O The Lancet Diabetes & Endocrinology, uma das revistas médicas mais respeitadas do mundo, publicou em setembro de 2025 um estudo inédito sobre a situação do cuidado com o diabetes em todo o planeta.
O trabalho, feito por uma rede internacional de pesquisadores em parceria com a Universidade de Washington e universidades da América Latina (incluindo o Brasil), analisou dados de mais de 200 países entre os anos 2000 e 2023.
O objetivo foi entender o que chamamos de cascata do cuidado do diabetes, que é a sequência de etapas fundamentais no manejo da doença:
- A pessoa tem diabetes, mas ainda não sabe;
- A pessoa descobre que tem diabetes (diagnóstico);
- A pessoa diagnosticada inicia tratamento;
- O tratamento realmente funciona, levando ao bom controle da glicose no sangue.
Esse tipo de análise já é muito usado em doenças infecciosas, como HIV, e agora vem sendo aplicado também nas doenças crônicas, como o diabetes, para mostrar onde estão os maiores gargalos do sistema de saúde.
Resultados preocupantes
No cenário global, os dados de 2023 são preocupantes:
- Apenas 55,8% das pessoas com diabetes sabem que têm a doença.
- Entre os que sabem, 91,4% estão em tratamento.
- Mas, entre os tratados, só 41,6% conseguem manter a glicose em níveis adequados.
Isso significa que, no total, somente uma em cada cinco pessoas com diabetes no mundo tem o quadro bem controlado.
E no Brasil?
Os dados brasileiros foram analisados em detalhe. Em 2023, a situação era a seguinte:
- 63,2% das pessoas com diabetes estavam diagnosticadas. Isso é melhor que a média mundial, mas significa que quase 4 em cada 10 brasileiros com diabetes ainda não sabem da sua condição.
- 93,3% dos diagnosticados estavam em tratamento. Isso mostra que, uma vez feito o diagnóstico, a maioria consegue acesso a medicamentos.
- O ponto mais crítico é o controle: apenas 35,4% dos tratados estavam com a glicose em níveis adequados.
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Quando olhamos para a evolução histórica, o Brasil melhorou bastante em algumas etapas:
- Entre 2000 e 2023, a proporção de diagnosticados subiu mais de 13 pontos percentuais;
- O acesso a tratamento cresceu quase 8 pontos percentuais;
- Já o bom controle da glicose avançou pouco: menos de 1 ponto percentual em mais de duas décadas.
Ou seja, melhoramos muito em diagnóstico e em acesso a remédios, mas ainda falhamos no controle eficaz da doença.
Desafio e oportunidade
Ter acesso a tratamento, mas não conseguir manter a glicose sob controle, tem consequências graves. O diabetes mal controlado aumenta o risco de complicações como cegueira, insuficiência renal, amputações e infarto. Isso traz sofrimento para os pacientes e famílias e também sobrecarrega o sistema de saúde.
O estudo deixa claro que o grande desafio do Brasil hoje não é apenas diagnosticar e oferecer remédios, mas garantir que o tratamento seja realmente eficaz. Isso envolve várias frentes:
- Educação em saúde: ensinar pacientes e familiares sobre alimentação saudável, atividade física, monitoramento da glicose e uso correto dos medicamentos.
- Acompanhamento contínuo: não basta prescrever remédio; é preciso acompanhamento regular, exames de rotina e ajustes individualizados.
- Atenção básica fortalecida: equipes de saúde da família e unidades básicas precisam ter recursos, treinamento e tempo para atender de forma adequada quem vive com diabetes.
- Políticas públicas: acesso a insulina, novos medicamentos, equipamentos de monitoramento e programas de prevenção.
Em suma, o Brasil conseguiu colocar mais pessoas dentro do sistema de saúde, mas ainda precisa garantir que esse sistema funcione melhor para o paciente.
Esse estudo serve como um alerta e como uma oportunidade. Estamos no caminho certo no diagnóstico e no tratamento inicial, mas o verdadeiro sucesso só virá quando a maioria dos brasileiros com diabetes conseguir viver com a glicose bem controlada, evitando complicações e garantindo mais qualidade de vida.
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Fonte.:Saúde Abril