BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O CNJ (Conselho Nacional de Justiça), órgão responsável por fiscalizar o Judiciário, inflou seu quadro de juízes auxiliares nos últimos anos e pagou R$ 3,4 milhões em penduricalhos só nos cinco primeiros meses de 2025.
Os auxiliares são magistrados requisitados de outros tribunais para atuar no CNJ. Os rendimentos pagos pelo conselho a eles se acumulam com os que eles recebem nos órgãos de origem -vencimentos que, às vezes, já excedem sozinhos o teto de remuneração do funcionalismo público federal, de R$ 46.366.
Os R$ 3,4 milhões pagos neste ano pelo CNJ beneficiaram 50 juízes auxiliares que trabalham atualmente ou tiveram alguma passagem pelo órgão em 2025. Os dados foram extraídos do sistema de transparência do conselho.
Em nota, o CNJ afirma que tem “consolidado seu papel constitucional como órgão de coordenação, planejamento estratégico, implementação de políticas judiciárias, além de sua atribuição correcional”, e que tem o menor orçamento do Judiciário.
O número de juízes auxiliares do órgão era de sete no início de 2017 e chegou a 47 no primeiro semestre de 2025, segundo documentos do CNJ. Flutuações nesse quantitativo são comuns. Houve novas alterações nos quadros depois do primeiro semestre de 2025 e atualmente existem 43 desses profissionais no conselho.
No período de 2017 a 2025, o CNJ teve cinco presidentes diferentes: Cármen Lúcia (2016-2018), Dias Toffoli (2018-2020), Luiz Fux (2020-2022), Rosa Weber (2022-2023) e Luís Roberto Barroso (desde 2023). A presidência do conselho é sempre exercida pelo presidente em exercício no STF (Supremo Tribunal Federal).
Os juízes auxiliares são requisitados pela presidência do CNJ ou pela Corregedoria Nacional de Justiça, que também faz parte do conselho, e são alocados em diversas funções. Eles recebem um valor extra caso ganhem do tribunal de origem um salário-base menor que R$ 44.048.
As regras determinam que juízes de fora de Brasília recebam diárias para trabalhar na capital federal. Também há indenizações e outros ganhos eventuais. Esses rendimentos não contam para o teto do funcionalismo.
O maior valor pago pelo CNJ em um único mês a um juiz auxiliar no período foi para Claudia Catafesta, que trabalha na Corregedoria Nacional de Justiça.
Ela recebeu R$ 98.842 do órgão em abril deste ano. Foram R$ 12.721 em diárias e R$ 86.121 em “rendimento líquido”, de acordo com o contracheque disponível no site do conselho.
Desse total, R$ 82.129 constam como “indenizações”. No mesmo mês, Catafesta teve rendimento líquido de R$ 94.446 do Tribunal de Justiça do Paraná, ao qual é vinculada.
O segundo maior rendimento mensal foi do juiz auxiliar Luís Geraldo Sant’ana Lanfredi. Ele recebeu R$ 56.819 do CNJ em janeiro deste ano, sendo R$ 44.768 em diárias e R$ 12.051 em rendimentos líquidos.
O valor das diárias foi mais alto que o normal porque cobriu despesas de uma viagem a Portugal para representar o CNJ. Responsável pelo setor do órgão que fiscaliza o sistema carcerário, Lanfredi participou de uma comitiva para conhecer o modelo português de atendimento a usuários de drogas.
No mesmo mês em que recebeu esses valores do CNJ, ele teve outros R$ 134.358, além de R$ 10.000 em diárias, pagos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
O CNJ não explicou o motivo de esses dois juízes auxiliares terem tido rendimentos dessa dimensão. A reportagem procurou Catafesta e Lanfredi, mas não recebeu resposta.
O conselho mudou as regras para pagar diárias no fim de 2023. Os valores passaram de até 6,5 diárias de R$ 700 por mês para até dez de R$ 1.055 mensais.
Os penduricalhos pagos pelo Judiciário e pelo Ministério Público têm sido tema de debate em meio à discussão de projetos sobre supersalários. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, disse em entrevista à Folha de S.Paulo que é favorável a limitar indenizações, mas com ressalvas.
“Sou a favor de o Congresso dizer quais verbas podem ultrapassar o teto legitimamente e acabar com os penduricalhos que são dados indevidamente”, disse.
O mais recente relatório de auditoria do CNJ, com informações relativas a 2024, aponta falhas na concessão de diárias. O documento analisa um período anterior ao levantamento feito pela reportagem.
A auditoria apontou situações como uma mesma requisição que motivou o pagamento de diárias por trabalhos executados em meses distintos, diárias relativas a feriados e finais de semana sem justificativa e duplicação de pagamento de diárias feito pelo CNJ e pelo tribunal de origem.
O relatório também menciona o “pagamento indevido de diárias a magistrados e conselheiros domiciliados no Distrito Federal”. O documento não diz o nome de quem teria sido beneficiado pela irregularidade.
O CNJ disse em nota que, em 20 anos, fez apenas dois concursos. Também afirmou que as atividades do conselho só são possíveis por causa do reforço de servidores requisitados.
“Como em todos os órgãos públicos, de todos os Poderes, as parcelas de caráter indenizatório não integram o cômputo para fins de observância do teto [de salários] constitucional”, diz a nota.
Sobre diárias, o órgão declarou que, como os cargos são temporários, e os juízes continuam vinculados a seus tribunais, “não se justifica qualquer expectativa de mudança de domicílio definitiva para Brasília”. O conselho afirmou que as diárias pagas indevidamente, apontadas na auditoria, foram devolvidas e que tem aperfeiçoado os controles sobre pagamentos.
Fonte. Noticias ao minuto