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- Author, Pallab Ghosh
- Role, Correspondente de ciência, BBC News
Escondidas em um laboratório no noroeste de Londres, três mãos robóticas de metal preto se movem lentamente sobre uma bancada de engenharia.
Nada de garras ou pinças — cada uma tem quatro dedos e um polegar, articulados de forma quase humana.
“Não estamos tentando criar um Exterminador do Futuro”, brinca Rich Walker, diretor da empresa que as desenvolveu.
De aparência mais hippie do que o estereótipo de um engenheiro, Walker se orgulha de mostrar o que considera um passo importante na robótica.
“Queríamos construir um robô que ajude as pessoas, que torne a vida melhor — um assistente capaz de fazer qualquer tarefa doméstica, de varrer o chão a preparar uma refeição.”
Mas a ambição vai além das tarefas cotidianas: pesquisadores e empresas apostam que robôs desse tipo podem ajudar a enfrentar uma das maiores questões do futuro — como cuidar de uma população cada vez mais idosa, com menos profissionais disponíveis para prestar assistência.
No Reino Unido, essa discussão vem ganhando força diante do envelhecimento rápido da população, mas o debate é global.

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A aposta em robôs de cuidado cresce em vários países, com governos e empresas investindo em tecnologias capazes de oferecer apoio físico, companhia e monitoramento a pessoas que vivem sozinhas ou têm limitações de mobilidade.
No Reino Unido, isso vem sendo visto como uma possível resposta à escassez de cuidadores e ao envelhecimento acelerado da população — desafios que também se repetem em boa parte do mundo desenvolvido.
A promessa é tentadora: máquinas que aliviam a sobrecarga dos sistemas de saúde e oferecem mais autonomia aos idosos.
Mas também levanta dilemas éticos e emocionais: será que queremos — e podemos confiar — que uma máquina cuide de nós quando estivermos mais vulneráveis?
O Japão oferece um vislumbre de um futuro em que robôs convivem entre nós.
Há dez anos, o governo japonês começou a oferecer subsídios a fabricantes de robôs para desenvolver e popularizar o uso dessas máquinas em casas de repouso — uma iniciativa impulsionada pelo envelhecimento da população e pela escassez relativa de profissionais de cuidado.
O professor James Wright, especialista em inteligência artificial e pesquisador visitante da Queen Mary University, em Londres, passou sete meses observando esse fenômeno — em especial, como esses robôs funcionavam no ambiente de uma casa de repouso japonesa.
Ao todo, três tipos de robôs foram estudados. O primeiro, chamado **HUG**, foi desenvolvido pela Fuji Corporation, no Japão, e se parecia com um andador altamente sofisticado.
Ele tinha apoios acolchoados que permitiam às pessoas se inclinar com segurança, ajudando cuidadores a transferi-las da cama para uma cadeira de rodas ou para o banheiro, por exemplo.

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O segundo robô, por sua vez, parecia uma pequena foca e se chamava Paro. Criado para estimular pacientes com demência, ele foi programado para responder a carinhos com movimentos e sons.
O terceiro era um pequeno robô humanoide de aparência simpática chamado Pepper. Ele podia dar instruções e demonstrar exercícios movendo os braços — e chegou a conduzir aulas de ginástica na casa de repouso.
Antes mesmo de começar suas observações, o professor Wright já havia se deixado levar um pouco pelo entusiasmo em torno dessas tecnologias.
“Eu esperava que os robôs fossem facilmente adotados pelos cuidadores, que estão sobrecarregados e extremamente atarefados”, contou.
“O que encontrei foi quase o oposto.”

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Ele descobriu que, na verdade, o que mais consumia o tempo da equipe das casas de repouso era limpar e recarregar os robôs — e, principalmente, resolver falhas quando algo dava errado.
“Depois de algumas semanas, os cuidadores concluíram que os robôs davam mais trabalho do que ajuda e começaram a usá-los cada vez menos, porque simplesmente não tinham tempo para isso”, contou.
“O HUG precisava ser movido o tempo todo para não atrapalhar os moradores. O Paro causou angústia em uma residente que acabou se apegando demais a ele. E os exercícios do Pepper eram difíceis de acompanhar — ele era baixo demais para ser visto por todos e sua voz aguda dificultava a compreensão.”

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As equipes responsáveis pelos robôs tiveram suas próprias respostas à pesquisa do professor Wright.
Os desenvolvedores do HUG afirmam que, desde então, aprimoraram o design para torná-lo mais compacto e fácil de usar. Takanori Shibata, criador do Paro, disse que o robô vem sendo utilizado há 20 anos e apontou estudos que comprovariam “evidências clínicas de seus efeitos terapêuticos”. O Pepper agora pertence a outra empresa, e seu software foi significativamente atualizado.
Ainda assim, o estudo não foi desprovido de valor.
Walker, da Shadow Robot, é enfático ao afirmar que o uso de robôs em cuidados não deve ser descartado. Ele argumenta, entre outras coisas, que a próxima geração desses robôs será muito mais capaz.
Dos laboratórios para o mundo real
Praminda Caleb-Solly, professora da Universidade de Nottingham, está determinada a fazer com que esses robôs funcionem bem na prática. “Estamos tentando tirar esses robôs dos laboratórios e levá-los para o mundo real”, diz ela.
Para isso, criou a rede ‘Emergence’, que conecta fabricantes de robôs a empresas e indivíduos que os utilizarão — e também para descobrir diretamente com os idosos o que eles esperam dessas máquinas.
Algumas pessoas disseram que querem robôs com interação por voz e, compreensivelmente, aparência não ameaçadora. Outras preferem um “design fofo”. Mas muitos pedidos se resumem à forma prática como o robô deve se adaptar às necessidades em mudança — e ao fato de que ele deve se carregar e se limpar sozinho.
“Não queremos cuidar do robô — queremos que o robô cuide de nós”, disse uma pessoa entrevistada.

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Algumas empresas no Reino Unido também estão testando robôs.
O provedor de cuidados domiciliares Caremark vem experimentando o Genie, um pequeno robô ativado por voz, com algumas pessoas que utilizam seus serviços em Cheltenham.
Um homem com início precoce de demência explicou que gostava de pedir ao Genie para tocar músicas de Glenn Miller.
No geral, entretanto, as reações foram “como Marmite”, segundo o diretor Michael Folkes — algumas pessoas adoraram o Genie, enquanto outras foram menos entusiasmadas.
Mas Folkes também ressalta que esses dispositivos não têm o objetivo de substituir pessoas. “Estamos tentando construir um futuro em que os cuidadores tenham mais tempo para cuidar.”
De volta ao laboratório da Shadow Robot Company, em Londres, Rich Walker aponta outro grande desafio: dominar a mão robótica perfeita.
“Para que o robô seja útil, ele precisa ter a mesma capacidade de interagir com o mundo que um humano”, explica. “E, para isso, precisa de destreza semelhante à humana.”

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A mão robótica que Walker me mostra certamente parece ágil. É feita de metal e plástico, equipada com 100 sensores, e possui a destreza e a força de uma mão humana. Cada dedo se move para tocar o polegar de forma suave, rápida e precisa, finalizando com um gesto de “OK”.
Ela consegue até resolver um cubo mágico usando apenas uma das mãos.
Ainda assim, está longe de realizar tarefas mais delicadas, como usar uma tesoura ou pegar objetos pequenos e frágeis.
“O jeito como usamos uma tesoura é realmente impressionante, quando você pensa nisso”, diz Walker.
“Se você tentar analisar o que acontece, está usando o sentido do tato de maneira sutil e precisa, recebendo feedback que faz você ajustar a forma de cortar. Como você ensina um robô a fazer isso?”

