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- Author, Joe Inwood*
- Role, Correspondente de notícias internacionais da BBC News
Mas após conversas por telefone com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e aliados da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) na manhã deste sábado (16/8), Trump afirmou que foi decidido por todos que um acordo de paz para colocar um fim definitivo ao conflito deve ser prioridade.
Segundo o republicano, essa seria uma opção melhor do que “um acordo de cessar-fogo que muitas vezes não se mantém”.
Para Matthew Savill, diretor de Ciências Militares do Royal United Services Institute, esta mudança de posição em relação aos objetivos da negociação é mais uma vitória diplomática para os russos.
“Se o objetivo militar de Putin era evitar restrições imediatas às operações russas na Ucrânia, então ele parece ter conseguido”, afirma o analista do think tank de defesa e segurança com sede em Londres.
Mesmo diante dos últimos acontecimentos, as forças militares russas continuam a avançar na Ucrânia. Segundo o Ministério da Defesa de Vladimir Putin, suas tropas tomaram duas aldeias no leste da Ucrânia: Kolodyazi, na região de Donetsk, e Vorone, na região de Dnipropetrovsk.
Desde o início da invasão em larga escala, há três anos, as forças russas expandiram lentamente o território que controlam. Nos últimos meses, elas vêm conquistando avanços incrementais no leste da Ucrânia.
Segundo o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW), o Exército russo avança a uma média de 15 a 16 km² por dia em território ucraniano.
E para Matthew Savill, essas conquistas no leste da Ucrânia devem ser usadas por Moscou para fortalecer sua posição em negociações futuras.

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Segundo o especialista, a Rússia está ganhando tempo.
“Parece improvável que a Rússia esteja preparada para dar passos significativos para trás. E embora o progresso russo em campo seja dolorosamente lento, ela ainda parece estar calculando que pode sobreviver à Ucrânia e seus apoiadores internacionais”, diz.
Nas redes sociais, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky compartilhou uma visão similar. Ele afirmou esperar que a Rússia “aumente a pressão e realize ataques” contra a Ucrânia nos próximos dias para “criar circunstâncias mais favoráveis para negociações com atores globais”.
Segundo Zelensky, a Ucrânia está documentando a movimentação de tropas russas e “contra-atacará, se necessário”.
“A Ucrânia precisa de posições fortes e de uma resistência verdadeiramente tangível ao inimigo”, escreveu ainda.
‘Europa tem decisão difícil a tomar’
Após a ligação com Trump na manhã deste sábado, a Europa deixou bem claro que seu apoio à Ucrânia permanece, em um comunicado assinado por França, Itália, Alemanha, Reino Unido, Finlândia, Polônia e representantes da União Europeia (UE).
Segundo o texto divulgado, “o próximo passo agora deve ser novas conversas, incluindo o presidente Zelensky”.
“Estamos prontos para manter a pressão sobre a Rússia”, afirma o comunicado, acrescentando que “a Ucrânia pode contar com nossa solidariedade inabalável enquanto trabalhamos por uma paz que salvaguarde os interesses vitais de segurança da Ucrânia e da Europa”.
Já Volodymyr Zelensky afirmou ter dito a Trump que as sanções contra a Rússia deveriam ser reforçadas “se não houver uma reunião trilateral ou se a Rússia tentar evitar um fim honesto para a guerra”.
Já a posição dos EUA é menos clara, o que representa um grande desafio para a UE e o Reino Unido, afirma Savill.
“A Europa agora tem uma decisão difícil a tomar sobre o nível de risco que está disposta a correr ao apoiar a Ucrânia”, afirmou o especialista do think tank do Royal United Services Institute.
Segundo Jack Fenwick, correspondente político da BBC, uma fonte do governo britânico afirmou que “se algum cessar-fogo for se tornar um acordo de paz”, ele precisa incluir acordos de segurança, “e o envolvimento dos EUA é uma parte fundamental disso”.
A fonte afirmou à BBC que um “cessar-fogo sem esses acordos é apenas uma oportunidade para Putin ir embora e se rearmar”, acrescentando: “Não se pode acreditar na palavra dele [do presidente russo]”.
O encontro no Alasca
O encontro realizado em Anchorage, no Alasca, terminou sem acordo em relação à guerra na Ucrânia.
Em um pronunciamento conjunto após quase três horas de reunião, Trump disse que os dois lados haviam feito “progresso”, mas que não haviam chegado a um consenso em relação a todos itens que estiveram em pauta durante a conversa.
Sem dar detalhes sobre o que foi discutido, o presidente americano declarou ter considerado o diálogo “extremamente produtivo”, acrescentando que alguns pontos ainda precisavam ser decididos e que avaliava haver uma “chance muito boa” de mais avanço.
O presidente americano também confirmou que se reunirá com Volodymyr Zelensky em Washington na segunda-feira (18/8).

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Putin, por sua vez, usou parte de seu tempo no pronunciamento conjunto para falar sobre o passado do Alasca como território russo.
Passaram-se vários minutos de discurso até que o presidente russo mencionasse o que chamou de “situação na Ucrânia”. Quando o fez, foi para afirmar que, embora um “acordo” não especificado tivesse sido alcançado, as “causas profundas” do conflito precisavam ser eliminadas antes que a paz pudesse ser alcançada.
Desde o início da guerra, a expressão se tornou uma espécie de código para uma série de demandas que, segundo Putin, impedem um cessar-fogo.
Entre as demandas está o reconhecimento da soberania russa sobre as regiões ucranianas da Crimeia, Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhya e Kherson, bem como a concordância da Ucrânia com a desmilitarização, a neutralidade, a não participação militar estrangeira e a realização de novas eleições. As condições equivaleriam a uma rendição inaceitável para Kiev.
Ao fim da declaração conjunta, Putin disse, em inglês: “Da próxima vez em Moscou.”
“Ah, essa é interessante”, respondeu Trump. “Vou ser um pouco criticado por isso, mas eu… eu consigo ver que isso pode acontecer.”
*Com reportagem de Julia Braun, da BBC News Brasil, Jack Fenwick, correspondente político da BBC News, e Laura Gozzi, da BBC News,
Fonte.:BBC NEWS BRASIL