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6 de julho de 2025

Democratas replicam estratégia republicana contra Trump – 02/07/2025 – Mundo

Democratas replicam estratégia republicana contra Trump – 02/07/2025 – Mundo

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Ao relembrar a derrota de Kamala Harris nas últimas eleições, o que continua incomodando Andrei Cherny, ex-redator de discursos do Partido Democrata e ex-líder do partido no Arizona, é o fato de que ele não sabia o que a ex-vice faria caso fosse eleita presidente.

Na visão dele, o presidente Donald Trump concorreu com base em suas próprias ideias, enquanto Kamala concorreu apenas contra as de Trump. “O ditado mais antigo na política é que você não pode derrotar algo com nada”, disse Cherny.

Agora, Cherny, cofundador de um jornal progressista de políticas públicas com quase duas décadas de existência, está organizando um grupo de pensadores democratas para recriar o que os aliados de Trump fizeram quando ele foi derrotado: elaborar uma agenda pronta para o próximo candidato democrata à Presidência.

Eles estão chamando a iniciativa de Projeto 2029.

O título é uma alusão nada sutil ao Projeto 2025, a agenda conservadora produzida de forma independente, da qual Trump tentou se distanciar durante grande parte da campanha do ano passado — mas que, nos primeiros meses de volta ao poder, passou a implementar.

O fato de os democratas terem usado o Projeto 2025 como uma arma contra Trump durante a campanha não impediu Cherny e seus colegas de adotarem a mesma tática. Eles planejam lançar uma nova agenda ao longo dos próximos dois anos, em edições trimestrais, por meio da publicação de Cherny, “Democracy: A Journal of Ideas”.

O objetivo é transformar o conteúdo em um livro —assim como o Projeto 2025— e reunir os principais candidatos presidenciais democratas em torno dessas ideias durante as primárias de 2028.

A iniciativa atinge o cerne de um debate acalorado que consome legisladores, estrategistas e formuladores de políticas democratas: se a raiz dos problemas do partido está em suas ideias ou na dificuldade em persuadir as pessoas a abraçá-las.

O sucesso surpreendente do deputado estadual Zohran Mamdani, um socialista democrático, nas primárias para a Prefeitura de Nova York, apenas acirrou esse debate. Ele venceu por causa da ousadia de suas propostas —”congelar o aluguel”, “ônibus grátis”, “creches gratuitas”— ou pela clareza e simplicidade das mensagens? Teria funcionado se ele não fosse tão carismático e habilidoso nas redes sociais?

Muitos estrategistas veem o problema do partido mais como uma questão de forma do que de conteúdo, argumentando que os democratas precisam comunicar melhor seus planos aos eleitores, em vez de criar novas propostas.

“Não faltaram políticas”, disse Celinda Lake, uma das principais pesquisadoras eleitorais do partido. “Faltou uma narrativa funcional para comunicar essas políticas.”

Lake criticou o fato de os democratas apresentarem aos eleitores “agências, siglas e estatísticas”, em vez de uma história clara sobre “pelo que vamos lutar”. Uma política inovadora de reembolso tributário, por exemplo, não conquistaria por si só os votos no Colégio Eleitoral.

Outros acreditam que o partido está perdendo terreno nacionalmente porque suas ideias são ultrapassadas, pouco inspiradoras e desconectadas das demandas atuais dos eleitores.

Neera Tanden, que atuou na Casa Branca nos governos Bill Clinton, Barack Obama e Joe Biden e hoje lidera o Center for American Progress, um think tank com laços estreitos com o establishment do partido, disse que os democratas não conseguiram apreciar o papel que as políticas de Trump desempenharam.

“Os progressistas subestimam o poder das ideias de Trump e o fato de que precisamos de ideias melhores para enfrentar tanto o trumpismo quanto o Partido Republicano”, disse ela. “Ficamos obcecados com a personalidade dele. Mas ele apresenta ideias como: ‘Sem imposto sobre gorjetas’, e isso sinaliza que ele está do lado da classe trabalhadora.”

Tanden faz parte de um conselho consultivo robusto do Projeto 2029 que inclui Jake Sullivan, ex-assessor de segurança nacional do presidente Joe Biden; Anne-Marie Slaughter, ex-presidente da New America Foundation; o economista Justin Wolfers; Felicia Wong, até recentemente presidente do Roosevelt Institute, de viés progressista; e Jim Kessler, fundador do grupo Third Way.

