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- Author, Alicia Hernández*
- Role, BBC News Mundo
A libertação dos reféns vivos deverá ocorrer em 72 horas.
O acordo chega após dois anos em que mais de 67 mil pessoas morreram devido aos ataques israelenses. Cerca de 1,2 mil pessoas morreram nos ataques do Hamas em 7 de outubro, nos quais outras 251 foram feitas reféns.
A ofensiva militar israelense destruiu a maior parte da infraestrutura de Gaza e provocou uma crise humanitária catastrófica. Nas palavras da comissão investigadora da ONU, Israel cometeu genocídio.
O Hamas e Israel estiveram negociando indiretamente nos últimos dias no Egito, com a mediação do Catar, da Turquia e dos Estados Unidos, com base em um plano de paz de 20 pontos apresentado pelo presidente americano, Donald Trump.
Com este acordo, prevê-se que o Hamas liberte os reféns israelenses, que Israel retire suas tropas (continuando a controlar 53% da Faixa de Gaza) e que a ajuda humanitária entre no território palestino.
Isso seria o “primeiro passo para uma paz sólida, duradoura e eterna”, disse Trump em sua plataforma Truth Social.
Alguns detalhes, como os nomes dos detidos palestinos que serão libertados, ainda estão em discussão. E há uma forte oposição a este acordo dentro do gabinete israelense.
Na região e no mundo, há uma sensação de alívio coletivo.
No entanto, este é apenas um primeiro passo para o fim da guerra. A seguir, detalhamos os quatro pontos-chave dos quais depende o sucesso deste novo acordo e o fim da guerra.
1. Que nenhuma das partes rompa o cessar-fogo
A confiança entre ambas as partes é praticamente inexistente. E há motivos para que assim seja.
No mês passado, Israel tentou assassinar a equipe de negociação do Hamas com um ataque aéreo em Doha, o que enfureceu não apenas o Hamas, mas também Trump e o Catar, um mediador fundamental.
Em janeiro, já havia sido acordado um cessar-fogo, mas Israel o quebrou em março e retomou a guerra com ataques aéreos devastadores.
A justificativa dada por Netanyahu foi que o Hamas rejeitou as propostas israelenses nas negociações de cessar-fogo e, além disso, intensificou suas atividades para reagrupar suas forças.

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O acordo assinado na quinta-feira prevê que o Hamas libere todos os reféns israelenses que mantém em cativeiro desde 7 de outubro de 2023 entre segunda e terça-feira.
E este é outro ponto fundamental, porque o Hamas sabe que, ao libertar os reféns, perderá sua influência nas negociações. A organização exigiu garantias de que Israel não retomará os combates após a libertação.
Em declarações feitas nesta quinta-feira, Khalil al Hayya, um membro proeminente do Hamas, disse ter recebido garantias dos EUA e dos outros países mediadores de que “a guerra acabou”.
O que pode fazer a diferença neste caso para que nenhuma das partes rompa o cessar-fogo é o envolvimento pessoal de Donald Trump, que pressionou não só o Hamas, mas também Israel, para que se chegasse a um acordo.
Desta vez, Trump, aparentemente impaciente e irritado com Netanyahu, parece ter usado o poder que só os americanos têm para influenciar Israel, deixando o primeiro-ministro sem outra opção a não ser participar do processo.
Ameaçado por Trump com um “extermínio total”, o Hamas também foi submetido a intensa pressão, e os países árabes e muçulmanos apoiaram o plano do presidente.
O Catar, o Egito e a Turquia participaram ativamente nas negociações e exerceram uma enorme pressão sobre o Hamas, convencendo até mesmo os comandantes mais radicais das suas fileiras de que agora era mais vantajoso libertar os reféns do que mantê-los em cativeiro.
Mantê-los cativos apenas prolongaria uma guerra que os enfraqueceu significativamente em todos os aspectos, embora não tenha destruído seu movimento.
Netanyahu classificou o anúncio como uma “vitória diplomática, nacional e moral para o Estado de Israel”.
É importante destacar que, ao contrário do Hamas, sua declaração não afirmou que o acordo poria fim à guerra.
2. O desarmamento do Hamas
Ainda não há detalhes sobre o desarmamento do Hamas, um ponto importante do plano de Trump.
O Hamas já se recusou anteriormente a depor as armas. Afirmou que só o fará quando for estabelecido um Estado palestino.
O grupo, considerado terrorista pelos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, declarou na época que não abriria mão de seu direito à “resistência e às armas” a menos que fosse estabelecido um “Estado palestino independente e totalmente soberano, com Jerusalém como sua capital”.

