12:00 PM
27 de outubro de 2025

Estrelas Michelin viram questão de sobrevivência – 27/10/2025 – Comida

Estrelas Michelin viram questão de sobrevivência – 27/10/2025 – Comida

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Desde que assumiu a cozinha do Alinea, em Chicago, no final dos anos 2000, Dave Beran tem uma longa história com o Guia Michelin, o que o torna uma escolha óbvia para o novo programa da Apple TV, “Na Ponta da Faca – Buscando Estrelas Michelin”, que estreou em 10 de outubro. No entanto, em vez de focar a busca meticulosa de Beran por uma culinária transcendental, a história do programa coloca algo muito mais prosaico em destaque: o dinheiro.

Especificamente no dinheiro que seu restaurante em Santa Monica, Califórnia, o Pasjoli, estava perdendo após não conseguir manter a sua estrela Michelin em 2022. Em uma cena, a diretora de operações Ann Hsing diz ao chef que o restaurante está no vermelho, mesmo cobrando US$ 65 (R$ 350) por um único prato principal. Em outra, ele afirma que perder uma estrela custou ao Pasjoli de 30% a 40% de seu faturamento.

No final do episódio, Beran decide mudar a direção do Pasjoli, deixando de lado a busca por estrelas Michelin e buscando ser um restaurante de bairro. “Estava se tornando um restaurante que, francamente, eu não podia me dar ao luxo de frequentar regularmente”, disse Beran.

“Na Ponta da Faca” acompanha chefs em regiões ao redor do mundo, incluindo Nova York, Chicago e Califórnia, enquanto buscam o reconhecimento do Guia Michelin durante um único ciclo de premiação. A influência do Michelin tem se expandido pela América do Norte em um momento difícil para restaurantes independentes, em várias cidades americanas, e com um crescimento lento em nível nacional. Hoje, ganhar — e manter — estrelas Michelin é um dos poucos caminhos garantidos para os restaurantes atraírem novos clientes.

“Éramos o mesmo restaurante no dia seguinte à conquista da estrela que éramos no dia anterior”, disse Bryce Gilmore, chef e proprietário do Barley Swine em Austin, Texas. “Mas assim que ganhamos uma estrela Michelin, tudo mudou.”

Líder na culinária da fazenda à mesa na cidade, o restaurante com menu-degustação de Gilmore estava aberto desde 2010. Havia muitas quintas-feiras e sextas-feiras com pouco movimento; Gilmore estava estressado tentando cortar custos em tudo, desde ingredientes até o tipo de papel toalha no banheiro.

Em 2024, o Guia Michelin chegou ao Texas e concedeu uma estrela ao restaurante Barley Swine em sua edição inaugural. Em termos de benefício financeiro direto, de todas as honrarias que Gilmore acumulou, incluindo ser finalista do prêmio James Beard várias vezes, “não foi comparável a nada”.

Jesse Burgess, rosto do restaurante sensação do Instagram no Reino Unido, o Topjaw, apresenta o “Na Ponta da Faca”. Ele disse que uma das coisas que o empolgou no programa foi a chance de desmistificar alguns mitos sobre o Michelin.

Burgess viu amigos chefs lutarem para conseguir estrelas, mas acredita que o poder dos prêmios deriva da percepção de que são rigorosos, mas justos. “Eles não são uma instituição de caridade. Não estão distribuindo estrelas a torto e a direito.”

Uma organização notoriamente secreta, o Michelin concedeu ao “Na Ponta da Faca” acesso sem precedentes, incluindo entrevistas com inspetores anônimos. Burgess disse que os funcionários só falaram por telefone, e então atores foram filmados como dublês.

Mas, embora não tenha conhecido os inspetores pessoalmente, Burgess aprendeu algumas coisas sobre o perfil geral deles, incluindo o fato de serem pagos. Para começar, eles precisam comprovar que já fizeram 1.000 refeições em restaurantes, disse ele, e o Michelin gosta de contratar advogados, pois eles “têm uma visão muito clara do que é certo e errado. E ficam bastante satisfeitos em não se envolverem emocionalmente”.

Ele acrescentou: “Basicamente, eles não querem que os inspetores se envolvam emocionalmente e pensem: ‘Acho que este restaurante não merece uma estrela, mas os donos são muito, muito simpáticos'”.

Nos Estados Unidos, as recentes expansões do Michelin foram financiadas por órgãos de turismo locais e estaduais. A capacidade única do guia de atrair visitantes de todo o mundo e de lotar as reservas dos restaurantes premiados o torna uma proposta atraente.

Após o fechamento em 2024 do ambicioso restaurante de menu-degustação Okta, na região vinícola do Oregon, alguns defensores locais na vizinha Portland estão defendendo a chegada do Guia Michelin à cidade. O principal destino gastronômico dos EUA sem o Michelin, o mercado turístico da cidade tem enfrentado uma longa crise.

Alguns chefs locais estão preocupados de que o Michelin não resolva os problemas mais profundos da cidade. Carlo Lamagna, do Magna Kusina, adoraria competir por uma estrela. Mas ainda não. “Temos tantos problemas subjacentes que incluir o Michelin aqui seria como —perdoem a minha grosseria— colocar chantilli em cima de um pedaço de excremento”, disse ele, usando uma expressão mais vulgar.

O também chef de Portland, Gregory Gourdet, que ganhou um prêmio James Beard e uma série de outros reconhecimentos por seu restaurante Kann, de culinária requintada inspirada no Haiti, concorda que Portland não precisa do Michelin. Mas no Maison Passerelle, seu restaurante recém-inaugurado em Nova York, que serve culinária francesa com influências africanas e asiáticas, ele busca alcançar o nível do Michelin, mesmo reconhecendo falhas na abordagem do guia.

“Muitas culturas e culinárias são severamente sub-representadas no nível do Michelin”, disse ele. “Para mim, que cozinho com base nessas culturas, isso é um problema.”



Fonte.:Folha de São Paulo

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