Na quarta-feira (18), quando a revista de vinhos inglesa Decanter anunciou a lista de medalhas da edição de 2025 do seu prestigioso concurso (considerado o “Oscar” do vinho), eu estava na estrada rumo à Vinícola Brasília, na área rural do Distrito Federal.
Por uma feliz coincidência, o Maria Maria Isabela 2023, o vinho mineiro que levou medalha de ouro e recebeu a maior pontuação da história deste país no tal concurso, 96 pontos, estaria na Expovitis (feira de vinhos organizada por dois sócios da Vinícola Brasília, o Carlos Vitor Silva, da Casa Vitor, e o Ronaldo Triacca, da Vinícola Triacca), que abriria no dia seguinte (19), no Parque Tecnológico Ivaldo Cenci.
A Vinícola Maria Maria é velha conhecida minha. Em 2017, fui visitá-la. Na época, eles produziam apenas dois vinhos. Gostei muito de ambos e lembro bem deles, principalmente do tinto. Tinha uma aroma floral que me surpreendeu por ser incomum nos vinhos de syrah. Fiquei com vontade de provar o 2023.
A Expovitis, no entanto, me envolveu. A feira estava bem organizada, em seis galpões em volta de um parque bonito. Não havia aglomerações. Muito agradável (coisa rara quando se trata de feiras).
Acabei provando vários outros vinhos antes de chegar ao Maria Maria. Dedicada ao vinho brasileiro, em sua segunda edição, em três dias, a Expovitis reuniu 110 vinícolas e atraiu cerca de nove mil visitantes, entre profissionais e público pagante (ingressos a partir de R$ 95,00).
Um painel incrível da produção nacional, o evento tinha expositores de todas as partes do Brasil e demonstrou lindamente a diversidade dessa produção. Havia vinhos do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Paraná, de São Paulo, de Minas Gerais, de Goiás, do DF, da Bahia e de Pernambuco, que eu tenha visto.
Também vinhos de estilos pouco comuns, como o laranja jovem da Vinícola Cerro de Pedra (Campanha Gaúcha), um blend de chardonnay 2021 com sauvignon blanc 2022, o desconcertante (mas muito bom) Chardonnay Rosé, da Bodega Três Amigos (Serra Gaúcha), o maravilhoso Vinho Licoroso Safra 1999 Moscato, da Cave Antiga (Serra Gaúcha), ou o Clarete de rodinella da Vinícola Domus Mea (Vale Central do RS).
Diversidade também de castas. Provei os deliciosos montepulcianos da Leone de Venezia (SC); a nova safra do delicado teroldego Tom Água de Beber, do Sanabria Laboratório de Vinhos Naturais, e voltei aos ótimos barberas da Vinícola Pireneus (GO), os primeiros colheita de inverno que tomei.
O projeto reúne dez fazendas do PAD-DF (Programa de Assentamento Dirigido do Distrito Federal) e região, na maioria produtores de soja. Todos têm vinhedos e uma marca própria de vinho, mas se reuniram para construir uma instalação industrial única, além disso, criaram uma marca comum, que trabalha com blends de todos os vinhedos (veja post abaixo).
A feira reúne não só os tradicionais produtores da Serra Gaúcha, mas também aqueles vindos das novas regiões vitivinícolas do Brasil, onde só foi possível plantar uvas viníferas depois que, nos anos 2000, o pesquisador Murillo de Albuquerque Regina, então da Epamig, desenvolveu um método que transfere a colheita para o inverno, quando não chove.
Regina trabalhou com a syrah para tintos e, por isso, a casta reina entre os vinhos de inverno, embora a malbec venha ganhando terreno. Na Expovitis, havia outras estrelas da casta syrah além do Maria Maria Isabela 2023 – que provei no último dia e do qual gostei bastante (elegante, sem madeira com muita fruta fresca).
Empatados em primeiro lugar, como os melhores syrahs do país, na Grande Prova de Vinhos do Brasil, em maio, o Quatro Altitudes Syrah 2022, da Casa Vitor, uma das dez vinícolas da Vinícola Brasília, e o Davo Syrah 2023, da Vinícola Davo, de São Gonçalo do Sapucaí (MG), chamaram atenção. Ambos também são vinhos sem passagem por barris de carvalho. Para mim, a melhor surpresa da feira foi ver muitos produtores de vinhos de inverno e, em especial, produtores do Planalto Central entenderem que dá para fazer vinho bom sem madeira.
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Fonte.:Folha de São Paulo