Cherny, agora presidente do Democracy Journal, que ajudou a fundar, descreveu o grupo como “os Vingadores da política pública, ou a Liga da Justiça, dependendo da sua preferência pessoal: os melhores pensadores do espectro democrático”. O grupo pretende realizar conferências públicas para debater suas diferenças sobre temas como economia, segurança nacional, reforma governamental e educação.

Alguns aliados em potencial, no entanto, são céticos de que um grupo tão ideologicamente diverso consiga formular uma agenda coerente.

“Desenvolver políticas tentando agradar todas as alas da coalizão foi exatamente o que nos colocou nesse problema”, disse Adam Jentleson, que está prestes a lançar um novo centro de pesquisa chamado Searchlight. “Não dá para propor as políticas que o Partido Democrata precisa adotar sem irritar algum grupo de interesse. E se você tem medo de fazer isso, então não está preparado para guiar o partido na direção certa.”

O pouco conhecido periódico Democracy já teve impacto significativo em administrações democratas. Seis membros do primeiro escalão do governo Biden publicaram ensaios na revista. Anos antes de chegar ao Senado, Elizabeth Warren descreveu ali seus planos para o que se tornaria o Escritório de Proteção Financeira ao Consumidor.

Agora, uma batalha intensa está em curso entre intelectuais democratas sobre como redefinir o partido para o futuro.

Uma das divisões mais visíveis é entre a ala populista, que quer apresentar bilionários e grandes corporações como vilões (como na turnê “Lutando contra a Oligarquia”, liderada por Bernie Sanders), e os defensores da chamada agenda da abundância, título do livro de Ezra Klein, colunista do The New York Times, e Derek Thompson, que recentemente deixou o The Atlantic.

Os apoiadores da agenda da abundância querem colaborar com empresas —”não haverá transição verde sem a engenhosidade corporativa”, escreveu Klein— e cortar regulamentações para resolver problemas e alcançar resultados progressistas mais rapidamente. O sucesso de longo prazo do partido, segundo essa visão, depende de provar que o liberalismo funciona.

Já a ala populista, em sua forma mais simples, busca redistribuir poder e riqueza para a classe trabalhadora e longe das elites econômicas e corporativas, mobilizando os eleitores com base nessa luta.

Nick Gourevitch, pesquisador democrata, disse que as políticas são importantes, mas também o contexto em que são apresentadas aos eleitores.

Segundo ele, é essencial que os democratas digam aos eleitores que o sistema atual está falido —e não apenas apresentar propostas.

Ao afirmar que o sistema tributário é manipulado para favorecer os ricos, as propostas democratas para fazer com que empresas e milionários “paguem sua parte justa” se tornaram nove pontos percentuais mais populares, segundo uma pesquisa recente que Gourevitch ajudou a conduzir.

Alguns estrategistas democratas, em conversas privadas, expressaram preocupação com a decisão de batizar o Projeto 2029 em referência a um documento que os democratas atacaram em 2024.

As campanhas de Biden e Kamala transformaram o Projeto 2025 em um dos grandes vilões da eleição, tentando associar Trump às suas propostas mais radicais, como reestruturar o governo federal, restringir direitos reprodutivos e climáticos e reduzir drasticamente a imigração.

Uma pesquisa do New York Times com o Siena College, em setembro, mostrou que apenas 15% dos prováveis eleitores apoiavam as propostas do Projeto 2025, enquanto 63% eram contra. Um levantamento da NBC News indicou que o Projeto 2025 era menos popular do que o socialismo.

Trump repudiou diversas vezes o plano de políticas, que foi liderado pela Heritage Foundation, embora tenha sido redigido por vários de seus aliados e ele tenha concordado com muitos de seus pontos específicos. Russell Vought, um dos principais autores do Projeto 2025, atualmente chefia o Escritório de Orçamento da Casa Branca.

Michael Tomasky, editor da The New Republic e também do Democracy Journal, afirmou que a toxicidade política do Projeto 2025 não significa que o Projeto 2029 “está fadado a ser impopular”.

“Nossas ideias não são radicais nem extremistas”, afirmou. Em vez disso, ele espera renovar a imagem do Partido Democrata entre as classes populares.

“O progressismo não tem feito um bom trabalho em se conectar com a classe trabalhadora”, disse. “Queremos que o que estamos propondo ajude a moldar a conversa nas primárias.”



Fonte.:Folha de S.Paulo

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