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4 de setembro de 2025

Giorgio Armani morre aos 91 anos: como visionário deu curvas ao terno masculino e poder ao feminino

Giorgio Armani morre aos 91 anos: como visionário deu curvas ao terno masculino e poder ao feminino

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Giorgio Armani deitado sobre dezenas de folhas pretas no chão, mostrando esboços de roupas, em 1982

Crédito, Getty Images

Giorgio Armani, que morreu aos 91 anos na quinta-feira (4/9), foi o primeiro estilista desde Coco Chanel a provocar uma mudança duradoura na maneira como as pessoas se vestem.

Nascido em uma era pré-guerra de tradições e estilos rígidos, suas criações acompanharam – e ajudaram a possibilitar – a crescente fluidez social da segunda metade do século 20.

Ele será lembrado principalmente por reinventar o terno – suvizando-o para os homens e popularizando-o para as mulheres.

Armani eliminou as restrições e confinamentos dos estilos mais engessados que o precederam – fazendo os homens se sentirem sofisticados e as mulheres empoderadas no ambiente de trabalho.

Os jornais o apelidaram de “primeiro estilista pós-moderno”. De muitas formas, ele foi um revolucionário.

Giorgio Armani fotografado em casa no final dos anos 1970

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Giorgio Armani retratado em casa no final dos anos 1970

Giorgio Armani nasceu em Piacenza, no norte da Itália, em 11 de julho de 1934.

O estilo de vida confortável de classe média de sua família foi destruído pela Segunda Guerra e, com a escassez de comida, sua lembrança mais antiga foi a fome.

Armani brincava nas ruas com projéteis não detonados, até que um explodiu. Ele ficou gravemente queimado e um amigo próximo morreu.

“A guerra”, disse mais tarde, “me ensinou que nem tudo é glamouroso.”

Giorgio Armani com amigos de infância durante a Segunda Guerra Mundial na Itália

Crédito, Family photo

Legenda da foto, Armani (esq.) com amigos de infância durante a Segunda Guerra Mundial na Itália

Início da carreira

Quando jovem, Armani não tinha rumo.

Em 1956, começou a cursar medicina – mas abandonou após três anos e ingressou no exército.

Cansado rapidamente da vida militar, conseguiu emprego como vitrinista na La Rinascente – uma loja de departamentos em Milão – onde subiu rapidamente de cargo.

A maioria dos estilistas aprende o ofício como aprendiz ou em escolas de moda – mas a formação de Armani aconteceu no chão da loja.

Ele aprendeu quais tecidos os clientes preferiam e ia diretamente às fábricas comprá-los. Tornou-se especialista em como os tecidos eram feitos e usou esse conhecimento para aperfeiçoar a alfaiataria.

Logo, passou a trabalhar com Nino Cerruti – um influente estilista de alta costura.

Em poucos meses, Cerruti pediu que ele reestruturasse a abordagem da empresa.

Giorgio Armani

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, A carreira de Armani no design começou como vitrinista em uma loja de departamentos em Milão

As classes médias dos anos 1960 não podiam pagar pela alta costura, mas desejavam um estilo distinto.

Com sua expertise em tecidos, Armani encontrou a resposta: roupas de alfaiataria precisas, feitas com materiais finos, mas produzidas em escala.

Esse estilo distintamente italiano começou a influenciar a moda internacional.

Em 1966, Armani conheceu Sergio Galeotti, um jovem aprendiz de arquiteto. Galeotti logo abandonou sua carreira e passou a trabalhar ao lado do companheiro.

Com confiança absoluta no talento de Giorgio, encorajou-o a abrir sua própria empresa.

Galeotti cuidou da parte comercial – e vendeu seu Fusca para levantar o capital inicial.

Eles começaram modestamente – o primeiro escritório era tão escuro que Armani precisou retirar as cúpulas das lâmpadas para enxergar os tecidos. Mas o impacto de seu trabalho foi revolucionário.

Suavizando ternos masculinos e fortalecendo os femininos

Modelos vestindo Armani

Crédito, getty images

Legenda da foto, À medida que o papel das mulheres na sociedade começou a mudar, Armani percebeu uma oportunidade

De modo geral, Armani suavizou a moda masculina e endureceu a feminina.

Os ternos masculinos tornaram-se mais leves e sensuais – refletindo uma mudança cultural ainda não traduzida pela moda.

E, com cada vez mais mulheres ingressando no mercado de trabalho, Armani enxergou uma oportunidade.

“Percebi que elas precisavam de uma maneira de se vestir equivalente à dos homens”, disse. “Algo que lhes desse dignidade na vida profissional.”

Com seus elegantes e poderosos tailleurs, Armani ofereceu às mulheres uma alternativa aos vestidos gastos de suas mães. Eles exalavam feminilidade, mas também representavam uma declaração de igualdade.

Em 1978, a empresa firmou um acordo com o fabricante GFT, que permitiu produzir roupas de luxo em larga escala.

