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18 de setembro de 2025

Conheça a história do vinho de comunista – 18/09/2025 – Isabelle Moreira Lima

Conheça a história do vinho de comunista – 18/09/2025 – Isabelle Moreira Lima

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Poderia ser uma partida de War, mas é a história de um grande vinho. Ou melhor, de alguns deles. Quando a cortina de ferro caiu, a mítica vinícola espanhola Tempos Vega Sicilia, possivelmente a mais célebre da Espanha, adquiriu o vinhedo mais nobre da região de Tokaj, no nordeste da Hungria. A Oremus, braço húngaro da Vega Sicilia, foi fundada em 1993.

Apaixonado por vinhos doces, Pablo Alvarez, que comanda a espanhola há mais de 30 anos, queria fazer o melhor Tokaji (o vinho se escreve com o i final, diferentemente da região) possível, mas do seu jeito: a uva teria que se mostrar acima de qualquer outra coisa. Nisso, acabou por mudar o perfil do vinho do país, antes conhecido pelo caráter oxidativo. O “Tokaji comunista”, que era trocado em massa por sapatos, aço e diversos produtos vindos de outros países do bloco, tinha notas amendoadas. Os da Oremus trazem mel, flores, maçã, damasco e figo seco.

De forma geral, os vinhos de Tokaj podem ser feitos em três estilos, sendo o mais famoso justamente o doce, chamado Aszú e produzido a partir de uvas afetadas pelo fungo Botrytis cinerea —resumidamente, ele concentra o açúcar da fruta—, como depois também Sauternes, na França, passou a fazer. Já as cepas são as autóctones húngaras furmint, hárslevelu, zéta e sárgamuskotály. No passado, os Aszú podiam ser também fortificados, ou seja, podia ser adicionada a aguardente vínica durante a fermentação, o que os deixava mais doces e mais alcoólicos.

Muito único e valioso, esse néctar ultradoce era usado até como arma diplomática e, quando não deu certo, ajudou a financiar levantes, como no caso da independência da Hungria no século 18. Era também o vinho dos czares e, até bem poucos anos atrás, a Rússia se mantinha como principal cliente de muitos produtores. Acontece que a guerra entre o país e a Ucrânia tem afetado o mercado, e a Hungria vê o consumo dos Aszú cair de forma consistente nos últimos anos.

Seria um problema para as vinícolas se, por outro lado, não estivesse em alta a popularidade da principal uva de Tokaj, a furmint, não afetada pela Botrytis. Os varietais secos feitos com essa casta são muito vivos, leves, frescos e minerais —tudo o que o consumidor quer hoje. Como a Hungria é muito fria, vinhedos no norte do país são hoje tidos como uma promessa de acidez num futuro mais quente.

Em visita a São Paulo, o enólogo do Tokaji Oremus, Robert Kindl, contou essa história e revelou que a vinícola tem vinhedos na região mais fria. Num jantar-degustação promovido por sua importadora aqui, a Mistral, além de bons Aszú de mais de 30 anos, mostrou dois brancos secos, o Oremus Mandolás, que é extremamente elétrico, com notas cítricas vibrantes, e que já era vendido no Brasil; e o Tokaji Furmint Petracs 2020, a novidade.

Este último é mais polido e cremoso, muito mineral, tem mais potencial de guarda (não mostrava seus cinco anos e pode envelhecer mais dez), tem mais de corpo que o Mandolás e virou alvo de uma pegadinha do comandante do grupo Vega Sicilia, Alvarez: ele tem organizado degustações às cegas em que põe, lado a lado, seu Tokaji Petracs e crus muito valorizados da Borgonha. Quem prova, conta Kindl, fica completamente perdido.

Vai uma taça?

Além dos festejados vinhos Oremus, encontram-se outros furmint interessantes no país. Pirei no Sauska Dry Furmint 2022 (R$ 243 na Berkmann), que é ótimo com comida, excelente com pratos em que os vegetais são os protagonistas. Fresco e com ótima textura, o Château Pajzos Furmint Dry “T” (R$ 119 na World Wine) traz nota de damasco e de manga verde.


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Fonte.:Folha de São Paulo

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