Na mais recente derrota do governo Lula no Legislativo, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal derrubaram nesta quarta-feira (25) os três decretos que alteraram as alíquotas do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), afirmou que a votação era “traumática” e que o Congresso descumpriu acordos feitos anteriormente. “Abre-se um caminho, para mim, perigoso. Eu, evidentemente, como líder do governo, fico constrangido”, disse.
Entenda em cinco pontos a discussão do imposto, que se estende por mais de um mês.
DECRETO E CORREÇÃO DE ROTA
Em meio a dúvidas em relação ao cumprimento da meta fiscal para este ano, o governo federal publicou em 22 de maio decreto que elevou o IOF sobre operações de crédito contratadas por empresas, aportes em planos de previdência acima de R$ 50 mil mensais, remessas para o exterior, compras em moeda estrangeira realizadas por pessoas físicas com uso de cartões de crédito, débito e pré-pagos, e compra de moeda estrangeira em espécie.
Com a medida, a Receita Federal esperava uma arrecadação de R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 40,1 bilhões em 2026. A decisão desagradou ao empresariado, que levantou preocupações com encarecimento do crédito, inflação e manutenção dos juros altos.
Horas depois de baixar o decreto, o governo chamou uma reunião de emergência e decidiu restaurar o texto que estabelece alíquota zero de IOF sobre aplicações de fundos de investimentos do Brasil em ativos no exterior e manter a alíquota para remessas.
No dia seguinte, em 23 de maio, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse em São Paulo que o governo não tem problema em corrigir rota, “desde que o rumo traçado pelo governo seja mantido”
CONTAS EM SITUAÇÃO DELICADA
O aumento do imposto motivou protestos de entidades empresariais e da oposição ao governo Lula no Legislativo. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), criticou as medidas no dia 26 de maio e disse que o Brasil não precisa mais de imposto.
Na mesma semana, Haddad reuniu-se com Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), para discutir o IOF e disse que a máquina pública ficaria em situação delicada sem a alta do tributo.
“Expliquei [na reunião] as consequências em caso de não aceitação da medida [do IOF], o que acarretaria em termos de contingenciamento adicional. Nós ficaremos num patamar bastante delicado do ponto de vista do funcionamento da máquina pública do Estado brasileiro”, disse Haddad na ocasião.
Neste ano, o governo vai perseguir novamente uma meta fiscal zero, mas poderá entregar um resultado negativo em até R$ 31 bilhões. A margem de tolerância do arcabouço fiscal é equivalente a 0,25% do PIB (Produto Interno Bruto) para mais ou para menos.
Na semana seguinte, o ministro disse que enviaria ao Congresso Nacional um pacote de ajustes nas contas públicas com “impacto duradouro ao longo do tempo”.
Relatório de acompanhamento fiscal da IFI (Instituição Fiscal Independente), do Senado Federal, divulgado nesta terça (24) mostra que a União terá um déficit primário de R$ 83,1 bilhões ao fim de 2025, dentro da meta prevista no arcabouço fiscal.
O anúncio da alta do IOF em maio provocou uma crise com o Congresso, que passou a pressionar pela derrubada do decreto.
Em reunião de cinco horas com líderes partidários no dia 8 de junho, um domingo, Haddad chegou a um acordo em relação a um pacote que previa apenas medidas pelo lado da ampliação da receita. Após as negociações, no entanto, Hugo Motta disse no dia seguinte não conseguir garantir que o Congresso aprovaria as medidas.
No dia 11, Haddad compareceu às comissões de Fiscalização Financeira e Controle e Finanças e Tributação e discutiu com os deputados Carlos Jordy (PL-RJ) e Nikolas Ferreira (PL-MG), que fizeram uma dobradinha de críticas ao governo e à situação econômica do Brasil.
Ao deixar a sala, Haddad disse que a oposição tenta atrapalhar a tramitação das medidas de arrecadação que substituirão o aumento o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
Depois de uma série de reuniões no mesmo dia, o governo fez novas mudanças nas cobranças de IOF, com recuos em alguns aumentos, e enviou ao Congresso uma MP (medida provisória) com o aumento da taxação de apostas esportivas, mudança na tributação de instituições financeiras e a cobrança de Imposto de Renda de 5% sobre títulos atualmente isentos, como LCIs (Letras de Crédito Imobiliário) e LCAs (Letras de Crédito Agrícola).
Mas antes mesmo de o texto chegar ao Congresso, o pacote já estava sob ataque. O ministro Fernando Haddad, da Fazendo, e os líderes da base têm defendido que os quatro meses de discussão da MP serão suficientes para o governo construir um acordo.
No mesmo dia, Hugo Motta disse que as medidas gerariam uma “reação muito ruim” no Congresso e no empresariado. Após reunião de líderes no dia 12, Motta decidiu pautar um requerimento de urgência ao projeto para que ele fosse analisado diretamente no plenário, sem passar pelas comissões.
Folha Mercado
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Sob pressão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu em 14 de junho com ministros e com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), em um momento de impasse entre os dois Poderes sobre a medida provisória publicada pelo governo.
Também estiveram presentes os ministros Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) e Rui Costa (Casa Civil), além do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).
Apesar dos esforços do governo, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou na semana passada o requerimento de urgência do projeto. A votação teve ampla adesão dos parlamentares, inclusive de integrantes da base aliada do governo.
DERRUBADA
A decisão de pautar a votação do projeto nesta quarta-feira (25) foi comunicada por Motta por meio do X (antigo Twitter) às 23h35 desta terça-feira (24).
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), conversou com o presidente da Câmara dos Deputados e afirmou que o PDL (projeto de decreto legislativo) que derruba também seria votado pelo plenário do Senado nesta quarta.
O projeto que susta os decretos do IOF foi aprovado pela Câmara por 383 votos favoráveis e 98 contrários. No plenário do Senado, a aprovação foi simbólica, ou seja, sem a contagem de votos.
Com a derrubada dos decretos, as alíquotas de IOF voltam ao patamar do dia 22 de maio, quando o governo anunciou que mexeria no imposto sobre o crédito destinado às empresas, seguros e câmbio.
As taxas de cartão de crédito e débito internacionais, por exemplo, volta a ser de 3,38%, após ter subido a 3,5% com o decreto do governo agora derrubado. As remessas para o exterior, que estavam sendo tributadas em 1,1%, volta para 0,38%.
Fonte.:Folha de S.Paulo