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A equipe de Walker, junto com outras 35 empresas de engenharia, está trabalhando para projetar uma mão mais parecida com a nossa — parte do que é conhecido como Programa de Destreza Robótica.
É um dos projetos conduzidos por uma agência governamental chamada Advanced Research and Invention Agency (ARIA), que busca apoiar pesquisas científicas de alto risco (porque podem não dar certo), mas também de alto retorno, pelo seu potencial de transformar a sociedade.
A líder do projeto, professora Jenny Read, explica que estão estudando como os animais se movimentam para orientar melhor o design, não apenas da mão, mas para repensar completamente como os robôs são construídos.
“Uma das coisas mais impressionantes nos corpos dos animais é a graça e eficiência que eles apresentam; a evolução garantiu isso”, diz ela.
“Acho que a graça é realmente uma forma de eficiência.”
Replicando músculos humanos
Guggi Kofod, engenheiro e agora empreendedor da Dinamarca, está tentando desenvolver músculos artificiais para robôs que possam ser usados no lugar de motores.
Sua empresa, Pliantics, com sede na Dinamarca, ainda está em fase inicial de desenvolvimento, mas já alcançou um avanço importante: encontrou um material que parece funcionar e é durável.
Ele também é movido por motivos profundamente pessoais.
“Várias pessoas próximas a mim morreram recentemente de demência”, explica. “Vejo como é desafiador para quem cuida de pacientes com demência.
“Então, se pudermos construir sistemas que os ajudem a não ter medo e que permitam viver, pelo menos, com uma qualidade de vida decente… Isso é incrivelmente motivador para mim.”
Os músculos que a empresa de Kofod desenvolve são feitos de um material macio que se estende e se contrai, de forma semelhante aos músculos reais, quando uma corrente elétrica é aplicada.
Guggi Kofod está trabalhando com a Shadow Robot, como parte do projeto ARIA, para desenvolver uma mão robótica do tamanho humano cujos músculos artificiais possam proporcionar uma pegada mais precisa e delicada.
O objetivo final é que a mão consiga detectar pequenas mudanças de pressão ao segurar um objeto e saiba exatamente quando parar de apertar, assim como a pele das pontas dos dedos faz.
O que os robôs significam para os cuidadores
O professor Wright, que observou os robôs no Japão, tem uma preocupação final: se a tecnologia se popularizar, os robôs podem acabar tornando a vida dos cuidadores humanos mais difícil.
“A única forma economicamente viável de fazer isso funcionar é pagar menos aos cuidadores e ter casas de repouso muito maiores, padronizadas para facilitar a operação dos robôs”, argumenta.
“Como resultado, haveria mais robôs cuidando das pessoas, enquanto os cuidadores seriam pagos com salário mínimo apenas para dar suporte aos robôs — o oposto da visão de que os robôs devolveriam tempo aos cuidadores para que pudessem passar mais momentos de qualidade com os residentes, conversar com eles.”
Outros especialistas têm uma visão mais positiva. “Vai se tornar uma indústria enorme, considerando o déficit que temos atualmente na força de trabalho. A demanda por cuidadores, à medida que a população envelhece, será enorme”, afirma Gopal Ramchurn, professor de inteligência artificial na University of Southampton.
Ele também é CEO da Responsible AI, organização que busca garantir que sistemas de inteligência artificial sejam seguros, confiáveis e dignos de confiança.
Mas ele cita o robô humanoide Optimus, de Elon Musk, que serviu bebidas e interagiu em um evento da Tesla no ano passado, como sinal de que — gostemos ou não — os robôs estão chegando.
“Estamos tentando antecipar esse futuro, antes que as grandes empresas de tecnologia implantem essas máquinas sem nos perguntar o que pensamos sobre elas”, acrescenta.
Portanto, agora é o momento de desenvolver regulamentações adequadas para garantir que os robôs trabalhem a nosso favor, e não o contrário, argumenta.
“Precisamos estar preparados para esse futuro.”
Fonte.:BBC NEWS BRASIL


