O que faz uma região tradicional como o Douro, conhecida por seus vinhos concentrados e potentes, num momento em que o mundo quer beber vinhos mais leves, pouco extraídos, com muita acidez? Duas vinícolas centenárias têm se movimentado rápido, ainda que por diferentes caminhos.

Fundada há 300 anos, a Quinta do Vallado tem seguido a ideia de diversidade, com opções de vinhos frescos e mais leves que o concentrado tradicional do Douro. Maior exemplo disso é a aposta na baga, casta que batiza o vinho Lady Baga, em homenagem à cantora, compositora e atriz norte-americana Lady Gaga, de quem João Ferreira Álvares Ribeiro, produtor do Vallado, é fã.

Quem conta a história é o filho João Roquette Álvares Ribeiro, a cara mais jovem da vinícola, que apresentou seus novos lançamentos de olho na mudança de paladar mundial.

É curioso: por mais que o Douro seja a região demarcada mais antiga, sua história nos vinhos tranquilos (não fortificados, que não sejam Porto), é relativamente nova. Vem dos anos 1990, e muito calcada nos tintos bem concentrados que coincidentemente (ou não) eram a regra na era Parker. “Produzimos vinho tranquilo há menos tempo que no Brasil”, disse em almoço promovido pela importadora Grand Cru, que vende seus rótulos no país.

Além da baga, casta célebre na Bairrada, o produtor duriense apresentou uma sousão, que de tão ácida dava a sensação estranha mas agradável de grudar nos dentes. Mostrou ainda uma alicante bouschet (uva famosa no Alentejo) com a concentração já mais comum à região e um vinhas velhas, o Vinha da Granja, bem elegante. Adiantou que há planos de criar muito mais brancos: estão agora na primeira safra de uma alvarinho que o deixou muito feliz e que, no ano que vem, deve chegar ao Brasil; e planejam outros mais, como um vinhas velhas inspirado no Redoma Reserva Branco, bebida complexa e deliciosa feita pela Niepoort.

Já a Quinta Nova Nossa Senhora do Carmo, comandada por Luisa Amorim e cujos vinhos estão no Brasil pela World Wine, tem explorado diferentes vinificações para suas uvas tintas: fazendo blanc de noir (um branco de tintas por meio de uma prensagem rápida, que é mais comum em espumantes, mas não em tranquilos) e investindo até em vinhos rosados de guarda, com uvas de parcelas melhores e envelhecimento em madeira, que os torna mais estruturado.

Nenhum dos dois exemplos é muito comum no mercado, mas é uma resposta rápida de Amorim, uma águia para os negócios. Afinal, não dá para sair arrancando tudo e replantando se, de repente, o mundo quer beber mais brancos e rosados.

Luisa é, aliás, uma das interlocutoras mais francas sobre os “bodes na sala” do vinho. O mundo todo está bebendo menos? Bem, tem-se que fazer vinhos melhores e apostar no enoturismo. Isso ela faz muito bem: sua Quinta Nova faz parte da rede de hotéis de luxo Relais Châteaux e oferece um tipo de quiet luxury de época, com muita atenção aos detalhes.

Outro bode que Luisa Amorim enfrenta bem é o clichê de que vinho bom se faz nos vinhedos. Como bancar essa máxima num tempo de aquecimento global, quando o clima é imprevisível, e pode surpreender com granizo, tempestade, incêndios? Bem, é preciso também ter atenção à enologia, e é por isso que ela vem reformando suas adegas (além do Douro, tem vinícolas no Dão e no Alentejo) e estudando outros jeitos de fazer bons vinhos.

O Douro é antigo, mas não está parado: está de olho no mercado, em seus problemas e nas figuras que podem ser boas aliadas. Falando nisso, e a Lady Gaga, gosta de vinho? Já provou o tal baga? Até o fechamento desta edição não, mas durante o almoço com Ribeiro filho, o pai mandou um WhatsApp em que perguntava: consegue comprar para mim um ingresso para o show de Roma?

Anote na agenda

Para os amantes de vinho alemão, entre terça (14) e domingo (19), a importadora Weinkeller realiza a Semana do Vinho Alemão, com programação que inclui almoço e jantar harmonizado (D.O.M. e Corrutela), uma masterclass sobre riesling e duas feiras com rótulos consagrados e inéditos. Informações no tel e WhatsApp (11) 95916-0943 e no Instagram @weinkeller_vinhos.

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