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4 de setembro de 2025

Crise climática tornou 40 vezes mais provável a condição para o incêndio florestal recorde em Espanha e Portugal – 04/09/2025 – Ambiente

Crise climática tornou 40 vezes mais provável a condição para o incêndio florestal recorde em Espanha e Portugal – 04/09/2025 – Ambiente

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Mais de um milhão de hectares já foram queimados neste verão europeu, marca inédita desde que as medições começaram em 2006. Espanha e Portugal registraram dois terços do estrago. As condições críticas de temperatura, umidade e vento, que favoreceram o fenômeno, são esperadas uma vez a cada 15 anos. Sem o aquecimento global provocado pela atividade humana, a frequência seria de uma vez a cada 500 anos.

Novo estudo rápido divulgado pelo WWA (World Weather Attribution), painel de cientistas que investiga a responsabilidade da crise climática em eventos extremos, mostra que as condições para incêndios florestais como os que assolaram a Península Ibérica nos últimos meses se tornaram 40 vezes mais prováveis com a crise climática.

Temperaturas tão quentes como as verificadas em agosto teriam sido extremamente improváveis em um clima pré-industrial”, afirma Theodore Keeping, pesquisador do Imperial College, de Londres, que lidera o consórcio de especialistas reunidos pelo WWA. “Estimamos que essas temperaturas são agora cerca de 200 vezes mais prováveis de ocorrer do que teriam sido em um clima global 1,3°C mais frio.”

Em apenas uma semana, 175 mil hectares queimaram na Espanha, mais do que o dobro da média anual. No total, 380 mil hectares foram devastados pelo fogo, ou 0,75% da área do país. Em Portugal, a proporção foi de 3%, equivalente a 260 mil hectares. Oito pessoas morreram em consequência dos incêndios, dezenas de milhares foram evacuados.

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, propôs um mutirão nacional contra as mudanças climáticas e a mobilização dos países do sul europeu na adaptação e prevenção a incêndios florestais. “Vamos propor aos governos português e francês um pacto de Estados e defender, junto à União Europeia, que nossa única opção é permanecer na transição ecológica”, declarou o premiê nesta semana.

Sánchez, uma dos raros líderes de esquerda da Europa atual, fazia uma clara referência a iniciativas liberalizantes de uma Bruxelas pressionada pela ascensão de populistas e da extrema direita no continente. O risco percebido é o comprometimento da rígida regulação ambiental do continente. O cenário é ainda pior no front doméstico, em que Sánchez enfrenta denúncias de corrupção e uma oposição feroz em maioria no Parlamento.

Ainda assim, o mandatário espanhol anunciou medidas que vão além do reforço de brigadas de incêndio. Propôs a reformulação da infraestrutura hídrica, controle da expansão imobiliária em áreas propensas a inundações ou incêndios e alterações na legislação trabalhista para prevenir doenças ocupacionais durante as ondas de calor.

Sánchez segue o manual dos ambientalistas, que pregam não apenas a prevenção, como também a adaptação. É o caminho que resta diante de uma crise climática que só piora. “Os incêndios já são extremos hoje com 1,3° C de aquecimento global, mas já estamos a caminho de 2,6° C a 3°C neste século”, recorda Keeping.

“Mudanças demográficas, despovoamento rural e envelhecimento das comunidades deixaram grandes áreas de terra menos gerenciadas“, afirma Maja Vahlberg, do Centro Climático da Cruz Vermelha/Crescente Vermelho. “A vegetação combustível se acumula à medida que as pessoas se mudam para centros urbanos, a agricultura tradicional e o pastoreio diminuem e o controle natural da vegetação se reduz. Terras que antes eram habitadas e trabalhadas tornam-se, dessa forma, mais inflamáveis.”

Restaurar práticas de agricultura e manejo, vegetação original, florestas e cursos de água é a recomendação de especialistas. Vahlberg cita uma série de iniciativas locais na Espanha que já fazem esse tipo de trabalho. “A adaptação não é apenas técnica, é também social e econômica, fundamentada na relação das pessoas com a terra. Responder aos incêndios sempre será essencial, mas preveni-los antes que se iniciem é o que realmente salva vidas, meios de subsistência e paisagens”, diz.

Cofundadora do WWA e professora de Ciência do Clima do Imperial College, Friederike Otto pondera que, ainda assim, a adaptação não será suficiente se os países não pararem de queimar combustíveis fósseis, principal causa do aquecimento global. “A adaptação não está acompanhando o aumento das emissões; e as condições climáticas estão piorando.”



Fonte.:Folha de S.Paulo

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