Você viajaria pelo mundo na companhia de uma celebridade? Para um grupo crescente de consumidores, a resposta é afirmativa. Agências de turismo de alto padrão têm apostado na relação entre fãs e famosos como uma oportunidade de negócio para vender experiências exclusivas.
Empresas operam esse modelo como uma parceria comercial: a agência usa o alcance e influência do convidado para atrair públicos de nicho, enquanto os influenciadores participam dos lucros e integram viagens de alto padrão, desenhadas para o segmento que representam.
No exterior, o modelo já é consolidado, sobretudo no nicho da gastronomia. Nesse segmento, influenciadores, chefs e produtores de conteúdo vendem roteiros personalizados para outros países, nos quais a principal atração é a viagem realizada em sua própria companhia.
Em 2025, a criadora de conteúdo americana Justine Doiron passou a organizar viagens pela Sicília, na Itália, com grupos de seguidores, em parceria com empresas de turismo. Iniciativas semelhantes foram anunciadas por Anela Malik e Youngmi Mayer, com roteiros em países como Marrocos, Portugal, Irlanda e França.
No Brasil, o formato ainda avança de forma tímida. Tadeu Agostinho, CEO da Personal Agente, teve a ideia de atuar nesse segmento durante uma viagem às Maldivas, quando observou um grupo de turistas viajando na companhia de um influenciador internacional.
A partir dessa experiência, Tadeu decidiu adaptar o modelo ao mercado brasileiro. Por meio de contatos familiares, Agostinho firmou parceria com Elisa Fernandes, consultora em gastronomia e vencedora da primeira temporada do MasterChef Brasil, para organizar uma viagem ao Japão.
Marcada para março de 2026, a primeira viagem vai acontecer durante a primavera japonesa, quando a floração das cerejeiras transforma ruas, parques e templos em paisagens bucólicas. O grupo será formado por 12 viajantes, além de Elisa e de seu namorado. O preço da viagem gira em torno de R$ 100 mil por pessoa
O grupo ainda não está fechado: até agora, dez estão confirmadas. “Desde o início, buscamos participantes com perfil alinhado ao da Elisa, especialmente no interesse pela gastronomia. Como o investimento é alto [R$ 30 mil só em restaurantes], em alguns casos preferimos não fechar”, diz Agostinho.
O roteiro é centrado na gastronomia, com visitas a restaurantes premiados com estrelas Michelin e degustações de ingredientes sazonais, como frutos do mar e wagyu, uma carne bovina de origem japonesa, considerada uma das mais nobres do mundo. A programação inclui ainda experiências culturais, como visitas a mercados locais, ateliês de cerâmica e passeios guiados em português.
“Viajar e comer bem sempre fez parte da minha vida. Decidi entrar nesse mercado após sair da cozinha do meu antigo restaurante e, enquanto me preparo para novos projetos, resolvi unir essas duas paixões na curadoria de viagens”, diz Elisa Fernandes.
A chef vê essa experiência como uma troca positiva. “Gosto de divulgar nas redes e espero gerar conteúdo interessante também para quem não vai participar da viagem”, afirma. Para ela, é um modelo de ganha-ganha: para os viajantes, para quem acompanha de fora e para o projeto como um todo.
Questionada sobre o peso da influência pessoal na decisão dos seguidores, Elisa Fernandes afirma que isso pode ocorrer, mas crê que não é o fator predominante. “Pode haver quem se interesse pela viagem por causa da minha presença, o que me lisonjeia, mas não acredito que esse seja o principal motivador”, diz.
Segundo ela, o público é diverso, de interessados em gastronomia e aprendizado culinário a quem acompanha o conteúdo por entretenimento. Para essas viagens, o preço funciona como um filtro natural. “É um roteiro longo, para um destino distante e com tíquete alto. Em geral, quem se interessa já se identifica com esse tipo de experiência, e não apenas com a minha imagem pública”, afirma.
Um estudo publicado na revista Tourism Management Perspectives, mostra como a afeição de fãs por celebridades influencia a intenção de visitar destinos endossados por esses ídolos, mostrando que laços emocionais podem impactar decisões de viagem e reforçar a imagem de um local como atrativo turístico.
O modelo se apoia na força das relações estimuladas pelo ecossistema digital — víncuos emocionais unilaterais que o público cria com figuras públicas, como celebridades— e na busca por novas formas de sociabilidade. Essa combinação ajuda a explicar como e por que as pessoas estão viajando hoje.
Pesquisa da consultoria Kearney mostra que viajantes mais jovens priorizam viagens focadas em experiências e eventos. Segundo o relatório Na mente dos viajantes globais: como as expectativas em evolução dos turistas estão remodelando o turismo, cerca de 30% desse público afirma se inspirar principalmente em influenciadores e celebridades na escolha dos destinos.
Fonte.:Folha de S.Paulo


