Muitas vezes, comprimidos e cirurgias não dão conta, sozinhos, de aplacar a dor de uma doença. É aí que entra a arte. Após lidar com cólicas e sangramentos intensos por 13 anos, a artista visual e fotógrafa Marcella Benita recebeu o diagnóstico de endometriose e transformou o que a afligia em obras que agora podem ajudar outras mulheres a ressignificarem a experiência.
“Descobrir o que eu tinha mudou tudo”, afirma a artista paulistana de 28 anos. “A dor que antes era diminuída se tornou o mote para a minha exposição individual, ‘Visível agora‘, e acabou se desdobrando na Casa-Corpo, uma iniciativa ainda maior com artistas mulheres que retratam temas relacionados ao corpo feminino.”
O projeto “Casa-Corpo” está aberto ao público em uma galeria no Itaim Bibi, zona sul de São Paulo, até 6 de setembro.
A iniciativa reúne duas exposições: “Visível Agora“, uma mostra individual de Benita a respeito de sua vivência com a endometriose, e “O Que Pode Sentir um Corpo“, que exibe obras de outras nove artistas brasileiras e estrangeiras sobre questões relacionadas ao corpo e à saúde feminina. A entrada é livre e gratuita, e interessados também podem adquirir as obras em exibição.
O projeto também conta com uma agenda de atividades que inclui palestras com especialistas, práticas de yoga e autocuidado, oficinas e sarau literário — estas precisam de inscrição prévia e algumas são pagas. Confira a programação completa no site do Sympla.
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Visível Agora
Na exposição individual, Benita trabalha com fotografias, laudos, tecidos e bordados para retratar sua jornada como paciente e misturar aspectos íntimos e sensíveis da vivência feminina.
“É uma forma pessoal, subjetiva e artística de ver a endometriose”, avalia. “Eu diria que são os bordados que conectam as obras. Os nós e as manchas remetem ao sofrimento da doença, enquanto as rendas e o jeans, por exemplo, são tecidos que estão no nosso dia a dia, no nosso guarda-roupa, e são símbolos de feminilidade.”
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Na obra Calendário, a artista representa todos os dias em que passou menstruada no mês de julho de 2023. Em caixas de acrílico, um fio vermelho borda palavras ligadas ao feminino que se contrastam com como as mulheres são encaradas pela sociedade — em letras brancas, logo abaixo.
“Uma mulher em posição de poder pode ser vista como ameaça; a delicadeza, como fragilidade; e a confiança, como prepotência“, exemplifica Benita.
Outra obra, Questão de Tempo, traz relatos da artista bordados em diferentes tecidos para retratar a piora dos sintomas aos longo dos anos. “São frases e momentos pelos quais passei desde que as dores começaram até o ano em que eu fiz o tratamento cirúrgico, quando descobri que a endometriose estava no nível mais avançado”, relembra Benita.
É um trabalho que desperta empatia para além da CID, a Classificação Internacional de Doenças. “É um movimento de trazer o íntimo para o coletivo, para compartilhar com outras pessoas que sentem coisas parecidas”, reflete Thaís Bambozzi, diretora artística da Casa-Corpo e curadora das exposições. “Até quem não tem diagnóstico pode se identificar com as obras.”
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O Que Pode Sentir um Corpo
A exposição coletiva conta com trabalhos de Benita e outras nove artistas que trabalham questões relacionadas ao corpo e ao feminino em suas obras.
“O corpo e a saúde é um tema que transpassa a pesquisa de todas essas artistas e a gente quis trazer uma multiplicidade de linguagens: têxtil, cerâmica, pintura, colagem, desenho”, lista Bambozzi.
Entre elas estão Alix Spell, que traz quatro pinturas a óleo, inclusive a Fraturas e Próteses, que inspirou a capa de um livro homônimo; Luiza Barbieri, que transformou sua experiência com congelamento de óvulos em obras de arte; Mari Sperandio, que utiliza maquiagem e tecido hospitalar para compor seus projetos; e Fernanda Corsini, que revela a natureza no corpo feminino.
Também expõem na Casa-Corpo a artista coreana Patrícia Biak, com obras que fazem refletir sobre as várias possibilidades de gênero, para além da binariedade; Tuca Chicalé Galvan, com obras suspensas em lã; Marina Schroeder, com desenhos sobre atravessamentos e desabrochares; Larissa Camnev, que traz na arte com tecidos a sua ancestralidade; e Camila Alcântara, trabalhando com colagens, bordados e cerâmica.
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Espaço de acolhimento
No Brasil, estima-se que 7 milhões de mulheres convivam com endometriose. “É uma doença silenciosa e muito solitária, mas, se as pessoas começarem a falar mais sobre isso, outras mulheres podem se sentir mais acolhidas”, torce Benita.
Para dar voz às pacientes, a mostra conta com uma sala de depoimentos de 40 mulheres que foram ouvidas a respeito de suas vivências com a doença e também convida as visitantes a escrever suas próprias impressões e histórias.
Serviço
Casa-Corpo
Endereço: Rua Pedroso Alvarenga, 678, Itaim Bibi – São Paulo, SP
Dias e horários: de terça a sexta-feira, das 12h às 19h30. Aos finais de semana, das 10h às 17h.
Até 6 de setembro.
Visitação gratuita.

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Fonte.:Saúde Abril