De olho no crescimento da população evangélica no Brasil e na relevância desse segmento nas últimas disputas eleitorais, o Partido dos Trabalhadores (PT) já começou a preparar sua militância para atrair eleitores evangélicos nas eleições de 2026.
Desde o final de maio está em andamento o curso a distância “Fé e Democracia”, direcionado a dirigentes, militantes, lideranças sociais e evangélicas do partido. O objetivo da Fundação Perseu Abramo (FPA), braço de estudos do PT e responsável pela formação, é “qualificar a militância para uma interlocução respeitosa e eficaz com a comunidade evangélica”, diz o pastor Luís Sabanay, supervisor geral do curso.
Os nomes que o partido escalou para serem os preletores do curso integram uma minoria progressista entre as lideranças evangélicas, alguns deles envolvidos em polêmicas devido à militância política exacerbada dentro das igrejas ou por comentários e condutas que não costumam ser bem aceitos no meio religioso. Veja a seguir alguns dos principais preletores:
Angelica Tostes: teóloga devota de Krishna, divindade hindu
A primeira aula do curso, que aconteceu no final de maio, contou com a presença de Angelica Tostes, que se intitula uma “teóloga feminista” e defende que a Bíblia é “o livro da classe trabalhadora”.
Em textos de opinião publicados em portais de esquerda, Angelica costuma mirar em críticas às igrejas evangélicas tradicionais pelo “fundamentalismo religioso”. A teóloga, criada em uma igreja pentecostal na zona leste de São Paulo, não segue necessariamente o modelo de fé evangélica. Nas redes sociais ela mistura versículos bíblicos com publicações em defesa do marxismo, do feminismo e da liberdade sexual.
Também constam em seus perfis expressões controversas, como “Deusa seja louvada” – já que no cristianismo não há divindade feminina – e uma montagem de Maria, a mãe de Jesus, com o corpo transformado em um órgão genital feminino, com a legenda “Rogai por nós”.
Ela também não esconde seu apreço ao hinduísmo e costuma publicar fotos de um altar dedicado a Krishna, uma das divindades centrais da tradição hindu. “Só devoção e amor”, diz o texto que acompanha uma das fotos, que mostra a escultura de Krishna ao lado de velas e oferendas.
Valdinei Ferreira: demitido de faculdade presbiteriana após sugerir que Jesus teria traído Judas
O teólogo e sociólogo Valdinei Ferreira, que escreve colunas sobre assuntos relacionados à fé no jornal Folha de S. Paulo, foi demitido do cargo de professor da Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente (Fatipi) em abril deste ano. O motivo foi a repercussão negativa de um artigo publicado às vésperas da Páscoa em que Ferreira sugere que Jesus teria enganado Judas, e que os cristãos deveriam reconhecer que são capazes de “equívocos em suas interpretações sobre Jesus”.
No texto, o teólogo – conhecido por uma visão alinhada à esquerda política e por críticas ao conservadorismo cristão – argumentou que é preciso ter cautela com “certezas religiosas absolutas sobre o bem e o mal” e que “Judas tinha certezas demais sobre quem era Jesus”. Nas redes sociais houve forte repercussão crítica ao texto, o que pressionou a faculdade a romper o contrato com o Ferreira.
Luis Sabanay: pastor “socialista” que articulou a Cartilha Evangélica do PT
Figura chave na interlocução entre o PT e o segmento evangélico, Luis Sabanay se intitula um “pastor socialista”. Supervisor do curso “Fé e Democracia”, é um dos principais defensores da aproximação do partido de Lula ao eleitorado evangélico.
“Os segmentos religiosos, em especial os evangélicos, se tornaram alvo da disputa política, muito mais precisamente na eleição de Bolsonaro em 2018. E, como é um público em disputa, também se tornou alvo dos debates de nossa estratégica política”, disse Sabanay em entrevista ao Café PT.
Em 2024, nas eleições municipais, ele foi um dos autores da “Cartilha Evangélica Diálogo nas Eleições”, que orientava candidatos petistas não acostumados a dialogar com religiosos a evitar deslizes e conquistar votos.

Sérgio Dusilek, o pastor que disse que a igreja evangélica deveria pedir perdão a Lula
Toda a estrutura pedagógica do curso do PT sobre evangélicos foi desenvolvida pelo pastor Sérgio Dusilek. Ele ficou famoso por envolver-se ativamente na campanha de Lula em 2022, chegando a dizer, em um comício, que a igreja evangélica deveria pedir perdão ao petista.
“O melhor tempo para a igreja brasileira que essa terra já viu foi no tempo de seu governo. A Igreja Evangélica tem que pedir perdão ao senhor”, afirmou ele ao lado de Lula.
Na época, Dusilek ocupava o cargo de presidente da Convenção Batista Carioca. O apoio explícito à campanha de Lula não foi bem recebido, e várias lideranças religiosas e convenções batistas estaduais repudiaram a conduta do pastor, que acabou renunciando ao cargo que ocupava dias depois da polêmica.
Fiel ao partido, ocupou cargos de liderança em secretarias do Ministério da Pesca e Aquicultura ao longo de todos os mandatos petistas – de Lula (2003 a 2010) e de Dilma Rousseff (2011 a 2016).
Ariovaldo Ramos, que lê a Bíblia a partir da ótica marxista
Um dos motes do curso do PT sobre evangélicos é acusar a “extrema-direita” de cooptar igrejas para fins políticos. No entanto, muitos dos preletores costumar recorrer com frequência ao uso político da religião. Um deles é o pastor Ariovaldo Ramos, fundador da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, uma entidade pró-Lula dedicada à militância política.
Em sua participação na primeira aula do curso, Ariovaldo fez uma defesa da Bíblia como um instrumento político compatível com o pensamento socialista. “Os princípios do Reino demandam um governo que trabalha em prol do futuro do trabalhador. A gente vê, por exemplo, em Atos [livro do Novo Testamento], que a igreja criou uma seguridade social para a viúva. E, como disse o apóstolo Paulo, quem colheu demais não tem sobrando, para que quem colheu de menos não sinta falta”, diz Ariovaldo.
Em sua lógica, é possível encontrar um ponto de confluência da Bíblia com a “utopia marxista, que é o fim das classes e quando os meios de produção pertencem ao trabalhador”. Aliado de longa data de Lula, Ariovaldo participou da interlocução com evangélicos na campanha do petista em 2022.
Oliver Goiano, candidato que recorreu à Bíblia para pedir votos
Coordenador nacional do Núcleo Evangélico do PT, o pastor Oliver Costa Goiano é responsável por articular estratégias políticas envolvendo lideranças evangélicas, inclusive propondo candidaturas petistas entre pastores. Ele próprio já foi candidato a vereador de Maricá-RJ pelo partido em 2024, mas registrou apenas 150 votos e não foi eleito.
Oliver é servidor comissionado da Prefeitura Municipal de Maricá, que desde 2009 é administrada por gestões petistas. Atualmente é coordenador de Religião na Secretaria de Direitos Humanos do município.
Ele também costuma criticar o uso político da religião pela “extrema-direita”. No entanto, ao pedir votos nas eleições de 2024 recorreu diversas vezes à linguagem religiosa e à condição de pastor. Em um ato da sua campanha dias antes do primeiro turno das eleições, Oliver citou a Bíblia várias vezes e chegou a dizer que Deus daria a vitória “para que honremos o nome dele”.
“Na dúvida, faça como os reis magos: siga a estrela”, disse, fazendo menção ao símbolo do PT.
Fonte. Gazeta do Povo