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Ao mesmo tempo, o objetivo declarado de Israel durante a guerra tem sido a destruição do Hamas. Netanyahu afirmou repetidamente que não vai parar até acabar com o grupo.
No fim de semana passado, Netanyahu prometeu: “O Hamas será desarmado e Gaza será desmilitarizada, seja por bem ou por mal”.
3. A retirada do exército israelense de Gaza
O alcance da retirada militar de Israel é um ponto controverso.
Essa é uma das principais exigências do Hamas, que pede especificamente a retirada total das forças israelenses de Gaza.
O plano acordado estabelece que o exército israelense se retirará de Gaza “com base em padrões, marcos e prazos” que devem ser acordados por todas as partes.
Um mapa divulgado pela Casa Branca mostrou três etapas propostas para a retirada das tropas israelenses.
A primeira etapa, que foi acordada na quinta-feira, deixa cerca de 53% de Gaza sob controle israelense; a segunda, 40%; e a última, 15%.
Esta etapa final consistiria em um “perímetro de segurança” que “permaneceria até que Gaza estivesse devidamente protegida contra qualquer ressurgimento da ameaça terrorista”.
A redação aqui é vaga e não oferece um prazo claro para a retirada total de Israel, algo que o Hamas provavelmente desejará esclarecer.
4. Quem governará Gaza?
Outro ponto que pode causar tensões é quem governará a zona.
De acordo com o plano, estabelece-se que o Hamas não terá nenhum papel no futuro em Gaza.
A ideia é que Gaza seja governada por um órgão transitório temporário de tecnocratas palestinos, supervisionado por uma “Junta de Paz” liderada e presidida por Donald Trump e da qual participaria o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair.
A governança da Faixa seria transferida em algum momento não definido para a Autoridade Palestina (AP), que governa na Cisjordânia, é reconhecida internacionalmente e é, além disso, o governo rival do Hamas.

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Embora Netanyahu tenha aceitado na íntegra o plano de 20 pontos de Trump, ele pareceu rejeitar a participação da AP mesmo enquanto estava no pódio ao lado do presidente americano na semana passada, insistindo que a AP não teria nenhum papel no governo do território.
Este é um dos muitos pontos do plano que os ultranacionalistas linha-dura dentro da coalizão governante de Netanyahu contestariam, muitos dos quais desejam manter o controle de Gaza e reconstruir os assentamentos judeus lá.
Em sua resposta, o Hamas indicou que espera desempenhar algum papel no futuro em Gaza como parte de “um movimento palestino unificado”. Embora a redação seja vaga, isso provavelmente será inaceitável tanto para Trump quanto para os israelenses.
Em um comunicado, o Hamas afirmou que “renova seu acordo de entregar a administração da Faixa de Gaza a um órgão palestino independente (de tecnocratas), com base no consenso nacional palestino e no apoio árabe e islâmico”.
Netanyahu, por sua vez, reiterou sua oposição à criação de um Estado palestino.
Quem vive na Cisjordânia ocupada enfrenta a incerteza do que este acordo implicará para o seu futuro. E os políticos israelenses já estão planejando as próximas eleições e discutindo as próximas etapas deste acordo para garantir que nunca mais haja outro 7 de outubro.
Por enquanto, é importante lembrar que se trata de um cessar-fogo, não de um acordo de paz. E que ele é sustentado por um delicado equilíbrio que depende do cumprimento do acordo por ambas as partes.
*Com informações de Lyse Doucet, Hugo Bachega e Tom Bennett.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL


