara”, com dó das cascatas de seu país natal. Nas lendas dos guaranis, habitantes originais, a fenda foi aberta por uma serpente monstruosa, Mboi, para impedir que a bela Naipi fugisse numa canoa com seu amado Tarobá.
No lado argentino, as quedas d’água parecem um abismo prateado. Um turbilhão vaporoso que de tão espesso não deixa ver o seu fim, rio abaixo. Isso porque, diferente do que ocorre na porção brasileira, suas passarelas foram construídas mais no alto, levando os visitantes até a boca do espetáculo.
Como cerca de 80% das cascatas estão na província de Misiones, não é incomum ouvir que se tem uma vista melhor delas no estado do Paraná, de onde se pode ter uma noção melhor do conjunto, contemplando-o de longe.
Mas é bom corrigir a injustiça: no território argentino, as trilhas são bem mais selvagens do que as brasileiras, e há opções de estadia ainda mais imersas na floresta.
Puerto Iguazú não passa de um vilarejo se comparado a Foz do Iguaçu. Enquanto a cidade paranaense tem investido em roda-gigante, shoppings, museu de cera, parque com réplica de dinossauro e até uma futura unidade do Pompidou, do outro lado da fronteira ainda vicejam aldeias indígenas ao redor de lodges de luxo cercados pela mata atlântica.
Atravessando a imigração, saem os canteiros de obras e entram os arroios tranquilos por onde se pode fazer caiaque e trilhas na floresta, como as oferecidas pela rede de hotéis Awasi. Na beirada das estradinhas batidas vemos grupos de guaranis —alguns deles vendem simpáticos bichos esculpidos na madeira: jacarés, tatus, araras, jaguatiricas…
Às 8h da manhã abrem as portas do Parque Nacional Iguazú. Convém estar lá um pouco antes, já preparado para uma caminhada de meia hora por uma trilha de terra. A maioria dos visitantes opta por tomar uma linha férrea que serve o parque e cujos primeiros trens costumam sair por volta das 8h30. Ou seja, apressando o passo dá para aproveitar a vista por uns dez minutos e tirar fotos antes que os vagões comecem a despejar os turistas.
Se houver sorte, dá ainda para ver tucanos sobrevoando o caminho a pé, como o trio avistado por este repórter. O final da rota é uma passarela metálica que se estende por quase um quilômetro sobre o rio Iguaçu e que termina na maior e mais cinematográfica das cataratas, em forma de ferradura, a Garganta do Diabo. O nome é bastante sugestivo para descrever aquele jato enorme e violento avistado do alto, da boca do desfiladeiro.
No caminho se veem pedaços retorcidos de ferro, restos de passarelas antigas que foram tragadas pela força das águas em cheias anteriores, onde as tartarugas tomam sol, quase camufladas. É bom levar um binóculo. O retorno é recepcionado por quatis que, de tão habituados à presença humana, chegam bem perto das nossas pernas, em busca de algum resto de comida humana.
O guia explica que a proximidade deles também tem outro motivo: eles sabem que suas predadoras, as onças-pintadas, evitam o homem, então dessa forma se mantêm longe das garras delas. É bom ter cuidado, porém. As placas por ali avisam que eles são fofinhos, mas podem morder.
O parque conta com mais trilhas mata adentro para olhar as cataratas de outros ângulos. Elas margeiam as quedas e chegam próximo à ilha de San Martín, uma ínsula fluvial cercada pelas enormes cascatas e que abriga La Ventana, um buraco nas rochas em forma de janela que permite ver o que há do lado brasileiro.
O Sendero Macuco é a mais selvagem das trilhas do parque argentino, mas sua dificuldade é mínima, com inclinação quase zero. Percorre-se um caminho estreito, floresta adentro, que permite um banho no Salto Arrechea, uma cascata de 20 metros de altura. Olhares mais atentos conseguem flagrar macacos-prego zanzando nas árvores.
Para finalizar, uma opção é o Gran Aventura, passeio de barco ao pé das cataratas que dura cerca de duas horas. Começa com um trajeto de 20 minutos de jipe até o embarcadouro, ao fim de uma escada no meio do mato. Dali saem botes coalhados de turistas com coletes salva-vidas que disparam pelo rio.
O barco vai pulando ao sabor das ondas ao som dos gritinhos dos passageiros e termina com o batismo: um banho nas cachoeiras. Capa de chuva nenhuma consegue evitar que se volte ensopado.
Do lado brasileiro, também há passeios de barco. Mas, avisa o condutor, por lá só se toma banho numa única cachoeira. “Aqui, são dois batismos”, afirma o hermano.
O jornalista viajou a convite da rede Awasi
Fonte.:Folha de S.Paulo