Ao mesmo tempo, Armani conseguiu um poderoso marketing: vestir Richard Gere em Gigolô Americano (1980).

Foto de Richard Gere em Gigolô Americano

Crédito, Alamy

Legenda da foto, Richard Gere apareceu vestido dos pés à cabeça em Armani em Gigolô Americano

Era a visão de Armani projetada pelo poder de Hollywood – publicidade que dinheiro nenhum poderia comprar.

A partir daí, Armani passou a vestir estrelas no tapete vermelho do Oscar e a desenhar figurinos para filmes e séries como Os Intocáveis e Miami Vice.

Dentro de uma década, ele se tornou o estilista europeu mais vendido nos Estados Unidos. Milão emergiu como força criativa e comercial global – atrás apenas de Paris.

Ele então passou a expandir sua marca. Lançou tanto a Armani Jeans quanto a Emporio Armani – e um acordo com a L’Oréal acrescentou fragrâncias ao seu portfólio.

Depois, vieram óculos, cosméticos, esportivos e acessórios – criando um “estilo de vida Armani” ao qual os amantes da moda podiam aspirar. A revista GQ descreveu como o “total look”.

Giorgio Armani e uma modelo

Crédito, Getty Images

Luto e determinação

Em 1985, Sergio Galeotti faleceu aos 40 anos, vítima de uma doença relacionada ao HIV.

Um homem extremamente reservado, Armani se isolou e cogitou a aposentadoria. Eventualmente, decidiu perseverar em vez de “abandonar todas as esperanças de Sergio”.

Prestando homenagem ao seu parceiro pessoal e profissional de longa data, Armani disse que “ele me ajudou a acreditar no meu próprio trabalho, na minha energia”.

Em uma rara entrevista em 2001, o estilista foi questionado sobre o maior fracasso de sua carreira. “Não conseguir impedir a morte do meu parceiro”, respondeu ele.

Sem família para distraí-lo, dedicou sua vida a expandir seu império.

Enquanto conglomerados de moda compravam outras marcas, Armani resistia a investimentos externos.

Em vez disso, transformou a empresa no vasto negócio global que é hoje — e manteve o controle de suas finanças e criatividade. Isso o tornou um multibilionário.

Giorgio Armani no tapete vermelho com Julia Roberts em 2019

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Giorgio Armani no tapete vermelho com Julia Roberts em 2019

Em 2000, o Museu Guggenheim de Nova York sediou uma exposição de seu trabalho.

A mostra foi um reconhecimento da poderosa influência de Armani na mudança social do século anterior e afirmou com ousadia que “design pode ser arte”.

Ele parou de usar modelos com baixo índice de massa corporal quando uma delas — Ana Carolina Reston — morreu de anorexia.

O design de hotéis foi adicionado ao portfólio com a inauguração do Burj Khalifa em Dubai, em 2010. O próprio Armani projetou os interiores.

Fã fervoroso de esportes, ele também desenhou ternos para o clube inglês Chelsea e a seleção inglesa de futebol — e fez os uniformes da seleção olímpica italiana em 2012.

Ele teve um desentendimento público com a editora da Vogue americana, Anna Wintour, quando ela não compareceu ao lançamento de sua nova temporada em 2014.

Ela alegou um conflito de agenda, mas houve rumores de que teria comentado que “a era Armani acabou”.

 Giorgio Armani na Semana de Moda de Paris em junho de 2024

Crédito, Getty Images

Legenda da foto, Armani na Semana de Moda de Paris em junho de 2024, um mês antes de seu 90º aniversário

Últimos anos e legado

Ao entrar em seus 90 anos, Armani continuava desfilando novos modelos nas passarelas de Paris e Milão.

Em março de 2025, disse que sua coleção de Milão buscava “derramar óleo sobre as águas turbulentas da política global”.

“Quis imaginar uma nova harmonia”, afirmou, “porque acredito que é disso que todos precisamos”.

Pessoalmente, era esguio e formal.

A revista New York o descreveu como “notoriamente disciplinado” e “dedicado a um autocontrole que pode soar como frieza”.

Todas as manhãs nadava em uma piscina de 50 metros de comprimento, mas apenas 1 metro de largura – espaço suficiente apenas para permitir as braçadas.

Para alguns, a piscina simbolizava sua abordagem: minimalista, precisa e com propósito.

Giorgio Armani

Crédito, Getty Images

Ao longo da carreira, suas criações acompanharam as transformações sociais.

Esse senso de direção social vinha de sua experiência inicial no varejo, onde o cliente sempre foi prioridade – e um bom estilista precisava se adaptar às mudanças.

Por 65 anos, Armani dedicou-se a essa missão. E acumulou uma fortuna estimada pela Forbes em US$ 13 bilhões (cerca de R$ 70,8 bilhões).

“Eu nunca estou satisfeito”, disse certa vez.

“Na verdade, como alguém eternamente insatisfeito e obcecado por perfeição, nunca desisto até alcançar o resultado que quero.”



Fonte.:BBC NEWS BRASIL

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