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Uma proposta polêmica, cuja votação acabou sendo postergada por meses, volta à pauta do Senado nesta terça-feira (08/07).
O Plenário da Casa pode votar nesta tarde, a partir das 14h, um projeto que legaliza cassinos, jogo do bicho, bingos e caça-níqueis, sob algumas condições.
Sites de apostas esportivas foram autorizados pelo Congresso a funcionar em 2018, durante o governo Michel Temer (MDB).
Esses sites ficaram sem regulamentação por alguns anos, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que não pareceu querer mexer com o assunto.
No governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a regulamentação foi aprovada em 2023, com o objetivo de alavancar a arrecadação e criar regras para seu funcionamento. Foi nesse momento, com a aprovação da Lei das Bets, que também foram legalizados cassinos online.
Críticos dizem que legalizar mais atividades do ramo vai agravar problemas como vícios em jogos e endividamento, além de favorecer a lavagem de dinheiro pelo crime organizado.
O texto que quer legalizar cassinos e afins foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 2022 e pela comissão mais importante do Senado, a de Constituição e Justiça (CCJ), em junho do ano passado.
Entretanto, a votação no Plenário, que chegou a ser prevista para dezembro de 2024, acabou adiada, tamanha a controvérsia da proposta.
Cassinos em resorts e jogo do bicho ‘credenciado’
Caso o texto seja aprovado no Congresso, seria permitida a construção de cassinos físicos no país, em quantidades limitadas.
Defensores da medida dizem que isso facilitaria a fiscalização, dificultando o uso para lavagem de dinheiro.
O texto aprovado na CCJ, que ainda pode ser modificado no Plenário do Senado, autoriza cassinos em polos turísticos ou em complexos integrados de lazer, como resorts e hotéis de alto padrão com pelo menos cem quartos, além de restaurantes e locais para eventos.
O limite seria de um cassino em cada Estado e no Distrito Federal, com exceção de São Paulo (até três), e de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Amazonas e Pará (até dois cada), em razão do tamanho da população ou do território. Também haveria limites para cassinos em navios, em rios e no mar.
Já o jogo de bingo seria liberado tanto na modalidade de cartela como eletrônica e de videobingo.
O texto prevê uma casa de bingo em cada município, sendo que as cidades maiores teriam um estabelecimento para cada 150 mil habitantes.
Além disso, seria legalizado o jogo do bicho, atividade que hoje é uma contravenção movimentada por organizações criminosas.
A disputa pelo controle territorial dos pontos de apostas já provocou diversas execuções no Rio de Janeiro.
O texto prevê que poderia ser credenciada para explorar o jogo do bicho uma empresa a cada 700 mil habitantes em cada Estado e no Distrito Federal. Roraima, único Estado com população abaixo desse patamar, poderia ter só uma empresa.
O projeto regulamenta ainda o aluguel de máquinas caça-níqueis, com a condição de que haja registro oficial delas e auditorias periódicas.
A proposta prevê também a criação de dois impostos sobre o setor, cuja arrecadação seria dividida entre União, Estados e municípios.

Crédito, Ricardo Stuckert/Presidência da República
A Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) seria paga a cada três meses, no valor de R$ 600 mil para os cassinos; R$ 300 mil para casas de jogos online; e R$ 20 mil para casas de bingo, operadoras de jogo do bicho e entidades de turfe.
Já a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos) teria alíquota de até 17% sobre a receita bruta (diferença entre valor das apostas e prêmios pagos) de todas as empresas do setor.
Parte dos recursos teria que ser destinada a ações de prevenção ao vício em jogos, em saúde, segurança pública, proteção dos animais, financiamento estudantil, ações em áreas impactadas por desastres naturais e no Fundo Nacional da Criança e do Adolescente.
Além disso, 1% da receita bruta do setor iria para a formação de atletas, por meio do Comitê Brasileiro de Clubes e do Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos.
O apostador, por sua vez, pagará 20% de Imposto de Renda nos ganhos acima de R$ 10 mil (abaixo disso fica isento). O valor a ser tributado será o saldo entre os prêmios recebidos e os gastos com apostas nas últimas 24 horas.
Estimativas apresentadas pelo senador Irajá Abreu (PSD-TO), relator da proposta, indicam que a legalização das atividades pode gerar investimentos de R$ 100 bilhões e criar cerca de 1,5 milhão de empregos diretos e indiretos.
Já a arrecadação potencial seria de R$ 22 bilhões ao ano, segundo o senador.
Divisões na esquerda e no bolsonarismo
No ano passado, o presidente Lula e seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), manifestaram-se a favor do projeto.
“Não sou favorável ao jogo, mas também não acho crime. Se o Congresso aprovar e foi feito um acordo entre os partidos políticos e for aprovado, não tem por que não sancionar”, disse Lula à Rádio Meio, do Piauí, em junho de 2024.
O ministro do Turismo, Celso Sabino (União Brasil), tem sido o defensor mais ativo do projeto.
“Como órgão do governo voltado ao desenvolvimento do turismo, somos favoráveis à proposta, assim como outros ministérios. Queremos atrair mais visitantes e estimular a circulação de pessoas dentro do Brasil”, afirmou o ministro à imprensa em maio desse ano, segundo reportagem da CNN Brasil.
Na ocasião, o ministro reafirmou que Lula sancionaria o texto, caso aprovado pelo Congresso.
Ao longo de sua tramitação, o projeto também recebeu apoio de membros do governo anterior, de Jair Bolsonaro, como do ex-chefe da Casa Civil, o senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Mas, tanto na esquerda como no campo bolsonarista, há também resistências.
Na segunda-feira (07/07), o pastor Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, postou um vídeo em suas redes sociais alertando para a votação prevista para terça.
Malafaia, chamando a iniciativa de “barbárie”, destacou que o projeto tem apoio de Lula e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) — que colocou o texto na pauta do Plenário.
O pastor acusou Lula de estar interessado na arrecadação de bilhões de reais de impostos com a eventual legalização dessas atividades, a despeito da “pandemia” de vício em jogos eletrônicos.
No ano passado, Malafaia assinou com outros pastores — como Robson Rodovalho (Sara Nossa Terra) e Estevam Hernandes (Renascer em Cristo) — uma carta de repúdio ao projeto.
No documento, eles diziam que a legalização das apostas causaria “endividamento da população, vícios relacionados aos jogos, golpes através de sites irregulares, lavagem de dinheiro e exploração de vulneráveis”.
A forte oposição do segmento evangélico é apontada como o principal fator que levou Bolsonaro a prometer vetar a proposta quando era presidente, caso ela passasse no Congresso.
Defensores do projeto em Brasília garantem que o texto traz regras para minimizar o vício.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL